A ferramenta CrowdTangle, considerada vital para monitorar a desinformação nas redes sociais, será desmantelada pelo grupo americano Meta nos próximos meses, uma medida que os pesquisadores descrevem como um “retrocesso” em um ano com eleições em muitos países.

A empresa proprietária do Facebook e do Instagram anunciou que o CrowdTangle não estará mais disponível a partir de 14 de agosto, menos de três meses antes das eleições nos Estados Unidos.

A gigante tecnológica planeja substituí-lo por uma nova ferramenta que, segundo os pesquisadores, não tem as mesmas funções e não estará amplamente disponível para as organizações jornalísticas.

Durante anos, o CrowdTangle tem sido uma plataforma fundamental para jornalistas e pesquisadores, permitindo-lhes acompanhar a proliferação de teorias da conspiração e discursos de ódio em tempo real nas influentes redes sociais da Meta, incluindo o Facebook e o Instagram.

Remover a ferramenta de monitoramento é um duro golpe em um ano em que dezenas de países realizam eleições – momento ideal para a proliferação de narrativas falsas.

“Em um ano em que quase metade da população mundial é chamada a votar, cortar o acesso ao CrowdTangle limitará de forma severa o monitoramento independente destes danos”, disse à AFP Melanie Smith, diretora de pesquisa do Instituto para o Diálogo Estratégico (ISD, na sigla em inglês).

“Isso representa um revés perigoso para a transparência das plataformas de redes sociais”, acrescentou.

A Meta substituirá o CrowdTangle pela Content Library, uma tecnologia ainda em desenvolvimento.

Algumas vozes na indústria tecnológica, incluindo o ex-CEO do CrowdTangle, Brandon Silverman, dizem que não é um substituto eficaz, especialmente ante eleições em que as mentiras criadas com inteligência artificial provavelmente se multiplicarão.

A Meta terá que desenvolver “uma tecnologia totalmente nova” para proteger a integridade das eleições, disse Silverman à AFP, pedindo “abertura e transparência”.

‘Ameaça direta’

Lançado pela Meta em 2016, o CrowdTangle ajudou os pesquisadores a detectar problemas como interferência estrangeira, assédio online e incitação à violência.

Nas eleições de 2020, a Meta ofereceu a plataforma às autoridades eleitorais dos Estados Unidos para ajudar a combater a desinformação e as tentativas de impedir as pessoas de votar.

Também foram disponibilizados ao público painéis para acompanhar o que os principais candidatos publicavam em suas redes oficiais.

Devido ao risco de perder estas funcionalidades, a fundação Mozilla pediu à Meta, em carta aberta, que mantivesse o CrowdTangle pelo menos até janeiro de 2025.

“Abandonar o CrowdTangle quando a Content Library não tem a maioria de suas funções principais mina o princípio fundamental da transparência”, afirma a carta, assinada por dezenas de pesquisadores e grupos de vigilância da tecnologia.

Entre os recursos que faltam na nova ferramenta está a grande flexibilidade de busca oferecida pelo CrowdTangle, cuja remoção representaria uma “ameaça direta” à integridade das eleições, acrescenta a carta.

A Meta respondeu, por meio de seu porta-voz Andy Stone, que o que a carta alega é “simplesmente errado” e que a Content Library terá “dados mais completos que o CrowdTangle” e estará disponível para acadêmicos e organizações sem fins lucrativos especializados em integridade eleitoral.

‘Muita preocupação’

A nova ferramenta Meta não estará disponível para os veículos de comunicação comerciais.

Nos últimos anos, jornalistas têm utilizado o CrowdTangle para investigar temas como crises de saúde, violações dos direitos humanos e desastres naturais.

Os repórteres também usaram a ferramenta para escrever artigos que não deixaram a Meta em boa situação, sobre sua dificuldade em moderar conteúdo online e a abundância de aplicativos piratas em sua plataforma de jogos.

O CrowdTangle tem sido uma fonte crucial de dados que ajudou a “responsabilizar a Meta pela implementação de suas políticas”, disse à AFP Tim Harper, analista do Centro para Democracia e Tecnologia.

A Content Library estará disponível para as organizações – incluindo a AFP – que fazem parte de um programa da Meta para verificação de conteúdo online por terceiros.

Mas outros pesquisadores e organizações sem fins lucrativos terão que solicitar acesso ou optar por alternativas mais caras.

“Não está totalmente claro se os pesquisadores independentes – já preocupados com a perda das funções do CrowdTangle – terão acesso”, disse Carlos Hernández-Echevarría, coordenador de Políticas Públicas do portal espanhol Maldita.

“Isso causou muita preocupação”, afirmou.