17/12/2019 - 17:32
A lista da revista Nature de dez pessoas que mais foram importantes para a ciência neste ano foi divulgada oficialmente nesta terça e traz, além do físico Ricardo Galvão, ex-diretor do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), também a sueca Greta Thunberg.
A presença de Galvão na lista já tinha vazado na semana passada e foi confirmada pelo físico, que se disse “surpreso” por ter sido incluído na honraria. “Essa lista geralmente é feita com personalidades que possuem publicações com resultados científicos importantes. Eu não tenho uma publicação, mas eles consideraram importante a minha posição de defesa da ciência perante a comunidade internacional em um momento de obscurantismo”, disse.
Greta, a adolescente de 16 anos que se tornou um símbolo na luta contra as mudanças climáticas, usa como base para sua luta e em seus argumentos para cobrar governantes, o melhor do conhecimento científico sobre o assunto.
Ela, que na semana passada já foi considerada “personalidade do ano” pela revista Time, recebeu o destaque da Nature por ter se esforçado, ao longo do ano, em alertar sobre como os fracos esforços das nações para desacelerar o aquecimento global estão ameaçando o planeta e as próximas gerações.
A seleção não é um prêmio nem uma lista das pessoas mais importantes no mundo científico, mas destaca pessoas que, de algum modo, “iluminaram alguns dos eventos científicos mais importantes de 2019”, afirma Rich Monastersky, um dos editores da revista.
“Nossa lista explora alguns dos momentos mais importantes do ano na ciência, destacando as pessoas que tiveram papéis importantes nesses eventos. Essas histórias vão desde a primeira demonstração de um computador quântico superando uma máquina convencional até os esforços para combater as mudanças climáticas, o desmatamento e uma epidemia de ebola na África”, explica.
De acordo com a Nature, Galvão capturou a atenção global quando desafiou o presidente Jair Bolsonaro por minar os dados que mostravam o aumento acentuado das taxas de desmatamento na Amazônia. Galvão foi demitido depois de responder publicamente a acusações sem provas feitas por Bolsonaro no final de julho.
Na ocasião, o presidente falou que os dados eram mentirosos e acusou Galvão de estar “a serviço de alguma ONG” em um café da manhã com a imprensa estrangeira. O cientista contou à revista que quase desmaiou quando percebeu que tinha virado alvo do presidente e precisou tomar um copo de água dado por sua mulher para não passar mal.
Galvão decidiu no dia seguinte se manifestar. Deu sua primeira entrevista ao Estado, quando afirmou a atitude do presidente tinha sido “pusilânime e covarde”.
“(Foram) atos que ele sabia que o levariam a perder o emprego. O que ele não sabia era que se tornaria um tipo de herói, aclamado por seus colegas cientistas, bem como por estranhos na ruas. Uma mulher até o parou no metrô em São Paulo para agradecê-lo por estar enfrentando Bolsonaro e ajudando-a a entender por que preservar a Amazônia é importante”, aponta a publicação.
O cientista contou que chegou a pensar em parar de dar entrevistas e voltar o foco para sua pesquisa sobre fusão. Mas depois de receber mensagens de cientistas agradecendo por ter se posicionado, “ele percebeu que tinha uma responsabilidade de continuar advogando pela ciência e pelos cientistas diante da pressão política”, informa a Nature.
“Eu sou apenas um homem humilde que trabalha com Física, mas eu decidi continuar por esta razão”, afirmou Galvão à publicação.
Biodiversidade, ebola e evolução do ser humano
A revista destacou também a ecóloga argentina Sandra Díaz, que copresidiu a Plataforma Intergovernamental de Política Científica sobre Serviços de Biodiversidade e Ecossistemas (IPBES), cujo relatório, divulgado neste ano, apontou que um milhão de espécies em todo o planeta estão em vias de extinção.
A astrofísica canadense Victoria Kaspi foi lembrada por seu trabalho que permitiu que um telescópio de seu país tivesse a capacidade de coletar os melhores dados até o momento de explosões rápidas de rádio — flashes misteriosos de radiação no céu.
O neurocientista norte-americano Nenad Sestan, que neste ano conseguiu o feito inédito de reativar o cérebro de porcos que haviam morrido algumas horas antes, também foi destacado pela revista por ter desafiado o pensamento sobre a fronteira entre a vida e a morte.
O microbiologista Jean-Jacques Muyembe Tamfum foi destacado na homenagem por liderar os esforços de seu país, a República Democrática do Congo, para combater uma epidemia de ebola que já matou mais de 2.200 pessoas.
Também foi listado o biólogo chinês Hongkui Deng, que pesquisa células-tronco e foi o primeiro cientista a publicar os resultados de um ensaio clínico usando a tecnologia de edição de genes CRISPR para modificar células em um ser humano adulto.
O paleontólogo etíope Yohannes Haile-Selassie foi lembrado por “sacudir a árvore genealógica da humanidade” com a descoberta de um crânio bem preservado de Australopithecus anamensis, com 3,8 milhões de anos de idade – é o parente humano mais antigo e esquivo.
Também mereceu a homenagem o físico americano John Martinis, que ultrapassou um marco há muito tempo perseguido, de que um computador quântico desenvolvido por sua equipe poderia realizar um cálculo mais rapidamente do que o melhor computador convencional.
O último nome, mas não menos importante da lista, é da especialista inglesa em ética clínica Wendy Rogers, que revelou evidências de que alguns transplantes de órgãos na China poderiam ter ocorrido sem o consentimento dos doadores — presidiários no país.