Galinhas, remédios, cachorros, móveis, sacos de farinha, brinquedos, roupas, um altar de igreja, frutas, algemas, documentos oficiais da prefeitura… Enfim, o diabo. Eis a parafernália da megaoperação que o grupo Granero, maior conglomerado de transporte de mudanças do País, está realizando no sertão do Ceará. Com um contrato de R$ 700 mil no bolso, ele aceitou o desafio de trocar de lugar toda a comunidade de 3.651 pessoas do município de Jaguaribara, localizado a 300 quilômetros de Fortaleza. O corre-corre começou em meados de julho e tem de acabar até setembro, quando a cidade simplesmente será inundada para dar lugar a um açude. ?Estamos com 11 caminhões e 70 funcionários no local. Eles chegam às casas e aos prédios públicos e recolhem tudo o que estiver pela frente?, explica Roberto Granero, diretor comercial do grupo. O trabalho é o mais pesado já realizado nos 34 anos de existência do conglomerado. Teve origem na licitação pública que o governo do Ceará abriu há mais de um ano e coincide com um momento de profundas transformações da Granero. ?Estamos deixando de ser uma empresa dedicada à pura e simples mudança de mercadorias para nos tornarmos um grupo especializado em diversos nichos desse mercado.? O desafio de Granero é saber lidar com despachos tão complicados como antenas de telefonia da Telemar ou peças para máquinas de extração de ferro da Companhia Vale do Rio Doce, até a mera mudança residencial de um bairro para outro. O empresário parece estar dando conta do recado.

O trabalho no interior do Ceará não é brincadeira. ?Serão cerca de 500 viagens para levar toda a cidade até o novo município de Nova Jaguaribara.? Em duas semanas de atividades, a superoperação teve apenas duas avarias em objetos dos moradores. Um índice muito bom para uma companhia acostumada a fazer 150 mudanças por dia em todo o País. Há dois anos a comunidade de Jaguaribara tem se preparado para o grande alagamento da cidade. Alguns moradores chegaram a se rebelar com a decisão. Depois de algum tumulto, a mudança foi aceita. O governo se encarregou de construir todos os edifícios e casas do novo município, localizado a 55 quilômetros do original. O cemitério foi transferido antecipadamente, com os restos dos mortos. ?Agora só não vamos transportar os prédios e animais de maior porte, como cavalos. Eles irão guiados por seus peões?, afirma Granero. Com a experiência de mais de 25 anos na administração do negócio, o empresário tem encarado com tranqüilidade a empreitada. Afinal, sua companhia foi fundada em 1967 pelo pai, Pedro Granero, então um feirante. Ganhou experiência ao longo do tempo. Hoje é um gigante que fatura R$ 50 milhões anuais e atua em várias frentes: de mudanças residenciais locais ou internacionais até o transporte de cargas sensíveis, como antenas de transmissão da Telemar. A Granero também é responsável pela movimentação dos objetos de arte da exposição ?Brasil 500 Anos no País?. ?Atualmente, o que menos importa no nosso negócio é a frota de 640 caminhões. O importante é o uso das informações de logística para podermos realizar um trabalho rápido e de qualidade.?

Com clientes como a Companhia Vale do Rio Doce, Volkswagen, General Motors e empresas de informática, a Granero percebeu que não poderia se limitar a transportar mercadorias, sem fazer distinção e especialização no serviço. Concorrentes começavam a avançar em um mercado onde dominava com tranqüilidade. ?Decidimos em 2000 desmembrar a empresa, criando subsidiárias que passaram a se dedicar a nichos de negócios.? Nasceram daí as duas grandes apostas de Granero: a GTech, especializada em despachar
máquinas e equipamentos sensíveis, e a GLog, que faz mudanças rotineiras de grande volume ou valor. Há bons motivos para a estratégia. Um contrato mensal com a GTech gira em torno de R$ 250 mil, contra os R$ 1,5 mil cobrados pela Granero por uma mera mudança residencial de um bairro para outro. Já a GLog atende regiões distantes como a Amazônia, garantindo o abastecimento de empresas. É o caso das minas de ferro de Carajás (PA), da
Vale do Rio Doce. ?Levamos uniformes dos trabalhadores até
peças pesadas para as máquinas de extração.?

Em dois anos a GTech e GLog deverão superar os negócios de mudanças residenciais, que hoje ainda respondem por 50% do faturamento do grupo. ?Os contratos de logística e tecnologia somam 30% da receita. Serão muito mais, pois são acordos que tratam de valores altos.? Para garantir seu avanço, o grupo treinou funcionários que lidam com guindastes ou embalam equipamentos hipersensíveis. Uma central de atendimentos tem condições de informar os clientes o percurso exato em que se encontra o produto. O grupo trabalha com mais duas empresas. A GArte cuida do manejo de obras de arte, e a Granfile no armazenamento de arquivos contábeis de indústrias e bancos como Bradesco e Itaú. Em breve, digitalizará dados. Com taxas anuais de crescimento de 15% no faturamento, o grupo encara o desafio de manter um tipo de serviço que seu fundador Pedro Antônio realizava no bairro paulistano do Ipiranga, com caminhões de mudanças locais, ao mesmo tempo que fica de olho nas novidades do século 21. Afinal, tanto para a diretoria da Vale do Rio Doce, como para os moradores de Jaguaribara, no interior do Ceará, o importante é chegar lá.