DINHEIRO ? Uma das principais queixas de empresas que patrocinam times de futebol é quanto ao amadorismo na gestão dos clubes brasileiros e até à falta de idoneidade de alguns dirigentes. Por que o mercado deve acreditar num fundo de investimentos ligado a um time cujo principal ativo serão promessas de grandes craques?

LuiS Alvaro de Oliveira Ribeiro ?
Porque estamos adotando critérios rígidos de governança corporativa no Santos. Hoje o Santos tem um corpo gerencial formado por profissionais do mercado. Eles têm metas a cumprir e serão cobrados. Caso não alcance o que foi estabelecido, serão trocados. Não há mágica.
 

DINHEIRO ? Mas no core business,  para manter o linguajar corporativo, o Santos mantém um gerente que não saiu do mercado (o ex-jogador de futebol Jamelli é o diretor de futebol do Santos). O que o sr. já fez efetivamente para transmitir ao mercado que o Santos será diferente dos demais clubes brasileiros?

Ribeiro ?Jamelli é um ex-jogador que se preparou e um sujeito extremamente articulado. Tem uma visão do negócio futebol. O futebol é um negócio da indústria do entretenimento e, portanto, tem que produzir resultados. Como o clube não é empresa, e eu não acredito em clube-empresa…
 

DINHEIRO ? Por que não?

Ribeiro ?Porque futebol é paixão, não é uma mercadoria que se vende na feira. É um negócio que nasceu da associação de comerciantes de café do século passado, da colônia italiana ou portuguesa. Os clubes ingleses que viraram sociedades anônimas caíram nas mãos de xeques árabes ou de magnatas russos. É um erro acreditar que um time de futebol é uma empresa. O que não quer dizer que você não deva administrá-lo com regras de boa governança corporativa. O Barcelona é um bom exemplo. É um clube de futebol administrado como uma empresa.
 

DINHEIRO ? Quais foram as primeiras providências que o sr. tomou para dar esse ar de empresa à administração do Santos?

Ribeiro ? O primeiro passo foi reformar o estatuto do clube. Aquilo era medieval, com reeleições indefinidamente. O direito mais primitivo era negado ao sócio: escolher seus representantes. E note o seguinte, eu não tenho um clube. Não tem piscina, não tem academia de ginástica, nem quadra de bocha tem na Vila Belmiro. É só um estádio de futebol e 24 mil sócios. O que eu costumo dizer é que o Brasil dá um show em várias áreas. Na engenharia, por exemplo, temos nomes como Odebrecht, Andrade Gutierrez. Somos a vanguarda na exploração e produção de petróleo, o maior produtor de soja do mundo, mas no futebol nos comportamos como uma república centro-africana vendendo matéria-prima. O exemplo do Kaká é emblemático. O São Paulo o vendeu por US$ 9 milhões e, três anos depois, ele virou um jogador de US$ 80 milhões. 
 

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“Fui diretor do Banco Central e chefe de gabinete do Bresser Pereira”
Bresser Pereira, ministro da Fazenda no governo de José Sarney (em 1987)

 

DINHEIRO ? O sr. quer mudar a  pauta de exportação no quesito bola?

Ribeiro ? O que estou propondo é que paremos de exportar matéria-prima. Temos que vender produto com valor agregado, só que, para isso, é preciso respeitar um ciclo de amadurecimento desse ?produto?. O atleta precisa amadurecer como jogador, como ídolo e como cidadão. Se você vende um garoto de 18 anos para o Exterior, para ele enfrentar o desafio de uma cultura que ele não conhece, de uma língua que ele não pratica, ele pode voltar antes da hora sem ter consolidado seu nome nem lá fora nem aqui. Por outro lado, também corre-se  o risco de ele sair por um preço aqui e, dois anos depois, valer muito mais.
 

DINHEIRO ? Qual é a diferença entre o fundo do Santos e os que estão no mercado, como Traffic ou DIS?

Ribeiro ? A ideia é investir na formação de jogadores jovens que tenham capacidade de, expostos na vitrine chamada Santos Futebol Clube, gerar valor. Este valor tem de ser partilhado entre quem exibe, quem cria a riqueza e quem investe. Vamos pegar o exemplo do Keirrison (ex-jogador do Coritiba, emprestado para o Palmeiras e vendido pela Traffic para o Barcelona). Ele foi embora e o que ficou para o Palmeiras, que foi a grande vitrine para o jogador? Olha esse jogador que trouxemos agora do Juventude, o Zezinho. São dois anos de contrato. Ele fica até, no mínimo, o fim de 2011 e, se aparecer uma proposta, o Santos pode exercer seu direito de preferência. Caso não haja interessados nesse período, tanto o time como os investidores serão beneficiados com o processo de geração de riqueza.
 

DINHEIRO ? O que o sr. projeta em termos de captação de recursos?

Ribeiro ? Algumas centenas de milhões de euros. Aqui no Brasil, talvez a gente possa começar captando algo próximo a R$ 40 milhões. O mercado é que vai responder e, quando digo mercado, não estou falando apenas dos torcedores do Santos. Estou falando de investidores profissionais. 

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“Você tem Ronaldo, Ganso, Robinho e Neymar em campo e quer pagar R$ 10?”
Paulo Henrique Ganso, uma das estrelas do Santos

 

DINHEIRO ? O futebol é mais volátil que a bolsa. Como assegurar aos investidores que o Santos manterá sua regularidade?

Ribeiro ? Os riscos são inerentes a qualquer investimento. Mas estamos trabalhando para ter a maior estabilidade possível. Primeiro fomos ao mercado em busca de um técnico que tivesse não apenas o perfil vencedor ? e o Dorival Jr. tem ?, mas fosse um profissional capaz de desenvolver nossos talentos. Estou dizendo isso para mostrar que estamos no caminho certo. Tenho uma longa trajetória na área econômica. Fui chefe de gabinete do ex-ministro Bresser Pereira (ministro da Fazenda do governo Sarney, em 1987), fui diretor administrativo do Banco Central e diretor de patrimônio no antigo Banespa. Tenho a minha empresa, a Adviser, de consultoria  em investimentos imobiliários, há mais de 20 anos. Foi meu avô quem comprou o terreno onde hoje está a Vila Belmiro. Tenho seis filhas e o Santos é o meu filho homem. Sei o que estou fazendo e sei o que posso fazer pelo clube.
 

DINHEIRO ? Cinco meses após assumir o Santos, quais são os resultados da política de boa governança corporativa no clube?

Ribeiro ? Reduzimos gastos com segurança e limpeza em 30%. No dia em que assumi, me trouxeram a posição do caixa e eu tinha 48 horas para levantar R$ 5 milhões. Isso foi no dia do meu aniversário. Presentão, hein? Os salários de novembro, dezembro e o 13º não haviam sido pagos. Conseguimos um empréstimo e pagamos. Tínhamos uma dívida de curto prazo de R$ 60 milhões com bancos e fornecedores. Conseguimos alongar o prazo de pagamento e reduzir os juros. Ainda temos uma parte importante, que é a dívida com a família do ex-presidente, mas também estamos renegociando. Nossa folha de pagamentos diminuiu 9,5% em relação a 2009. Só no futebol, era de mais de R$ 4 milhões e hoje não chega a R$ 3,5 milhões.

DINHEIRO ? Como, se acabam de reajustar os salários do Neymar e do Ganso?

Ribeiro ? Santos é uma cidade muito boa para aposentados, sabe? Tem muita gente em fim de carreira que vem para cá. Dispensamos estrelas como Fabão, Emerson, Kleber Pereira, e reduzimos o salário do Fábio Costa. Mesmo com o reajuste no salário dos meninos, estamos pagando 10% menos do que pagávamos em 2009.
 

DINHEIRO ? E, em termos de receita, como anda a arrecadação?

Ribeiro ? Nosso antigo parceiro (Semp Toshiba) queria renovar o contrato por R$ 7 milhões. Não aceitamos, ficamos dois meses com a camisa limpa e hoje recebemos R$ 24 milhões de patrocínios. Até o ano passado, nossa área de licenciamento rendia R$ 800 mil. A meta é atingir R$ 5 milhões em 2010. Por contrato, não posso revelar quanto, mas asseguro que a venda de camisas aumentou bastante e a nossa renda com bilheteria está em franca ascensão.
 

DINHEIRO ? Mas o preço dos ingressos subiu muito…

Ribeiro ? De um lado você tem Ronaldo e Roberto Carlos; do outro, Robinho, Neymar e Ganso. Você quer pagar R$ 10 para ver um espetáculo desses? Desde que assumimos, o Santos marcou um gol a cada 26 minutos. Quer recompensa maior para o torcedor do que um enorme sorriso a cada 26 minutos? Isso tem um custo e eu preciso praticar uma política de preços correta para não ficar com o pires na mão. Isso é gestão. 
 

DINHEIRO ? E o sr. acha que essa percepção já chegou ao mercado?

Ribeiro ? Claro. Senão você não estaria aqui. Você poderia falar com o Andrés (Sanches, presidente do Corinthians), com o Juvenal (Juvêncio, presidente do São Paulo). Mas você está aqui, entrevistando o presidente do Santos. Isso quer dizer alguma coisa, não? 
 
 

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