Ocupar as páginas dedicadas aos negócios em jornais, revistas e no noticiário de tevê é uma rotina comum na vida das grandes empresas. O problema é quando as notícias em que estão envolvidas migram para as páginas policiais, principalmente quando isso ocorre por um gesto tresloucado de um dos herdeiros do negócio. Foi o que aconteceu na semana passada com a Tetra Pak, a gigante sueca de embalagens, que faturou € 10 bilhões em 2011. Na terça-feira 10, Hans Kristian Rausing, filho do fundador do grupo, foi preso, acusado de assassinar sua mulher, Eva Rausing – com quem estava casado havia mais de 20 anos e mãe de seus quatro filhos. Há ainda a suspeita de que Rausing teria mantido o corpo da mulher no apartamento do casal, em Londres, durante uma semana até a chegada da polícia. 

 

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Sucessão: o assunto ainda é tabu em várias empresas.

Herança: normalmente é o que detona as brigas.

No divã: a força da figura do patriarca intimida os mais novos.

 

Antes do trágico desfecho, Eva e Hans Kristian protagonizaram uma série de escândalos. Em 2008, Eva, filha de um ex-executivo da PepsiCo, foi presa na embaixada dos Estados Unidos, na capital inglesa, portando heroína e cocaína em sua bolsa. Na ocasião, a polícia encontrou, ainda, pedras de crack em sua casa. O casal foi acusado de porte de drogas, mas não chegou a responder a processo. A dependência de drogas dos dois era bastante conhecida. Inclusive, foi numa clínica de reabilitação, nos Estados Unidos, que eles se conheceram. A crônica policial é recheada de casos igualmente trágicos. Um deles foi protagonizado por John DuPont, herdeiro da empresa química americana que leva seu sobrenome, preso por ter matado a tiros, em 1976, o amigo Dave Schultz, campeão olímpico de luta livre. 

 

Até hoje não se sabe o motivo do crime. DuPont morreu na prisão, em 2010, aos 72 anos. Quem também frequentou as páginas policiais recentemente foi a americana Alice Walton, filha do fundador da varejista Walmart, o legendário Sam Walton. Em outubro de 2011, Alice foi presa por dirigir bêbada e acima do limite de velocidade. Em 1998, ela foi detida pelo mesmo motivo e ainda utilizou a clássica pergunta: “Vocês sabem com quem estão falando?” Sabiam, mas de nada adiantou. De acordo com a psicóloga e professora associada da Fundação Dom Cabral, Betania Tanure, a reputação de uma empresa ou de uma marca será mais ou menos afetada na razão direta do envolvimento do herdeiro em seu dia a dia. 

 

“Na maioria das vezes o resultado de um escândalo se limita a uma mancha moral para a família, sem prejuízo aos negócios. ”Apesar da crescente profissionalização da gestão das empresas, o papel dos herdeiros nem sempre recebe a devida atenção por parte dos controladores. “A sucessão tem de ser pensada desde a formação da empresa, mas muitos donos ainda evitam tocar no assunto”, diz Ronaldo da Matta, da RM Consultoria. “É preciso deixar claro que nem sempre o herdeiro assumirá o comando.” É o caso de Rausing, que nunca participou dos negócios da família e sempre tentou ficar longe dos holofotes após sua prisão por porte de drogas. 

 

Herança perdida Mas não são apenas episódios extremos como o da Tetra Pak e da DuPont que evidenciam os problemas corporativo-familiares. A periguete americana Paris Hilton tinha tudo para ser apenas mais uma patricinha. Em vez disso, se especializou em aprontar barracos. O ápice aconteceu em 2010, quando foi presa por porte de drogas. Antes, em 2006, havia si do detida por dirigir embriagada e no ano seguinte um vídeo com cenas de sexo entre ela e um antigo namorado circulou na internet. Resultado: Paris acabou sendo deserdada pelo avô, Barron Hilton, que doou, para projetos sociais, 95% dos US$ 100 milhões que caberiam à netinha, como herança. Esses exemplos mostram que existem falhas nessas estruturas familiares. 

 

“Em muitos casos que acompanho, há um problema de falta de afeto entre as gerações”, diz Wagner Teixeira, sócio da consultoria Höft Benhoeft & Teixeira – Transição de Gerações. “O que aconselhamos em diversas ocasiões é enviar para acompanhamento psicológico tanto o herdeiro quanto o controlador.” Não é somente por falta de afeto que as rupturas acontecem. O peso do sobrenome e a personalidade forte do patriarca também colaboram para o afastamento entre as gerações. No caso de Rausing, os tabloides afirmavam que ele se ressentia da importância do pai e achava que jamais o igualaria. Esse senso de inadequação fez com que Rausing, ainda na juventude, seguisse para a Índia em busca de autoconhecimento. A aventura foi classificada pelos tabloides britânicos como uma experiência de “hedonismo cool”.

 

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