Uma fila de empresas já se forma para entrar em 2024 na mesa de negociação com seus credores. O

varejo está no começo dela, com nomes como Casas Bahia, por exemplo. Há também a aviação. No final

do ano passado, a Gol contratou a consultoria Seabury Capital para se posicionar para uma ampla

revisão de sua estrutura de capital, envolvendo renegociações com investidores estrangeiros e

bancos locais. Alguns no mercado apostam que a aérea pode repetir a Latam e entrar com pedido de

recuperação judicial nos Estados Unidos.

Outros nomes são Unigel, que já ingressou em uma mediação com seus credores, garantindo 60 dias de

proteção contra cobranças, após debenturistas pedirem o vencimento antecipado de suas dívidas, e a

General Shopping. Esta última tem um passivo com detentores de títulos de dívida externos (bonds)

de mais de US$ 800 milhões e uma disputa na Justiça desde 2019 com esse grupo. Para a Fitch, a

situação financeira da dona de 16 empreendimentos imobiliários no País é “insustentável”.

“Vai ser um primeiro semestre de desdobramentos de casos em andamento e com potencial de surgimento

de casos emblemáticos em diferentes indústrias”, disse o sócio do escritório Pinheiro Neto,

Giuliano Colombo. Ele afirma, entretanto, que não necessariamente serão reestruturações sob

supervisão da Justiça e que a primeira tentativa das empresas deve ser de negociações privadas,

para evitar o desgaste do processo de recuperação judicial.

A impressão de especialistas no mercado de reestruturação financeira de empresas é de que os

primeiros seis meses de 2024 darão continuidade ao ano passado. O início do ciclo de corte de juros

ainda não terá produzido efeitos no custo do dinheiro para as companhias, enquanto o crescimento

econômico ainda patina. “A taxa de juro em dois dígitos deve ser mantida até boa parte do ano e

isso é agressivo à estrutura de capital para a grande maioria das companhias, que têm alavancagem

(endividamento) alta”, disse o diretor de finanças corporativas e reestruturação do FTI Capital

Advisors, Luciano Lindemann.

CENÁRIO. O sócio da Siegen Reestruturação de Empresas Fabio Astraukas acrescenta que, ainda que o juro tenha começado a cair, isso não foi passado ao custo do crédito, mantendo a pressão na despesa financeira das empresas.

Somem-se a isso as margens apertadas das companhias, porque não conseguem repassar custos aos

produtos e as elevadas despesas com pessoal. “Os fatores de pressão contra as empresas não se

anularam, atingindo principalmente aquelas do varejo e de serviços, setores que ainda seguirão

fragilizados”, diz Astraukas.

Outra questão é que nem todas as companhias têm acesso ao crédito dos bancos, o que eleva o custo

de capital, que pode superar 20%, considerando o prêmio de risco (spread), complementa o sócio do

G5 Capital Daniel Lombardi.

“O empresário está vulnerável ao custo de capital e à inflação, processo que não controla, ao mesmo

tempo que não consegue repassar preços na velocidade do aumento de custo.” Com a queda do juro a

perspectiva é de que a situação se amenize. “Mas não há céu de brigadeiro previsto para este ano”,

diz Lombardi. Para ele o cenário para este ano é ainda muito desafiador e o mais provável é que o

número de pedidos de recuperação judicial se mantenha próximo do de 2023.