O presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo, reforçou nesta quinta-feira, 27, que, no curto prazo, a inflação seguirá acima da meta perseguida pela autoridade monetária, que tolera um Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de no máximo 4,5%.

Durante entrevista coletiva para detalhar o Relatório de Política Monetária (RPM), divulgado pela manhã, ele disse que deve ser o primeiro chefe do BC a escrever, em um único ano, duas cartas ao presidente do Conselho Monetário Nacional (CMN) explicando a inflação acima do limite superior do intervalo de tolerância da meta. A primeira carta foi entregue em 10 de janeiro.

Segundo o presidente do BC, a autarquia tem procurado comunicar que, no curto prazo, será preciso conviver com o IPCA acima da meta, apesar dos juros em nível elevado.

Ele reiterou a sinalização de que, em um ambiente de incertezas, os juros seguirão subindo, embora em menor magnitude, na próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), que acontecerá nos dias 6 e 7 de maio.

Em relação às próximas decisões, Galípolo evitou dar mais indicações. Disse que o BC quer preservar graus de liberdade, observando os dados.

Ele rebateu questionamentos sobre o compromisso do BC em buscar a meta de inflação. “É curioso alguém falar em não comprometimento com a meta após alta de 3 pontos porcentuais na Selic”, declarou Galípolo ao ressaltar que o BC mostrou “com clareza” seu compromisso com a meta.

Autonomia dos diretores

O presidente do Banco Central disse ainda que todos os membros do Copom têm autonomia e têm os votos publicados. Respondendo a uma pergunta durante a entrevista coletiva do Relatório de Política Monetária, ele negou que os aumentos nos juros este ano tenham sido determinados pelo ex-chefe do BC Roberto Campos Neto.

“Eu já tinha dito, em dezembro, que o Roberto tinha sido generoso de, já na última reunião, permitir que eu pudesse assumir um papel maior, de protagonismo, ao longo da discussão daquela reunião do Copom”, disse Galípolo. “Para além disso, todos os diretores têm autonomia e, em todos os meus votos e em todos os votos dos diretores, está lá expresso o que é a consciência e a visão de cada um dos diretores.”

Ele se recusou a falar sobre comentários de membros do governo, que têm repetido que as altas de juros feitas por Galípolo foram “contratadas” por Campos Neto – em dezembro, o comitê aumentou os juros em 1 ponto porcentual e sinalizou mais duas altas da mesma magnitude. Recentemente, o próprio presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse que Galípolo não poderia “fazer um cavalo de pau” na condução da Selic.

Função de reação

O presidente do Banco Central explicou que, quando menciona a função de reação da instituição, refere-se ao momento atual. “É uma função-reação deste momento, que é um cenário onde o Banco Central reagiu subindo a taxa de juros nominal mais do que vinha crescendo a inflação, para apertar numa entrega de um orçamento bastante significativo que adentra num patamar de taxa de juros que é contracionista”, disse.

Ele lembrou que existe ainda um quadro em que a expectativa está desancorada, a inflação corrente rodando acima da meta e existem uma série de adversidades para o Banco Central enfrentar. “É por isso que a gente não encerrou o ciclo”, justificou, acrescentando que o Copom seguirá dialogando com todas essas variáveis, até porque as expectativas vão sempre ser um componente muito importante para determinar a trajetória de decisão do colegiado.

“A nossa função de reação é muito mais difícil num processo desinflacionário, com as expectativas desancoradas como elas estão hoje, mas o que a gente está tentando comunicar é que o Banco Central entende como se dá esse mecanismo de transmissão”, disse. “Ou seja, você dá o remédio agora, o remédio vai ter um efeito ao longo do tempo e a percepção de que esse remédio está funcionando ou não vai ser contada por uma série de dados e indicadores que vão dizer se a dosagem do remédio está adequada ou não”, ilustrou.

Núcleos

O presidente do Banco Central minimizou nesta quinta-feira declarações do vice-presidente Geraldo Alckmin. Esta semana, Alckmin elogiou o Federal Reserve (Fed, banco central norte-americano) por supostamente olhar para um núcleo de inflação que exclui alimentos e energia – menos sensíveis à política monetária -, e disse que algo assim deveria ser estudado pelo BC.

“Eu acho que ele está discutindo, olhando para cenários internacionais e práticas internacionais”, disse Galípolo. “Do nosso lado, a gente está bastante satisfeito com o que nós temos aqui, do nosso arcabouço, mas a autonomia do Banco Central não implica que as pessoas não podem fazer comentários sobre o arcabouço, debater esse arcabouço.”

Galípolo ponderou que a média dos núcleos observada pelo BC também está acima da meta, no acumulado de 12 meses, e apenas pouco abaixo da inflação cheia.