13/07/2011 - 21:00
Em épocas de euforia na bolsa, investidores pessoa física faziam a festa comprando ações de ofertas públicas iniciais, os chamados Initial Public Offerings (IPO, na sigla em inglês). A receita certa para ganhar um bom dinheiro era adquirir os papéis na data do lançamento e vendê-los nos dias seguintes. Os especuladores contavam com uma forte valorização logo na estreia, o que era bastante comum. Pois esse tempo ficou para trás. O cenário hoje é muito diferente. Não faltam IPOs, mas com a bolsa em baixa, tentar lucrar com as novatas ficou muito mais arriscado.
“Fiquei fora do IPO da Qualicorp, deixei de ganhar 17% em um dia, mas agora vou me preparar melhor”
Agnaldo Quirino, investidor
Contrariando os mais pessimistas, que imaginavam uma paradeira nos pregões, o primeiro semestre não frustrou completamente os investidores. Dez empresas abriram seu capital nos últimos seis meses, três a mais do que no mesmo período do ano passado. No entanto, o apetite dos investidores, principalmente dos grandes fundos de pensão e de investimento, que definem os preços, está bem diferente. Algumas ofertas anunciadas, como Camil, Liz Cimentos e Tereos Internacional foram suspensas porque o interesse foi menor que o esperado. Além disso, estreantes como a petrolífera Queiroz Galvão, acumulam perdas expressivas em relação ao índice Bovespa (leia tabela ao final da matéria).
A cautela dos grandes investidores ficou clara nos preços definidos para as ações das empresas no lançamento. Só a fabricante de sapatos Arezzo, a holding de farmácias Brazil Pharma e a empresa de entretenimento Time for Fun conseguiram vender ações dentro da faixa de preços estabelecida pelos bancos coordenadores. As outras sete ofertas saíram no piso ou até mesmo abaixo da faixa inicial prevista. “O fato de as operações terem saído da faixa não quer dizer que as ofertas tiveram um mau desempenho”, afirma o advogado Sérgio Spinelli, do escritório Mattos Filho, de São Paulo, um dos maiores especialistas em mercado de capitais do País.
“O fato de as ações ficarem abaixo do preço não quer dizer que os IPOs não deram certo” Sérgio Spinelli, advogado
“O mercado está turbulento, e conforme o dia ou a semana, o preço não fica dentro do esperado.” Spinelli , cujo escritório está organizando entre dez e 13 ofertas para o segundo semestre, entre emissões subsequentes – de empresas que já estão na bolsa – e IPOs, sustenta que há demanda, sim. “Tanto é que a maioria das ofertas foi bem-sucedida”, diz. No médio prazo, o otimismo de Spinelli faz sentido.
De acordo com o presidente da BM&F Bovespa, Edemir Pinto, 200 novas deverão ingressar na bolsa brasileira até 2015.
É verdade que, considerando-se a turbulência do mercado, até que foram produzidos alguns bons resultados pelas empresas novatas. Quem comprou os papéis da empresa de shopping centers Sonae Sierra, por exemplo, lucrou entre fevereiro e julho 24,75%, enquanto o índice Bovespa perdeu mais de 5%. Isso porque muitas das estreantes representam setores pujantes da economia doméstica e tendem a continuar atraindo o investidor estrangeiro, o personagem principal dessas ofertas. “No caso dos IPOs, mesmo em momentos mais difíceis na Europa e nos Estados Unidos, os fundos estão buscando oportunidades”, diz Hugo Penteado, superintendente da Santander Corretora.
Penteado, do Santander: apesar da crise, os fundos estrangeiros buscam boas oportunidades no País
Foi num desses momentos de incerteza que o investidor mineiro Agnaldo Quirino derrapou. Ele pensou em participar da emissão da Qualicorp em junho passado, mas decidiu ficar de fora da emissão. Acabou perdendo uma alta de mais de 17% no primeiro dia de negociação. “Vou passar a estudar mais as empresas e me aprofundar”, afirmou Quirino. “Me parece que a turbulência dos mercados e o apetite pelos IPOs não estão relacionados.”
Mesmo com os bons resultados pontuais, o risco de tentar lucrar rapidamente com IPOs numa bolsa turbulenta é bastante alto. Especialmente para investidores que faziam da especulação uma estratégia, como o engenheiro paulista Mike Camacho Martins Tosta. Investidor nato, Tosta trabalha na Petrobras e tem 99% de seu patrimônio investido em ações. Ele mesmo se define como um flipador, acostumado a vender o papel logo na estreia no pregão. “No passado, ganhava de 5% a 10% no primeiro dia”, diz. “Agora isso não é mais regra.” A última oferta da qual Tosta participou foi a do grupo de shopping centers Sonae Sierra, com a qual obteve lucro de 1,78% no primeiro dia.
Em outras operações, a tentativa de ganhar no curto prazo deu errado. Para não perder dinheiro, Tosta teve de manter em sua carteira, por um período mais longo, ações da Petrobras compradas na mega-capitalização da estatal, no ano passado. Agora, Tosta decidiu ficar fora dos IPOs e está operando com as blue chips e com ações de quinta categoria, os conhecidos “micos”, que oscilam muito e são uma aposta barata: custam centavos.
Os investidores mais conservadores, que pretendem comprar ações no IPO para mantê-las em carteira também precisam ter cuidado. O agente autônomo da XP Investimentos em Belo Horizonte, Ricardo Medici, observa que os investidores pessoa física gostam de empresas que conseguem entender. “Setores em que o investidor identifica mais facilmente a empresa, como o de varejo, costumam fazer mais sucesso”, diz Médici. Não é à toa que ofertas como as da Arezzo e do Magazine Luiza acumulam boa valorização em relação ao índice Bovespa. Os clientes estão certos nas apostar em empresas que já conhecem pelo menos um pouco. Mas só saber o que a empresa faz não basta: é preciso estudar os números a fundo.
“O investidor não deve só ler o prospecto, mas comparar os resultados com os das empresas do setor”
Leandro Martins, analista-chefe da Walpires Corretora
O conselho é ler atentamente o prospecto de quem vai lançar seus papéis, um calhamaço que costuma ter centenas de páginas. Vá direto aos fatores de risco, que contam o que pode dar errado na companhia, e compare indicadores, como a relação entre preço e lucro da empresa. Ele indica em quanto tempo haverá o retorno do investimento. Se a ação é cotada a cinco vezes o lucro, significa que a expectativa de retorno do investimento é de cinco anos. Observar pares no mercado também ajuda, como recomenda o analista-chefe da Walpires Corretora, Leandro Martins.
“Caso a Azul entre na bolsa, por exemplo, o investidor deve não só ler o prospecto, mas comparar os resultados da Gol e TAM para entender melhor se a ação está cara ou barata, na hora em que ela for precificada.” Mas isso não é tarefa fácil, como reconhece o analista da WinTrade, José Góes, que faz estes cálculos no dia a dia da profissão. “Além de o prospecto preliminar conter informações pontuais, é muito difícil prever o futuro de uma empresa”, diz Góes. Por isso mesmo é que o investidor deve procurar ajuda especializada e, mesmo assim, desconfiar, já que as corretoras também têm interesse em vender as ações.