O empresário Renato da Cruz Costa, dono do RC Group Inc. nos EUA e do Grupo Financial BR no Brasil, ficou famoso no mercado brasileiro em agosto, quando ofereceu quase R$ 2 bilhões no leilão pelas debêntures de Eike Batista. Costa foi barrado no leilão porque não apresentou as garantias necessárias. Essa projeção do empresário no mercado e as cifras envolvidas motivaram startups a denunciá-lo por um suposto esquema de fraude que tem roteiro de filme hollywoodiano — envolve milhões de dólares, acidente de carro, doença, documentos falsificados e até a família Fittipaldi. Renato Costa nega todas as acusações.

Esse enredo está sendo investigado pela Polícia Civil e pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, em processo por estelionato aberto por empresas que se dizem vítimas de Renato Costa e que apresentaram um dossiê às autoridades. A DINHEIRO conversou com responsáveis por quatro delas: AgroThings, Stone Code, Shimejito e T-Connect. Todos têm a mesma desconfiança: além de falsas promessas de investimentos, o empresário pode estar usando as startups para golpes maiores ao captar, na outra ponta, aportes milionários de fundos internacionais.

Segundo as startups, o modus operandi é o seguinte: ele é apresentado por algum intermediário, na maioria dos casos pela Igloo Networks, uma incubadora, aceleradora e consultora de startups. Promete ser o elo entre elas e investidores estrangeiros. Para dar andamento nos processos de captação, pede dinheiro para a abertura de firma e conta em banco nos Estados Unidos. As companhias enviam todos os documentos e os recursos, mas, segundo elas, os aportes nunca chegam. Ainda de acordo com a acusação das startups, para ganhar tempo e continuar com essas empresas amarradas com ele, Costa envia fotos e vídeos forjados de visitas que faz a galpões e escritórios onde supostamente será a sede das startups.

DOSSIÊ E-mail recebido pela startup AgroThings de uma contabilidade americana em resposta a uma consulta sobre a veracidade de documento enviado por Renato Costa: “Este documento que você apresentou é fraudulento. Esta corporação nunca foi registrada no Estado de Nova York e o documento não foi preparado pela BlumbergExcelsior”.

Ao ser cobrado por algum atraso em prazos estabelecidos, as desculpas ocorrem de maneira inusitada. “Enviou fotos dele machucado, com o rosto cheio de sangue, dizendo que sofreu acidente de carro porque o pneu estourou”, disse Adriel Rodrigues, da Shimejito, uma agritech de Portugal que reporta prejuízo de 500 mil euros entre dinheiro enviado a Costa para trâmites burocráticos e contratação de projetos e profissionais a partir da promessa de receber investimentos. “As mesmas fotos e os mesmos argumentos são enviados para todo mundo. Parece a história do documentário O Golpista do Tinder [em que um homem se passa por magnata do ramo dos diamantes e conquista mulheres na internet com uma identidade falsa]”, afirmou Rodrigues. Em outros relatos, segundo as acusações, o empresário disse que esteve com Covid-19 que o impossibilitou de estar em alguns compromissos.

Denille Molina, da AgroThings, desconfiou que estava sendo enganada e procurou a empresa de contabilidade descrita em documentos enviados por Renato Costa que comprovariam a abertura da startup nos EUA. A resposta, por e-mail (veja fac-símile acima), foi um balde de água fria em Denille: “Este documento que você apresentou é fraudulento. Esta corporação nunca foi registrada no Estado de Nova York e o documento não foi preparado pela BlumbergExcelsior e quem quer que seja que providenciou esse documento parece ter adulterado isso para parecer que foi preparado e registrado por nós”. A empresária afirma ter perdido entre R$ 400 mil e R$ 500 mil. “Nossa intenção é que ninguém mais caia nesses golpes. Nossos recursos dificilmente serão recuperados”, disse ela. Um site foi criado para expor os casos: sites.google.com/view/renatocostagrupofinancialbr.

Vinicius Vilela, da T-Connect, narra a mesma frustração, mas com outros detalhes. Para ser aceito e ganhar credibilidade, Renato Costa usou o nome da família Fittipaldi, que foi patrocinada em 2018 pela Financial BR. “Também falei com diversas outras pessoas, coloquei advogados experientes para dar andamento nos projetos. Renato é um sujeito muito inteligente, sempre está à frente da gente e sabe o que vamos perguntar”, disse Vilela, que afirma ter recebido comprovantes falsos de depósitos do Chase Bank, onde uma conta teria sido aberta em seu nome — mas nunca foi. O prejuízo de US$ 63 mil para abertura de empresa e contas no exterior ficou barato para a T-Connect, que estava para fechar um financiamento de 130 milhões de euros do Google Ventures, após quatro meses de negociação. “Fui apresentado ao Renato Costa, que me ofereceu US$ 60 milhões por 4% do meu negócio. Acreditei nele e abandonei o projeto do Google Ventures”, disse Vilela, que afirma nunca ter visto a cor do dinheiro. “Esse caso coloca no bolso a história do filme Prenda-me se For Capaz [que conta a trajetória de Frank Abagnale Jr., um mestre na arte do disfarce que aproveita suas habilidades para praticar golpes milionários].”

A Igloo Networks afirmou que nem a companhia ou seus sócios possuem qualquer vínculo, procuração ou representação de Renato Costa e suas empresas. Renato Costa, por nota, disse que as acusações são infundadas e desconhece as startups. “Nunca negociamos com elas e nem recebemos qualquer depósito antecipado, no Brasil ou no Exterior.” Afirmou ainda que seu departamento jurídico foi acionado para cuidar do caso.