Os primeiros jogadores brasileiros de futebol que desfilaram seu talento pelos campos da Espanha foram Jaguaré e Fausto dos Santos, ídolos do Vasco que foram contratados pelo Barcelona após turnê do clube cruzmaltino pela Península Ibérica no início da década de 1930. Anos mais tarde, Evaristo de Macedo, Vavá e Didi abriam definitivamente o mercado para atletas tupiniquins atuarem em território espanhol. Mais recentemente, Romário, Rivaldo, Ronaldo Fenômeno, Ronaldinho Gaúcho e Roberto Carlos fizeram história por lá. Hoje, 22 futebolistas brasileiros estão inscritos no Campeonato Espanhol, destaque para os merengues Vinícius Junior, Rodrygo e Militão do Real Madrid, que também defendem a Seleção Brasileira e devem estar na Copa do Catar no fim do ano. Com tantos serviços prestados por brasileiros há quase um século, agora é a LaLiga, empresa dona do Campeonato Espanhol de futebol, que quer colocar os pés no Brasil.

Não com a exportação de jogadores, pois não existe nenhum espanhol entre os 648 jogadores inscritos na Série A do Campeonato Brasileiro. A liga espanhola quer aumentar o engajamento dos fãs brasileiros, promover mais eventos e melhorar o produto para aumentar sua receita a partir de contratos por aqui. “Temos 5 milhões de torcedores no Brasil que acompanham LaLiga. É o principal mercado fora da Espanha. Mas em termos de rendimento financeiro, está entre os dez principais”, disse à DINHEIRO Daniel Alonso Duarte, delegado da LaLiga no Brasil. Ele é um dos 46 delegados da LaLiga espalhados pelo mundo – a organização também possui 11 escritórios fora da Espanha. Nenhum aqui.

A jogada que LaLiga ensaia no Brasil faz parte de um plano de internacionalização que começou dez anos atrás. Em 2013, LaLiga registrou receita de 800 milhões de euros, quase totalmente conquistada dentro da Espanha. Em 2021, a entidade obteve faturamento de 3 bilhões de euros, sendo 40% oriundos de contratos em outros países. No Brasil, a principal fonte é o contrato de transmissão de jogos com a ESPN, do grupo Disney – os valores não são revelados. LaLiga quer mais do que isso. Vai promover mais encontros com fãs, influenciadores e jornalistas, usando seus garotos-propaganda Marcos Senna (atuou em 11 temporadas no Villarreal, de 2022 a 2013) e Denílson (jogador do Betis de 1998 a 2005) para ações pontuais. Também tem reforçado os conteúdos em português nas redes sociais. É uma das poucas ligas do mundo que possui canais próprios para o público brasileiro. A entidade esportiva também organiza um camp, que está sendo formatado para o público brasileiro, para que jovens do País passem um mês treinando na Espanha.

PARCEIROS As iniciativas têm seu foco voltado para conquistar um parceiro no País. Como ocorreu recentemente com a seguradora americana Chubb, que firmou o primeiro acordo de patrocínio regional da história da LaLiga, para a América Latina. A marca terá visibilidade ao longo da temporada 2022/2023 por meio de ativações presenciais e digitais para clientes e torcedores.

O contrato ocorre em meio a outros processos de mudanças da organização esportiva, que no fim do ano passado vendeu 10% de seus negócios para o fundo de investimento global CVC, que fará investimentos diretos nos clubes espanhóis na ordem de 2 bilhões de euros nos próximos anos. Desse montante, 70% têm de ser aplicados em infraestrutura, desenvolvimento internacional, desenvolvimento de marca e produto, estratégia de comunicação, inovação e tecnologia. Já estão em andamento obras de melhorias em centros de treinamento e estádios, principalmente de clubes de menor dimensão. Outros 15% devem ser usados para contratar jogadores e os 15% restantes para reduzir as dívidas dos clubes. “O produto será melhorado e haverá promoção e crescimento global da LaLiga e de seus clubes”, disse Duarte, que comanda times comercial e de comunicação no Brasil.

Nessa direção, a LaLiga também mudou a empresa que detém o naming rights da competição para as próximas temporadas. O banco Santander fica até o atual campeonato 2022/2023 e depois, pelo período de 2023 a 2028, o torneio vai se chamar LaLiga EA Sports, empresa de games e entretenimentos esportivos. “Estamos em busca de companhias e parceiros para agregar valor”, afirmou o delegado da entidade no Brasil. É justamente isso que vai ocorrer com a EA Sports, que atuará nos setores de tecnologia, digital, conteúdo, esporte de base e branding.

Nesse projeto está incluído a LaLiga Tech, uma spin-off fornecedora de tecnologias e dados interconectados. Oferece desde solução para combate a produtos e serviços falsificados (pirataria on-line) até produtos para maior engajamento de fãs, plataforma proprietária de streaming, criação de aplicativos incluindo fantasy games e canal de dados de partidas em tempo real que gera estatísticas avançadas durante o jogo para uso por equipes de treinamento e parceiros de transmissão. “Melhoria do jogo dentro e fora do campo”, disse Duarte.

Dentro do campo, a LaLiga também tem visão global. Segundo a Transfermarkt, plataforma especializada em informações sobre futebol, o Campeonato Espanhol possui 496 jogadores, sendo 211 estrangeiros (42,5%), de 58 nacionalidades. A maioria argentinos (14,8%) e brasileiros (10,5%). Para efeito de comparação, a primeira divisão do Campeonato Brasileiro possui 648 atletas inscritos, sendo 95 estrangeiros ou com cidadania de outros países (14,7%), de 15 nacionalidades. O Brasil caminha para ter sua liga de clubes. LaLiga está disposta a colaborar como consultora. Fora de campo temos muito a aprender com eles.