02/02/2024 - 12:22
Fotos de um grupo de pinguins andando pelas ruas da cidade? Com inteligência artificial (IA), talvez. À medida que ferramentas como MidJourney — capaz de produzir imagens ultrarrealistas em poucos segundos — se popularizam e substituem ou complementam o trabalho de fotógrafos, observadores de empresas de conteúdo visual podem considerar que o setor está caminhando para o fim. Na visão da Getty Images, uma das principais fornecedoras mundiais de mídia digital, a IA generativa representa mais uma oportunidade para alavancar o negócio.
A empresa, por trás do iStock, acaba de lançar seu próprio modelo de IA generativa. Desenvolvida pela Nvidia Picasso, a ferramenta funciona por comandos de texto e dá outra possibilidade aos usuários: ter autonomia sobre a criação de suas peças e gerar conceitos complexos para sessões de fotos, indo além dos limites das técnicas tradicionais.
“Para muitos profissionais, a IA generativa criou possibilidades de produzir conteúdo que, de outra forma, seria muito caro ou logisticamente impossível, como é o caso dos pinguins marchando em Nova York”, disse Grant Farhall, diretor de produtos da Getty, à DINHEIRO.
Enquanto o atual cenário da IA é movimentado por manipulação de imagens, deep fakes, sobrecarga de informação e saturação tecnológica, Farhall afirma que a nova ferramenta se destaca por ter sido construída em cima da ideia de que a narrativa visual autêntica é uma via fundamental para estabelecer confiança entre empresas e consumidores.
A estratégia, nesse caso, foi a construção do novo recurso com base na biblioteca criativa da Getty e nas fotos do próprio iStock, impedindo o uso de imagens protegidas por direitos autorais e os possíveis perigos envolvidos nos fins comerciais.
Para simplificar: o modelo de IA não sabe quem é a Taylor Swift, o Bob Esponja ou o que é um swoosh da Nike. Por isso é preciso treinar a IA com preceitos legais e morais. Isso impede que usuários gerem imagens no estilo de artistas nomeados, como Van Gogh ou Salvador Dalí, por exemplo.
“Permitir que a IA generativa seja treinada com base em obras protegidas eleva a criação de conteúdos ilimitados e de baixo custo, que competem com trabalho de artistas essenciais para uma sociedade vibrante e progressista”, afirmou Farhall.
PERIGOS
Com a proximidade das eleições presidenciais nos Estados Unidos, empresas de IA já começaram a se posicionar com relação aos perigos envolvidos na tecnologia. Um exemplo é a OpenAI, startup responsável pelo desenvolvimento do ChatGPT.
• Em anúncio recente, a companhia se comprometeu a “evitar abusos, proporcionar transparência em conteúdos gerados por IA e melhorar o acesso a informações precisas sobre votações”.
• No caso da Getty Images, reconhecida por fornecer conteúdos de alta qualidade e clicados por fotógrafos profissionais, o compromisso é o mesmo.
• Segundo Farhall, a dona do iStock reconhece os riscos potenciais da tecnologia e destaca a necessidade dos fornecedores de modelo de IA generativas abordarem questões como desinformação, preconceito e utilização indevida.
• Ainda de acordo com Farhall, a parceria com a Nvidia tem sido essencial para driblar esse tipo de problema. “Estamos trabalhando para bloquear solicitações que possam gerar qualquer tipo de conteúdo problemático.”
• Quando se trata do Brasil, ele afirma que a Getty Images encontrou um terreno propício para impulsionar seus avanços, aproveitando a receptividade dos brasileiros às novas ferramentas.
De acordo com uma pesquisa global realizada pela empresa, a América Latina se destaca como uma das regiões mais entusiasmadas e interessadas na inteligência artificial em todo o mundo. Com uma amostragem de 7 mil adultos em 25 países, o estudo VisualGPS revelou que o interesse dos brasileiros na IA é 15% superior à média global.
Além disso, nove em cada dez pessoas na região acreditam que a IA pode contribuir para tornar suas vidas mais eficientes. “Vemos o Brasil como um mercado dinâmico e em crescimento, por isso estamos investindo não apenas com nossas ferramentas de IA, mas em todas as ofertas e experiências em conteúdo visual”, disse Farhall. A Getty Images não divulgou o valor investido.
A NOVA FERRAMENTA
• O preço da ferramenta será de US$ 14,99 para 100 prompts (comandos), com cada prompt gerando quatro imagens.
• Além disso, cada imagem gerada licenciada vem com a cobertura legal padrão de US$ 10 mil (cerca de R$ 50 mil).
• De acordo com Farhall, não há expectativa de que o novo recurso gere (agora) níveis de receitas equivalentes às bibliotecas de imagens, parcerias e soluções de conteúdo personalizado. Porém, ele diz acreditar que o produto está bem posicionado para competir a longo prazo.
“Estamos com uma enorme vantagem devido à quantidade de dados e conteúdo de classe mundial em imagens editoriais, criativas e arquivos, que inclusive remontam a algumas das primeiras fotos já tiradas”, afirmou.
Como próximos passos, o executivo adianta que a plataforma iStock vai ganhar recursos inpainting e outputting, que permitem mascarar a região de uma imagem e, em seguida, preencher com uma pessoa ou objeto descrito por meio de um prompt e expandir imagens para ajustá-las em diversas proporções. “Recursos poderosos para criar imagens com tamanhos exclusivos para publicidade e mídias sociais”, afirmou.
BATALHAS JUDICIAIS
Além dos algoritmos, a nova ferramenta da Getty Images carrega, indiretamente, a mensagem sobre a importância dos direitos autorais e da propriedade intelectual. A batalha, contudo, vem sendo travada de outras formas. Recentemente, a gigante do banco de imagens entrou com uma ação contra uma empresa proprietária de uma ferramenta de inteligência artificial, acusando a companhia de usar indevidamente suas fotos.
De acordo com um comunicado emitido pela dona do iStock, a disputa é pela propriedade intelectual das imagens que tem aparecido em montagens realizadas pela empresa acusada.
Na opinião de Farhall, a defesa da privacidade individual e da obtenção do consentimento dos titulares de direitos para o treinamento da tecnologia estão numa batalha sobre a regulamentação. “Sem regulamentação, o fardo da verificação de conteúdos gerados por inteligência artificial recai sobre o público, levando potencialmente ao plágio e à influência de conteúdos enganosos”, afirmou o diretor de produtos da Getty.