A apertada sala da 7ª Vara da Família, no quinto andar do Fórum João Mendes, em São Paulo, anda pequena demais para tanta curiosidade. Ali, um catatau com mais de 300 páginas, o processo de inventário do espólio do empresário Omar Fontana, morto em dezembro de 2000, virou peça-chave para o destino daquela que já foi uma das maiores companhias de aviação do País ? a Transbrasil, criada por ele em 1955. O mais recente despacho anexado ao cartapácio, por exemplo, provocou uma aterrissagem forçada nos planos de Antônio Celso Cipriani, genro de Fontana, de vender a empresa, que acumula dívidas superiores a R$ 1 bilhão e cujos aviões não saem do chão há mais de dois meses. Numa manobra obscura, Cipriani havia arrumado comprador, o empresário goiano Dilson Prado da Fonseca, e prometera lhe entregar o controle da companhia por simbólico R$ 1. O negócio chegou a ser comunicado à CVM, que fiscaliza os movimentos das companhias abertas, mas foi surpreendentemente desfeito antes mesmo de Fonseca assumir o manche. O que aconteceu? A resposta parece estar em uma decisão do juiz Paulo Nimer Filho, que considerou nulo o compromisso de compra e venda firmado entre Cipriani e Fonseca. ?Os bens do espólio não podem ser cedidos pelo inventariante sem a concordância de todos os herdeiros e sem autorização judicial?, determinou o magistrado na semana passada.

Concordância tem sido artigo cada vez mais raro entre os membros do clã Fontana. O único ponto que une todos os herdeiros de Omar atualmente é a impossibilidade de salvar a Transbrasil e, por conseqüência, a necessidade de evitar, a qualquer custo, que outros bens da família sejam arrestados para tapar o imenso rombo da companhia aérea. Há muita coisa em jogo. Denilda Pereira Fontana, viúva do fundador da Transbrasil, é dona de 5,5% das ações da Sadia ? criada pelo pai de Omar Fontana ?, lote estimado em US$ 120 milhões. Já Cipriano acumula fortuna pessoal avaliada em US$ 100 milhões, incluindo um resort para esquiadores nos EUA.

É a defesa desse patrimônio que tem movido os últimos atos de Cipriani, queixam-se familiares e acionistas minoritários da companhia. Para eles, a venda da empresa para Fonseca e as constantes trocas de presidente seriam apenas manobras para desvincular o nome dos Fontana de um negócio virtualmente quebrado. O próprio Cipriani estaria por trás de uma grupo de investidores dispostos a injetar US$ 25 milhões para fazer os aviões da Transbrasil voltar ao ar, já nas mãos de um novo dono. ?Ele prefere entregar os anéis para ficar com os dedos?, afirma um representante dos acionistas minoritários. Por enquanto, porém,
Cipriani conseguiu arrumar apenas mais problemas. Fonseca, ex-aliado, agora ameaça levá-lo aos tribunais. ?Fui vítima de um golpe aplicado pelo Celso Cipriani?, afirmou o empresário a DINHEIRO. Barrado quando deveria tomar posse e substituído por Michel Tuma Ness ? que renunciou uma semana depois ?, Fonseca já se apossou de pelo menos um bem da companhia: a mansão que Omar Fontana transformou em festiva sede do lobby da aviação em Brasília. ?Não vou sair de lá porque a casa agora é minha?, diz Fonseca. Fontana batizou a propriedade de Casa de Concórdia, nome impróprio para os dias atuais na Transbrasil.