19/02/2019 - 14:54
Cientistas acabam de anunciar o sequenciamento completo do genoma do grande tubarão branco – uma das mais famosas (e temidas) criaturas marinhas de todos os tempos, estrela de um dos filmes de maior sucesso da história de Hollywood. As novas informações vão ajudar na preservação do animal, ameaçado de extinção, e até mesmo na pesquisa contra o câncer.
O tubarão branco (Carcharodon carcharias) é uma das espécies mais antigas a habitar a Terra, com mais de 400 milhões de anos, e sua longevidade como espécie sempre intrigou os cientistas. O seu sequenciamento genético revela alguns desses segredos. O genoma do tubarão apresenta inúmeros genes cuja função é dar estabilidade ao conjunto genético, evitando mutações e vários tipos de câncer. O animal também tem uma capacidade superior de cicatrização de feridas.
O estudo foi publicado na PNAS e conta com a participação de cientistas da Fundação e Centro de Pesquisa em Tubarões Salve o Oceano, entre outras instituições dos EUA. A decodificação do genoma – uma vez e meia maior que o dos seres humanos – revela uma grande variedade de alterações genéticas que estariam por trás do grande sucesso evolutivo do gigante monstro marinho.
Os pesquisadores conseguiram identificar sinais de adaptação molecular (também conhecida como seleção positiva) em inúmeros genes que exercem um papel importante na manutenção da estabilidade genômica – o mecanismo genético de defesa que faz frente ao acúmulo de danos no DNA de uma espécie, preservando, assim a integridade do genoma.
Essas alterações foram encontradas em genes ligados à reparação do DNA, à resposta a danos, e também à tolerância a danos. O fenômeno oposto, chamado de instabilidade genômica, resultante do acúmulo de danos no DNA, é bem conhecido por predispor os humanos a diversos tipos de câncer e outras doenças relacionadas ao envelhecimento.
A descoberta de que os tubarões apresentam essas adaptações que dão estabilidade ao seu código genético é significativa porque, em tese, o risco de desenvolver câncer aumenta quanto maior for o animal (maior número de células) e também quanto mais longevo ele seja.
Mas ao contrário do que seria esperado no caso do tubarão branco – que mede de 5 a 6 metros de comprimento e pode viver por mais de 40 anos –, o animal tem um registro muito baixo de câncer, sugerindo que eles desenvolveram um tipo de proteção contra a doença.
“Decodificar o código genético do tubarão oferece à ciência novas informações para decodificar um dos maiores mistérios sobre esses temidos e mal compreendidos predadores: como é que eles existem há 500 milhões de anos, muito mais do que a grande maioria dos vertebrados da Terra”, afirmou Salvador Jorgensen, pesquisador do Aquário da Baia de Monterey, um dos coautores do estudo.
As inovações não param por aí. O genoma do tubarão revelou uma outra adaptação evolutiva nos genes relacionados aos processos de cicatrização. Os tubarões são conhecidos por apresentarem uma cicatrização muito rápida de ferimentos graves.
“O genoma revela o que a gente já tinha observado na natureza: dificilmente um tubarão morre de câncer”, constata o biólogo marinho Marcelo Szpilman, diretor-presidente do AquaRio, especialista em tubarões. “E a outra coisa que também sempre observamos é a capacidade de cicatrização desses animais. A pesquisa comprova tudo isso e abre um caminho para, quem sabe, lá na frente, o desenvolvimento de novos tratamentos para o câncer humano.”
A decodificação do genoma pode ajudar ainda a preservar a espécie, ameaçada pela ação predatória do homem, a poluição e a degradação de seu habitat.
“Trata-se de uma espécie que há 400 milhões de anos não tem praticamente nenhuma modificação do ponto de vista evolutivo; ou seja, é uma espécie extremamente bem adaptada”, resume Szpillmann. “A única coisa com a qual não contava era com o surgimento do homem; o único que representa uma real ameaça aos tubarões”, diz o pesquisador.