25/04/2012 - 21:00
Em 2011, a bilionária americana Margaret Cargill encabeçou a lista dos maiores doadores do Estados Unidos ao deixar de herança US$ 6 bilhões para duas ONGs. O gesto surpreendeu não apenas pelo elevado valor como também pelo fato de ter ocorrido no período em que a economia americana vivia um de seus períodos mais sombrios. De acordo com o site The Chronicle of Philanthropy, Margaret foi acompanhada por outros 13 milhões de americanos, de todos os estratos sociais, que desembolsaram um total de US$ 10,4 bilhões para causas sociais, no período, o triplo do registrado em 2010. Por aqui, esse fenômeno ganha contornos antagônicos. Enquanto o volume de doações individuais vem caindo (leia quadro abaixo), os desembolsos feitos por instituições empresariais e aquelas ligadas a famílias abastadas não param de crescer.
(esq. para dir.) Joesley Batista, da Fundação JBS; Pinheiro Filho, da Fundação Israel Pinheiro;
Denise Aguiar, da Fundação Bradesco e Jacob Steinberg, do Instituto Rogério Steinberg.
E é isso que deverá mostrar a nova rodada da pesquisa do Gife sobre o investimento social privado, que deve ser concluída até o final do ano.“Investir em ações sociais se tornou parte integrante da estratégia de geração de valor das empresas”, diz Fernando Rossetti, secretário-geral do Gife, entidade que congrega as maiores fundações e institutos ligados a empresas e famílias brasileiras. “E, no caso dos empreendedores, é a forma de deixar um legado para a sociedade.” O último dado disponível, referente a 2010, indica que o chamado terceiro setor movimentou R$ 2 bilhões no País. E tudo indica que o número deverá crescer ainda mais. Isso porque começarão a aparecer no radar do Gife os desembolsos feitos pela safra de ONGs criadas nos últimos três anos.
A lista inclui o Instituto Roberto Sampaio Ferreira, criado no ano passado em homenagem ao fundador da Bombril e cujo primeiro orçamento foi de R$ 5 milhões, e o Instituto JBS, ligado à família do empresário Joesley Batista, controladora do frigorífico JBS, que surgiu em 2009 com uma dotação de R$ 11 milhões. Outro que se destaca nesse cenário é o Instituto EBX, criado pelo bilionário carioca Eike Batista e que, em três anos, contabilizou desembolsos de R$ 250 milhões em programas de preservação ambiental, além de ações sociais como o financiamento da instalação das bases das Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs). Para 2012, foram separados outros R$ 20 milhões. Mas a movimentação não fica por conta apenas dos novatos na filantropia.
Donos de sobrenomes de destaque na cena empresarial do Rio de Janeiro, São Paulo e Minas Gerais, que militam no setor há muitos anos, também estão ampliando suas apostas. É o caso da Fundação Bradesco, criada em 1956 pelo banqueiro Amador Aguiar, um dos fundadores do Bradesco. Hoje, a fundação administra uma rede de 40 escolas próprias, que cobrem do ensino fundamental ao secundário e estão espalhadas por todos os Estados da Federação e o Distrito Federal. O orçamento para 2012 foi definido em R$ 385,4 milhões, volume que representa um crescimento de 32% em relação ao ano passado. Até então, o incremento anual se situava na faixa de 8%, em média. O salto é resultado da decisão de ampliar a carga horária, de quatro para cinco horas diárias em cada turno. “Nosso objetivo é melhorar ainda mais a qualidade do ensino”, diz Denise Aguiar, neta de Amador e diretora da fundação.
Segundo ela, o desempenho dos 112 mil alunos atendidos pelas escolas mantidas pela fundação já está em linha com o que o governo federal projeta para a rede pública em 2022. “Agora, nosso desafio é atingir uma performance semelhante à dos alunos das escolas privadas.” Apesar de o governo ter conseguido praticamente universalizar o acesso à educação – 97% das crianças estão na escola –, esse segmento se mantém como uma espécie de xodó dos investidores sociais. De acordo com o Gife de cada R$ 100 aplicados por ONGs, cerca de R$ 80 são direcionados para projetos educacionais. O empreendedor Jacob Steinberg, dono da Servenco Engenharia e veterano do setor de construção no Rio de Janeiro, vislumbrou no apoio a essa área uma chance de homenagear o filho, o publicitário Rogério Steinberg, morto prematuramente em um acidente de automóvel em 1986, aos 34 anos.
Saúde, Eike Batista banca a construção de hospital infantil no Rio.
Por meio do Instituto Rogério Steinberg a família apoia jovens superdotados que vivem em famílias de baixa renda. Desde a criação da ONG, em 1997, 37 mil jovens já foram beneficiados. “A educação está na raiz da competitividade de um país”, afirma Antonio Matias, vice-presidente da Fundação Itaú Social (FIS), uma das ONGs ligadas à família Setubal, controladora do Banco Itaú. A fundação da família Setubal vai aplicar R$ 85 milhões neste ano, montante 9% superior ao desembolsado em 2011. Boa parte dos programas da fundação tem como foco as parcerias com escolas e gestores governamentais. Em alguns casos, os programas das ONGs se transformam em políticas públicas, como foi o caso da Olimpíada da Língua Portuguesa, criada pelo FIS, que foi adotada pelo MEC.
É nessa mesma linha que atua a Fundação Israel Pinheiro, de Belo Horizonte, criada em homenagem ao deputado que lhe dá o nome, construtor e primeiro prefeito de Brasília, e que hoje é comandada por seu herdeiro, Israel Pinheiro Filho. Ao longo de seus 18 anos de atuação, a fundação desempenha o papel de elo entre as administrações municipais de Minas Gerais e a sociedade. Um dos seus trabalhos mais importantes tem sido desenvolvido na capacitação de técnicos municipais para implementação da lei de resíduos sólidos, por meio do Programa Minas Sem Lixões. As políticas propostas incluem desde a elaboração de programas de implantação e coleta seletiva até a erradicação dos 295 lixões.