Por Bernardo Caram

BRASÍLIA (Reuters) – Os recentes episódios que levaram turbulência ao setor financeiro internacional alimentaram o debate no Ministério da Fazenda sobre as chances de o Banco Central cortar a taxa básica de juros no Brasil mais cedo do que o esperado até então, com parte da equipe econômica avaliando ser possível uma antecipação do afrouxamento monetário, enquanto outra parcela vê os fatos como preliminares ou ainda sem efeito para a Selic.

Em meio às incertezas geradas pelo colapso dos bancos SVB Financial Group e Signature Bank, dos EUA, agravadas pelos problemas no europeu Credit Suisse, três fontes que acompanham o tema em áreas distintas do ministério apresentaram à Reuters diferentes visões sobre os efeitos do novo cenário externo.

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Uma das autoridades, que pediu anonimato porque as discussões não são públicas, afirmou que a conjugação dos recentes fatores externos é mais um argumento para que o BC antecipe os cortes na taxa Selic.

“É só olhar como os juros futuros estão caindo em função de tudo que está acontecendo”, disse, citando haver chance de uma ampliação do risco de crise global e de inversão da curva de juros, que é vista como prenúncio para períodos de recessão.

Após a divulgação da crise no SVB, no fim da semana passada, houve uma diminuição dos juros futuros locais. A taxa dos contratos de DI (Depósito Interfinanceiro) para janeiro de 2024 estava em 13,16% na última sexta-feira e caiu para 12,96% nesta quarta, em meio à expectativa de que o BC poderá ser levado a reduzir a Selic mais rapidamente do que o esperado.

Uma segunda fonte, porém, disse acreditar que os juros futuros estão caindo pela redução das taxas no exterior, por paridade, não por uma antecipação do mercado financeiro em relação aos movimentos do BC diante desse novo cenário.

Na avaliação dessa fonte, a autoridade monetária deixou claro que se uma crise de crédito atingisse o Brasil, o instrumento de combate seria a liberação de linhas de liquidez para os bancos, não um corte na Selic, que seria fundamentalmente focado no combate à inflação.

“Independentemente disso, acho que o mercado e o Banco Central não estão capturando eventuais efeitos do crescimento menor e de preços de commodities na inflação de 2023 e 2024”, afirmou, destacando que a atuação do BC poderá mudar quando essa percepção começar a ocorrer.

Para esse membro da equipe econômica, avanços relacionados ao arcabouço fiscal e à reforma tributária também podem colaborar com a decisão de cortar juros, “mas isso leva tempo”.

Uma terceira fonte afirmou que membros do governo estão ansiosos para ver a redução nos juros, mas, para ela, dizer que os incidentes com os bancos no exterior é argumento para baixar juros no Brasil “é forçar a barra e é prematuro”.

Segundo ela, o governo norte-americano está com capital e com poder regulatório forte, o que deve permitir um controle da crise no setor sem grande reflexo sobre o Brasil.

“Acho que o que pode fazer reduzir juros é reforma tributária e arcabouço fiscal. A gente pode ter um Copom mais positivo que já sinalize uma disposição para fazer isso”, disse.

Nesta quinta-feira, o Banco Central Europeu(BCE) elevou as taxas de juros em 50 pontos-base, como prometido, ignorando o caos no mercado financeiro gerado pela crise bancária e os pedidos de investidores para reduzir o aperto da política monetária pelo menos até que a confiança se estabilize.

O Federal Reserve, banco central dos EUA, se reúne na próxima semana para deliberar sobre juros e investidores também estão divididos sobre a possível decisão, com parte do mercado apostando em uma pausa no aperto monetário.

PRÓXIMO COPOM

Segundo os relatos na Fazenda, não há expectativa de que um corte de juros ocorra já na próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), na semana que vem, mas a pasta vai observar os sinais no comunicado do BC sobre o que poderá ser feito nos encontros seguintes do colegiado.

Após intenso ciclo de aperto monetário para debelar a inflação, o BC mantém a taxa Selic estacionada desde agosto do ano passado em 13,75% ao ano, maior nível desde o início de 2017.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva tem feito uma série de críticas à atuação do BC, ao elevado nível da taxa básica de juros e ao baixo patamar das metas de inflação.

Em fevereiro, antes desses novos episódios relacionadas ao setor bancário, o presidente do BC, Roberto Campos Neto, afirmou que o país poderia retornar “em breve” ao cenário no qual a autarquia previa ser possível cortar a Selic a partir de meados de 2023 e atingir as metas de inflação. Para ele, isso seria viabilizado quando ficasse mais claro o plano do governo para o arcabouço fiscal e reformas estruturais.

Na avaliação do economista André Perfeito, o BC manterá a Selic em 13,75% na reunião da próxima semana, mas deve sinalizar cortes futuros. Para ele, o caso dos bancos no exterior está entre as razões que podem colaborar para essa decisão.

“Se mesmo com a quebra do SVB e dos problemas com o Credit Suisse o BC não sinalizar que irá cortar os juros em breve não precisa ser um grande estrategista político para saber o que o Planalto e o PT irão colocar toda sua artilharia sobre o BC”, afirmou em relatório.

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