17/01/2025 - 6:00
Após meses a fio com diálogos entre Azul e Gol e representantes de ambas as partes citando que as conversas ‘estavam evoluindo’, enfim um acordo foi selado. As companhias anunciaram um acordo não vinculante com o objetivo de explorar uma combinação de negócios.
Ou seja, a expectativa é de em um futuro breve ambas as empresas de fato se tornem uma só. Todavia, Azul e Gol seguirão operando como marcas independentes. Mas quais são as etapas e condicionantes para o negócio se concretizar?
+Azul e Gol selam acordo para possível fusão e citam ‘rotas complementares’
Empresas dominam 60% do mercado doméstico
A união das duas empresas resultaria em uma gigante que dominaria 60% do mercado doméstico, superando os 40% da concorrente Latam, segundo dados da Anac.
Segundo a Gol, esse acordo representa uma fase inicial de um processo de negociação entre a Abra – holding que controla a Gol -para então explorar a viabilidade de uma fusão.
A companhia diz que isso não tem impacto na estratégia, na condução dos negócios ou nas operações rotineiras.
A Azul, por sua vez, aponta que o objetivo da combinação de negócios é promover o crescimento da indústria aeronáutica brasileira, por meio de mais destinos, rotas, conectividade e serviços aos consumidores, com aumento da oferta de voos domésticos e internacionais.
Segundo a empresa, as duas companhias aéreas têm aproximadamente 90% de rotas complementares e não sobrepostas.
“Essa combinação de forças proporcionaria a oportunidade de fortalecer o setor, aumentando o número de voos oferecidos, alcançando mais de 200 cidades atendidas no Brasil e a capacidade de competir em um setor altamente globalizado”, afirma o CEO da Azul, John Rodgerson.
“O aumento da conectividade e a criação de empregos são alguns dos muitos resultados positivos esperados deste acordo, além de oferecer um serviço de alta qualidade e a busca pela melhor relação custo-benefício para o consumidor”, acrescenta.
Rodgerson, aliás, já havia declarado em outras situações que o negócio seria oportuno para o público, tecendo comentários positivos acerca de uma eventual fusão.
Em entrevista ao Dinheiro Entrevista, o executivo declarou que seria uma oportunidade relevante, especialmente em um contexto macroeconômico desafiador, já que o dólar negocia na casa dos R$ 6. O executivo ainda destacou que a sua visão é de que ambas não são concorrentes entre si, mas competem com o mundo.
Como seria a composição da nova empresa
Segundo analistas do Bradesco BBI, a Abra deve deter 31% da nova empresa, enquanto a Azul deve deter 7%.
A operação, segundo os analistas, deve ocorrer assim:
- Primeiramente a Gol aprova aprova um aumento de capital e emite novas ações para credores
- A nova empresa então converte as ações preferenciais em ações ordinárias, resultando em uma entidade de classe única listada no Novo Mercado da B3 e na NYSE
- As empresas fundirão ações, seja com a Azul Holding se tornando uma subsidiária da Gol Holding ou vice-versa
Conforme comunicado por ambas as empresas, o CEO da nova companhia aérea seria Rodgerson, ao passo que a cadeira de presidente do Conselho de Administração ficaria com a Abra.
No conselho, três membros do conselho seriam indicados pela Azul, três seriam da Abra e haveriam ainda outros três membros independentes.
Gol precisa deixar Chapter 11 para voar junto com a Azul
Para a fusão ocorrer, é necessário que a Gol tenha sucesso no seu procedimento de Chapter 11 – como é chamada a recuperação judicial nos EUA. A companhia se encontra nesse status desde janeiro de 2024.
A alavancagem financeira da empresa resultante deve também ser menor do que o que é esperado para a Gol após a saída da recuperação judicial – fator que também pode ser uma pedra no sapato para o negócio em questão.
Conforme o resultado financeiro mais recente da companhia, referente ao terceiro trimestre de 2024, a Gol o mês de setembro com dívida líquida de R$ 27,582 bilhões – cifra que representa alta de 43,4% na base anual. A alavancagem da empresa fechou em 5,5 vezes o seu lucro ante de juros, impostos, depreciação e amortização (Ebitda, na sigla em inglês).
Do outro lado, a Azul também enfrentou problemas financeiros em um passado recente. Durante o ano de 2024, rumores sobre uma possível recuperação judicial também permearam a imprensa. Todavia, a empresa empreendeu esforços para equacionar seu passivo e outras questões financeiras, chegando a uma solução no mês de outubro, quando fechou acordo com credores para obter financiamento adicional. A novidade animou o mercado, que respondeu a notícia com uma valorização expressiva das ações, e afastou totalmente os rumores de recuperação judicial.
Possíveis restrições do Cade
Ao negócio avançar e receber a aprovação dos acionistas, também será necessário passar pelo crivo de reguladores – o que pode ser uma pedra no sapato e implicar em restrições para a transação.
A fusão dependerá de aprovação de órgãos como o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) quanto da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac).
Apesar de as discussões serem iniciais, a concentração de mercado aumentaria direta e expressivamente com o negócio sendo fechado.
Integrantes do Cade, sob condição de anonimato, declaram ao jornal Valor Econômico que seria “00quase impossível” aprovar a fusão entre Gol e Azul sem restrições. “É errado dizer que há um único mercado. Sob a ótica antitruste, há centenas de mercados, as rotas, e vamos analisar um por um”, comentou um integrante do órgão.
A visão é de que esse negócio chegará à análise dos conselheiros do Cade, já que é um processo complexo que não seria encerrado na Superintendência-Geral do órgão.
Reação do mercado
Conforme dados do Status Invest, o valor de mercado da Azul é de R$ 1,6 bilhão, ao passo que a Gol vale R$ 765 milhões.
Com o negócio tomando forma, a discussão agora é como seriam as sinergias entre as empresas.
Analistas do UBS-BB, em relatório sobre o tema, citaram que a administração da Azul se mostrou ‘muito positiva’ acerca do acordo, com as sinergias gerais – especialmente do lado da receita.
“A empresa citou melhores capacidades de reserva, gestão de frota entre rotas, benefícios fiscais, operações de carga e receitas auxiliares como potenciais fontes de sinergia. Além disso, sinergias de custos também podem ser esperadas na visão deles, vindas de combustível (a Azul tem menor custo)”, avaliou a casa.
“As sinergias totais (receitas+custos) vistas em fusões e aquisições anteriores mostram uma mediana de +6% (a administração da Azul espera um dígito alto em termos de sinergias, a serem implantadas principalmente nos primeiros dois anos após o acordo)”.
Analistas da research do Santander, que tem recomendação neutra para AZUL4 com preço-alvo de R$ 6, apontam que a ‘transação melhorará significativamente o cenário competitivo da indústria aérea brasileira’.
Apesar disso, apontam que será ‘um caminho longo e sinuoso’ até que as sinergias sejam alcançadas (olhando para back office, esforços comerciais conjuntos, negócios de fidelidade, negócios de carga).
“Mais especificamente, acreditamos que a nova empresa sofreria em algumas frentes, como integração de frota, dado o uso de diferentes aeronaves pelas empresas em fusão (o que implicaria em falta de sinergias quando se trata de treinamento de pilotos, mecânicos de aeronaves, centros de manutenção, entre outros). Além disso, continuamos a ver um ambiente macro pouco inspirador para as companhias aéreas brasileiras, com incertezas ainda permeando e preços do petróleo em alta”, diz o banco.