Reforma Tributária, redução da taxa básica de juros, inflação caminhando para a meta, confiança do consumidor e do empresário aumentando e PIB crescendo mais que as estimativas. Essa seria uma boa descrição para estar na biografia do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, em seu primeiro ano à frente da política econômica brasileira. O problema é que sempre há uma pedra no caminho. Nesse caso, um buraco.

E ele está nas contas públicas. Ao longo de 2023 não foram poucas as investidas do petista para criar formas de obter um ambiente que permita ao governo cumprir a promessa de campanha de zerar a relação entre despesa e arrecadação ainda este ano, mas não tem sido fácil. Com a agenda de investimento público e os aumentos de gastos aprovados pelo Congresso, sobem os valores na coluna de despesas do governo central.

Na virada do ano, o ministro colocou no Congresso mais três medidas para conseguir aumentar a arrecadação e equilibrar o jogo. Com potencial de garantir ao menos R$ 35 bilhões no primeiro ano, Haddad afirma que o a medida “complementa uma agenda mais ampla do governo de combater o gasto tributário”. Em 2023 o déficit deve fechar em torno de R$ 120 bilhões, bem longe do sonhado zero de Haddad.

6%
Foi a renúncia tributária em relação ao PIB

10%
é o piso do imposto sobre a folha de pagamento. o novo valor

Por isso o ministro acelerou o passo, e colocou na mesa das mudanças a limitação das compensações tributárias feitas pelas empresas. Isso significa que uma empresa que receberá, como crédito tributário, apenas uma parte do valor a ser recebido, e terá de usar em um período determinado tal crédito.

Outra medida altera o Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse), criado na pandemia para beneficiar o setor cultural e prorrogado pelo Congresso até 2026. Segundo Haddad, parte dos abatimentos tributários incluídos nesse programa será revogada gradualmente.

Também espinhoso, a reoneração gradual da folha de pagamentos anunciada pelo governo contraria a prorrogação da desoneração promulgada pelo Congresso. Pelo texto, as alíquotas especiais subiriam de 1,5% e 4,5% para 10% e 15% e só seriam aplicadas em cima de até um salário mínimo. Se o salário for maior que isso, a incidência na diferença volta para os 20% tradicionais.

Bater o pé nessa agenda, no entanto, poderá ser bastante custoso politicamente para o ministro. As medidas, apesar de ter efeito imediato por se tratar de uma Medida Provisória, ainda precisarão ser chancelada pelo Congresso Nacional e, por lá, até parte da base de apoio do PT parece ter dúvidas sobre seu custo em ano eleitoral.

Segundo Haddad, todas as medidas faziam parte de um projeto maior, então não é surpresa para os parlamentares. “Nós havíamos já sinalizado que depois da promulgação da Reforma Tributária encaminharíamos medidas complementares.” Ele afirmou que, nos últimos dez anos, a renúncia tributária do governo federal subiu de 2% do PIB para 6% do PIB.

REAÇÃO

Segundo o senador Efraim Filho (União-PB), autor da proposta aprovada pelo Congresso de manutenção da desoneração, a decisão do governo de avançar com o tema no meio do recesso, e por meio de MP, é um problema.

“Certamente enfrentará resistências desde a sua largada. Já encaminhamos ao gabinete do ministro da Fazenda o sentimento de que o ideal é que essas propostas venham por projeto de lei, até mesmo com urgência constitucional. Porque dá prazo e tempo para que o diálogo possa acontecer”, disse Efraim.

O senador afirmou ainda que há um conflito de legislação nessa largada de ano, já que há duas leis (a aprovada no Congresso e a de efeito imediato da MP) tratando do mesmo tema.

Os deputados, em especial os ligados à frente de parlamentares do empreendedorismo, também pretendem reagir às mudanças no Perse. As Casas trataram do assunto em maio. Para o secretário especial da Receita Federal Robinson Barreirinhas, essa redução gradual, mas antecipada para o fim de 2024, se dá diante dos resultados dessas empresas.

“Nós temos dados de faturamento dessas empresas do Perse. Elas já declararam e vão declarar até o final do ano mais de R$ 200 bilhões de faturamento desonerado”, afirmou Barreirinhas. Até agora, o governo já renunciou R$ 16 bilhões apenas com a redução do PIS/Cofins. “Os impactos sobre Imposto de Renda e contribuição social só serão conhecidos em 2024”, disse.

Durante divulgação das medidas, Fernando Haddad pontuou mais de uma vez que nada foi feito do dia para a noite e o pacote de propostas é resultado de um trabalho de revisão da estrutura fiscal brasileira começada no governo de transição.

Também reforçou que, sempre que o Congresso criar leis e medidas que aumentem os gastos do governo, ele vai encontrar formas de repor essa despesa. Se assim fizer, Haddad terá pela frente um trabalho hercúleo, que exigirá tempo e desgaste com a própria base. Mas também pode dar a ele a projeção necessária para sair da sombra do déficit e receber louros por seus outros feitos na economia.