27/09/2013 - 5:30
Ouça uma análise da reportagem com o editor de Estilo da Istoé Dinheiro, Fabiano Mazzei.
Em tempos de depredação de carrões de luxo em praça pública, como um Maserati na China, em maio, e um BMW M6, em Frankfurt, há duas semanas, o anúncio do enterro de um Bentley por um conhecido playboy paulistano nas redes sociais na segunda-feira 16 ? e a torrente de comentários gerados depois disso ? era o cenário de horror perfeito para os executivos da marca britânica. O veteraníssimo Chiquinho Scarpa, o bon vivant mais conhecido do Brasil, postou em seu perfil no Facebook uma foto diante de um Flying Spur 2011, avaliado em R$ 1,1 milhão, com a legenda confirmando o ato de insanidade: ?Vou enterrar meu carro favorito, o Bentley, no jardim de casa?.
Lágrimas cênicas: Chiquinho Scarpa simula um choro enquanto o seu Bentley Flying Spur
é colocado na cova. Abaixo, um dos posts da campanha no Facebook
Em mais outros três posts, a página do Conde Scarpa, como se autointitula o playboy, que andava meio esquecido, recebeu nada menos do que 19.743 comentários, que variavam entre o humor sarcástico e a ira cáustica de quem não aprovava tal extravagância num País com tanta desigualdade social. Em meio a essa polêmica, o nome da fabricante de carrões de luxo, correndo o risco real de ir, literalmente, para o buraco junto com o carro. O desenrolar dessa novela é sabido. Nenhum veículo foi para a cova. Todo aquele auê tinha como pano de fundo uma campanha publicitária criada pela agência Leo Burnett alertando para a Semana Nacional da Doação de Órgãos, promovida pela ABTO (Associação Brasileira do Transplante de Órgãos).
A mensagem era que mais estúpido do que sepultar um carrão de luxo é se deixar enterrar com órgãos que poderiam salvar vidas, embora o episódio tenha ficado marcado também pela genialidade da ideia em si. A reboque, Scarpa passou de vilão a herói do dia para a noite. Ou de um clique para outro, com 47 mil ?likes? dados no post em que anunciava ser tudo parte de uma ação humanitária, uma armação do bem, enfim, na sexta-feira 20. Foi o dia em que o conde virou rei. ?Fomos pegos de surpresa?, diz o sócio gerente da montadora inglesa no Brasil, Joseph Tutundjian. O executivo garantiu que nada teve a ver com a ativação, como sugeriram alguns jornalistas que cobrem o mercado publicitário.
Joseph Tutundjian, da Bentley: “O resultado final
foi bom para a imagem da marca.”
A tese inicial que chegou a ser debatida era de que a Bentley estaria por trás daquela situação para promover a marca entre os consumidores brasileiros. Mas colocando um carro num buraco? Seria o caso de product placement mais controverso da história da propaganda. ?Não tivemos envolvimento com a campanha, mas o resultado final foi bom para a imagem da Bentley?, afirma Tutundjian. A reação do board internacional da marca também teria sido positiva, segundo o empresário. Em contato por telefone, os diretores do QG da Bentley, em Crewe, na Inglaterra, foram avisados do que estava acontecendo e ficaram tranquilos ao saber do mérito da ação. ?Eles ficaram felizes porque a causa era nobre.?
Marcelo Reis, o VP de criação da Leo Burnett que inventou o funeral, lembra que a escolha do carro foi ideia do próprio Chiquinho Scarpa. ?Ele disse que era o carro mais nobre que tinha na garagem?, lembra. E ele tem Ferrari, Maserati… Segundo Reis, a campanha custou em torno de R$ 15 mil, usados no aluguel da escavadeira e na contratação dos seguranças posicionados nas imediações da residência, no Jardim América, na capital paulista, no dia do enterro, já que a revolta dos internautas era motivo de tensão e um ponto de interrogação. A exposição da imagem pessoal de Scarpa e, por tabela, da marca Bentley, também. Mas o retorno positivo e espontâneo na mídia aliviou a todos. ?Ainda não medimos o quanto gastaríamos se apenas tivéssemos anunciado a campanha nos meios de comunicação?, diz Reis. ?Mas em nenhum momento nos preocupamos com isso.?
?Ele foi muito macho!?
Marcelo Reis, VP de Criação da Leo Burnett
Como surgiu a ideia?
Fomos até a ABTO, que é nossa parceira, propor essa ajuda para fazer a doação de órgãos virar assunto na vida das pessoas. Falamos de faraós, que enterravam sua riquezas, e logo pensamos no nome do Chiquinho Scarpa, que topou na hora.
A ira dos internautas preocupou vocês?
Sim, mas quem xingou antes aplaudiu depois. A maior apreensão era a de que o Chiquinho não aguentasse aquela pressão no Facebook e desistisse. Mas ele foi muito macho em enfrentar tudo.
Que avaliação faz da campanha?
Muito boa. Mas digo: se um órgão tiver sido doado com a ação e ajudarmos a salvar uma vida, já terá valido a pena.
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