Uma romaria diferente tem acontecido na principal fábrica da americana Goodyear no Brasil. Toda semana executivos que trabalham em outras unidades de uma das maiores produtoras de pneus do mundo têm visitado a cidade de Americana, no interior de São Paulo. A lista dos viajantes  inclui até mesmo profissionais de companhias que atuam em outros setores, como a Eaton, fabricante de autopeças, a Mabe, de eletrodomésticos, e a Faber-Castell, de material escolar.  Em comum, entre eles, há a curiosidade em conhecer de perto os fatores que fizeram essa unidade ser considerada a de melhor performance entre as 55 fábricas da Goodyear espalhadas pelo planeta. As mudanças, muitas delas aparentemente simples e que foram adotadas a partir de 2009, fizeram com que a produtividade do local crescesse 10% em apenas um ano. 

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Efeito Ásia: para melhorar a performance da filial, Agostini recorreu às técnicas
de gestão baseadas nos ensinamentos orientais, como o Kaizen

Esse resultado é decorrência da redução do tempo de produção de um pneu em um terço, além da queda do desperdício de materiais em 50%. E mais: a unidade também se tornou um local mais seguro para os 2,5 mil trabalhadores que dão expediente no local. No ano passado, aconteceu apenas um acidente ante as quatro ocorrências de 2009. Por sua vez, o índice de absenteísmo caiu 42%. As boas notícias também se refletiram nas finanças da companhia. Mesmo com a pressão da concorrência e o aumento do preço das matérias-primas, as receitas subiram de R$ 2,6 bilhões, em 2009, para R$ 2,8 bilhões, no ano passado. “O mercado ficou muito competitivo”,  afirma Giano Agostini, presidente da Goodyear no Brasil. “Como não existia mais folga, tivemos de partir para a melhoria da eficiência de gestão.” Mas, afinal, quais foram os fatores que determinaram essa guinada? As principais mudanças ocorreram nas estratégias de gestão e nos processos produtivos. 

O trabalho começou com um diagnóstico realizado pela consultoria americana McKinsey, que apontou as ineficiências de processos. A partir daí, técnicos da escola de negócios da Universidade do Estado de Utah, nos Estados Unidos, elaboraram o projeto baseado no método de gestão  Kaizen, de melhoria contínua, adotado por grandes empresas japonesas, como a Toyota. O programa tinha três pilares: envolvimento das pessoas, redução de desperdício e baixos estoques. A novidade ficou por conta da implantação em um ambiente hostil. Tudo isso foi feito com limitações orçamentárias, já que a crise econômica global de 2008 reduziu os aportes financeiros da matriz. Outro fator conjuntural exerceu pressão. Com o aumento, em 2010, de 41% no preço da borracha, a principal matéria-prima do setor, Agostini se viu diante do seguinte dilema: aumentar o preço e perder mercado ou arcar com o prejuízo.  

O executivo escolheu uma terceira via. “Não pudemos repassar esse aumento para o consumidor”, diz Agostini. “Então, para compensar, optamos pelo aumento da eficiência.” De acordo com analistas, a decisão foi acertada: o mercado não aceitaria níveis mais altos de preço. “Um dos maiores problemas é a concorrência vinda da Ásia, que continua crescendo mesmo após o governo ter adotado medidas anti-dumping”, afirma Ana Carolina Boyadjian, analista do setor de veículos da Lafis Consultoria, de São Paulo. Nem a imposição de sobretaxas, de US$ 0,75 sobre cada quilo de pneu oriundo da China, conseguiu frear as importações, já que os chineses conseguiam colocar no País produtos cerca de 30% mais baratos. No período janeiro-março, cresceu em 28% o desembarque de pneus asiáticos. Mas, agora, a Goodyear, a segunda maior fabricante de pneus do Brasil, atrás da italiana Pirelli, está mais preparada para a briga. 

 

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Expansão: unidade de Americana será uma das beneficiadas pelo plano de ampliação, no valor de R$ 200 milhões, previsto para 2011 

 

Ela tem em caixa US$ 200 milhões para ampliar e modernizar a produção no Brasil de pneus convencionais e radiais, usados por automóveis, utilitários, máquinas rodoviárias e até tratores. Depois da forte retomada do setor em 2010, a expectativa é manter o ritmo neste ano.  “Especialmente, a demanda por pneus para caminhões está muito forte”, afirma a analista Ana Carolina. Isso, no entanto, não significa dizer que o horizonte da Goodyear, que opera no Brasil desde 1919, é de tranquilidade. O rápido crescimento do setor automotivo  (leia a reportagem aqui), está fazendo com que muitas fabricantes de pneus se instalem no País. Uma delas é a japonesa Sumitomo Rubber Industries, sexta maior fabricante global, que construirá uma fábrica no Paraná até 2012. Para isso, deve investir US$ 347 milhões.  Por aqui já operam a francesa Michelin, a alemã Continental e a japonesa Bridgestone.

 

 Para enfrentar a concorrência a Goodyear controla cada detalhe da produção. As mudanças incluíram a instalação de luzes junto às máquinas, parecidas com um sinal de trânsito. Trata-se de um conceito que torna bastante visual a situação da linha de produção, facilitando a gestão por parte dos administradores da fábrica. Quando a produção vai bem, em ritmo forte e com baixo índice de falhas,  luzes verdes ficam acesas por toda a linha. Logo que um dos pontos do processo começa a operar com baixo nível de qualidade, uma luz vermelha se acende sobre a máquina que está enfrentando problemas. “Isso nos permite agir rapidamente para evitar a continuidade das falhas”, diz César Silva, diretor de produção da unidade de Americana. 

 

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