São três horas da tarde de uma quarta-feira e o empresário Antonio Alberto Saraiva está em casa ? na verdade, um luxuoso apartamento no bairro de Interlomas, na Cidade do México. Computador ligado, lá está ele fazendo a revisão final de seu segundo livro da série Os dez mandamentos da lucratividade, uma espécie de manual dos negócios que é distribuído apenas aos funcionários do Habib?s, empresa que Saraiva fundou há 12 anos e transformou na maior rede de fast-food brasileira. A primeira versão do livro ensinava aos empregados os segredos de custos e vendas. Esta segunda revela, agora, os truques do que ele considera a espinha dorsal de qualquer atividade relacionada ao varejo: atendimento. ?Com este acho que a obra fica completa e dou por encerrada minha carreira literária?, brinca o empresário. Talvez não. Dois novos capítulos começam a tomar forma na saga empresarial de Saraiva. Um deles é a internacionalização da marca Habib?s, processo que começou no México e em breve chegará aos EUA. O outro episódio tem a ver com a imagem do grupo. É algo que pode ser chamado de glamourização da marca. Surgiu de uma dica publicitária dos parceiros da agência Touché e virou campanha. ?Os ricos também amam Bib?s Esfiha? vai ao ar nesta semana e mostra cenas inusitadas de consumo, como, por exemplo, um mordomo servindo esfiha ao milionário patrão em uma bandeja de prata e uma madame a bordo de um Rolls Royce comprando caixas do quitute árabe no drive-thru da rede.

Esfiha em números

RECORDE:
Em 2000, foram
vendidos mais de 300 milhões de esfihas nas 165 lojas da rede

EXPANSÃO:
abertura de 35
restaurantes no Brasil neste ano e 150 no
México até 2005

CONSUMO:
3 milhões de beirutes, 12 milhões de quibes e 6 milhões de pastéis por ano

INSUMOS (ao ano):
3 mil t de carne,
2 mil t de tomate,
3 mil t de farinha,
2 mil t de cebola

Lustrar a imagem, é claro, não significa arrastar a elite para os restaurantes da rede, muito menos desprezar os habituais clientes, em sua maioria representantes da classe C. ?O objetivo é ressaltar a qualidade dos produtos e valorizar a marca?, diz Gilberto Negreiros, sócio diretor da Touché. A rede Habib?s, formada por 165 restaurantes em todo o País e dona de um faturamento da ordem de US$ 300 milhões anuais, orgulha-se de sua política de preços e da democrática mistura de classes em seus restaurantes. Mas não tolera a linha de raciocínio que prega que o que é barato é sempre de qualidade duvidosa. Popular, sim. Popularesco, jamais. ?Se conseguimos ter um produto de qualidade com um preço extremamente atrativo é porque somos competentes no nosso modo de operar?, diz Saraiva. ?Não é à toa que 8 milhões de pessoas passam todos os meses por nossos restaurantes.?

 

 

 

 

 

 

 

Esse número tende a crescer rapidamente com as medidas que a equipe de Saraiva vem implementando na rede. Enquanto a Touché se encarrega da imagem e o empresário costura a expansão internacional, seu irmão Belchior, vice-presidente do grupo, trabalha no mercado interno. Vai abrir 35 lojas este ano, pretende criar uma central de entregas em domicílio e está desenvolvendo um setor de congelamento de insumos. A idéia é evitar desperdícios na manipulação das massas de esfiha feitas nos próprios restaurantes e diminuir o tempo de preparo dos pratos. ?Mais agilidade significa menos custo?, explica Belchior. A ordem de Saraiva é clara: a operação brasileira deve estar tinindo enquanto ele trata da expansão internacional. ?Quero o mesmo padrão em qualquer lugar do mundo?, afirma o fundador. Isso inclui a mania de proibir os franqueados de tomarem empréstimo em bancos. ?Eu não tenho nem cheque especial porque não quero banqueiro como sócio. Não tenho dívidas e ofereço um bom serviço que cabe no bolso do consumidor.?

No último dia 18, um domingo de sol na Cidade do México, uma fila imensa chamava a atenção de quem passava pela avenida Insurgentes. Saraiva teve de fechar a loja por duas horas para poder se organizar e atender a clientela. ?Foi um delicioso sufoco?, conta. A aventura externa começou há um ano e meio, quando o empresário rodou o mundo atrás de um lugar para fincar a placa com o ?gênio árabe?. ?O que nos atraiu no México foi a semelhança com São Paulo e a proximidade com os EUA?, conta. Ele começou com uma loja pequena e com um grande problema: os mexicanos nunca tinham ouvido falar da tal da esfiha. Saraiva, então, alugou algumas vans e foi distribuir o produto de graça na cidade. Também colocou um tempero local, usando os mesmos recheios do taco mexicano, e inventou a ?esfija de pollo? (frango). Em seguida foi só cravar o preço, 19 centavos de dólar, e a fila estava formada na porta do Habib?s. Hoje, Saraiva tem duas lojas no México e uma cozinha industrial com capacidade para atender 200 estabelecimentos ? o que já dá uma idéia do que ele pretende fazer por lá. ?Já recebemos propostas de 40 candidatos a franqueados da marca.? Operação mexicana encaminhada, ele parte rumo a Los Angeles e ao seu sonho de vender esfiha para americano.

O empresário segue à risca a bem-sucedida fórmula que adotou no Brasil. E nem poderia ser diferente. Preço é e será sua marca registrada em qualquer lugar. Há algumas explicações para a agressiva política adotada pelo Habib?s. A rede tem poucos fornecedores e produz grande parte de seus insumos. São várias empresas reunidas na holding AlSaraiva. A mais vistosa é o laticínio Promilat, que se transformou no maior produtor nacional de queijos minas frescal. ?Eliminamos atravessadores e podemos garantir volume e preço, mesmo diante de períodos conturbados na safra de leite?, diz Saraiva. Os sorvetes também são feitos em fábrica própria, a Icelips, assim como os pães que saem da panificadora Arabian Bread. No momento, Belchior negocia com um fazendeiro de São Paulo a exclusividade no fornecimento de tomate, financiando a produção do agricultor. A equipe de Saraiva não perde a chance de reduzir custos. O próprio empresário descobriu no México um fornecedor que cobra mais barato o quilo do grão-de-bico, insumo para fazer a pasta Tahini, e deu cartão vermelho para o parceiro brasileiro. Toda essa estratégia resulta na venda anual de 12 milhões de quibes, 6 milhões de pastéis, 3 milhões de beirutes e mais de 300 milhões de esfihas. Com tamanha escala, fica fácil entender o poder de barganha de Saraiva com os fornecedores. Parte desses ganhos o empresário passa para o cardápio. O consumidor agradece.

O cardápio, aliás, foi crescendo ao gosto do freguês. A rede, que começou com esfihas, adicionou ao menu batatas e lanches ao melhor estilo Mc Donald?s. Até o conceito de um dos sanduíches é parecido. O double nasceu com a ingrata tarefa de desafiar o Big Mac. E se engana quem pensa que os diretores do Habib?s tentam esconder a fonte de inspiração. ?O que é bom deve ser seguido?, diz Belchior. O Habib?s também está montando playground e salões de festas nas lojas e oferecendo brinquedinhos junto com as refeições. É a forma de tentar atrair o público infantil. Mas este é outro capítulo a ser escrito por Saraiva.