03/05/2013 - 21:00
Edemir Pinto, principal executivo da BM&FBovespa, exibia um largo sorriso na segunda-feira 29 de abril. O ambiente no pregão da bolsa, no centro velho de São Paulo, lembrava os tempos de euforia de 2007, quando as empresas se atropelavam para lançar suas ações. Naquele dia, duas companhias tocaram o sino comemorativo do início dos negócios com seus papéis. Logo cedo, a empresa de relacionamento Smiles, desmembrada da Gol, captava cerca de R$ 1 bilhão. No fim da manhã, a BB Seguridade, empresa de seguros e previdência do Banco do Brasil, realizou a maior abertura de capital do mundo dos últimos oito meses, levantando R$ 10,2 bilhões.
Recorde mundial: Nelson barbosa, secretário-executivo do ministério da Fazenda (à esq.),
e Aldemir Bendine, do bb (ao centro): maior ipo do mundo em oito meses
Nos quatro primeiros meses do ano, seis empresas realizaram aberturas de capital, conhecidas pelo nome inglês Initial Public Offering (IPO), e venderam R$ 13, 2 bilhões em ações já existentes ou recém-emitidas para pelo menos nove mil investidores. Essa captação superou as de 2011 e de 2012 somadas. Confirmando-se a abertura de capital da Votorantim Cimentos, anunciada no dia 17 de abril e que poderá atrair mais de R$ 10 bilhões, os resultados passarão a estimativa da bolsa, de R$ 20 bilhões em IPOs neste ano. “O mercado está mais animado e traz algumas novidades muito boas”, diz Pinto. No caso do IPO da Smiles, a principal delas foi a atuação do fundo de private equity General Atlantic, que adquiriu R$ 400 milhões, respondendo por 40% do total captado logo na saída.
Investidor âncora: Constantino de Oliveira, presidente do conselho da Smiles (ao centro):
IPO com apoio da General Atlantic
Prática razoavelmente comum no Exterior, a participação direta desses fundos como investidores-âncora é algo inédito por aqui. “A participação da General Atlantic mostra não só o interesse internacional pelo mercado brasileiro, como também indica um avanço na sofisticação”, diz o presidente da bolsa. O desempenho das ações tem sido bom. No primeiro dia, os papéis chegaram a subir mais de 11% e, até a quinta-feira 2, a alta acumulada foi de 7,8%. Além de garantir o avanço das cotações, o investimento reduziu drasticamente o risco de o IPO não sair. “A atuação desses investidores é um ponto fundamental a ser avaliado na hora de analisar um lançamento”, diz Carlos Takahashi, principal executivo da BB DTVM.
“Foi uma participação importante”, reforçou Constantino de Oliveira Júnior, presidente do Conselho de Administração da Smiles, que agradeceu publicamente ao fundo em seu discurso. Devido ao período de silêncio imposto pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM), Oliveira não deu entrevistas. Aldemir Bendine, presidente do Banco do Brasil, também celebrou a abertura de capital da BB Seguridade. “Há muitas oportunidades de crescimento nos diversos segmentos do setor de seguros e previdência”, disse o executivo na cerimônia. Devido ao período de silêncio, ele também driblou as perguntas dos jornalistas. No entanto, quem conhece os meandros do banco estatal sabe que a meta é usar os recursos captados para turbinar as atividades de seguros do grupo.
Atualmente inferior a 10%, a meta do banco é que a fatia dos seguros na última linha do balanço suba para 33% em até quatro anos. “O setor de seguros vem crescendo a taxas de dois dígitos e deverá continuar assim”, diz Patrick de Larragoiti Lucas, presidente do Conselho da Sul América. Será que tanta movimentação justifica um mergulho nas águas agitadas dos IPOs de 2013? Antes de vender a casa e o carro para participar de todas as aberturas de capital, tentando capturar valorizações iniciais como a da Smiles, porém, é de bom alvitre analisar o desempenho das outras empresas que estrearam no pregão neste ano. Uma comparação do desempenho dos papéis com o Índice Bovespa desde o dia do IPO até a segunda-feira 29, realizada pela empresa de análise de dados Economática, mostra que não há motivos generalizados para sorrir.
Desde o IPO, as ações da Le Lis Blanc registram uma alta de 468%
em relação ao Índice Bovepa
Além da Smiles, apenas a Linx, que estreou na bolsa no dia 7 de fevereiro, superou a média do mercado. Suas ações acumulam um ganho de 32,7% em relação ao Índice Bovespa. As demais perderam do Ibovespa. A empresa de etanol Biosev teve o pior resultado, e seus papéis desvalorizaram em 16%. As ações da BB Seguridade vêm apresentando um desempenho menos regular: depois de ficarem abaixo do índice em seus primeiros dias no mercado, elas superaram o indicador na quinta-feira 2. O voo da Smiles tem uma justificativa muito concreta. Os investidores que compraram suas ações estão esperando um desempenho semelhante ao dos papéis da Multiplus, companhia de fidelidade da TAM, que estreou no mercado em fevereiro de 2010, avaliada em R$ 2,8 bilhões e que, no fim de abril, estava cotada a R$ 5,3 bilhões.
Em apenas cinco pregões, o valor de mercado da Smiles cresceu R$ 600 milhões, para R$ 2,7 bilhões. Mesmo uma avaliação em prazo mais longo não é conclusiva. O levantamento da Economática, que considerou 123 empresas que abriram capital desde a estreia da Natura, em maio de 2004, e que permanecem listadas, mostra a completa ausência de padrão. Há sucessos estrondosos, como o da empresa têxtil Le Lis Blanc, cuja estreia no pregão ocorreu em abril de 2008, antes da crise econômica que dizimou lucros mundo afora. Mesmo assim, ela vem desfilando bons resultados e seus papéis acumulam uma alta de 468%, além do Ibovespa no mesmo período.
Olho vivo: ”observar a participação de um investidor âncora
é fundamental na hora de analisar um lançamento” ,
diz Carlos Takahashi, da BB DTVM
Há casos como o da Laep, empresa de participação que adquiriu a companhia de laticínios Parmalat e que abriu seu capital em outubro de 2007. Segundo a Economática, seus acionistas iniciais tiveram uma perda de 99,93% em relação à data da abertura, caso tenham mantido os papéis em carteira. Na Vanguarda Agro, o prejuízo foi de 96,4%. O que fazer? Se há uma norma geral para participar dos próximos IPOs, é esta: é preciso analisar cada empresa individualmente e seu setor de atuação antes de investir. Não é possível simplesmente apostar que a bolsa só pode avançar nos próximos meses. Rodolfo Amstalden, analista da empresa paulista de avaliação de ações Empiricus Research, afirma que o mercado está longe da euforia de 2007.
A norma geral para os ipos é a completa ausência de padrões.
As decisões de investimento têm de ser tomadas
caso a caso, após a análise da empresa
A concentração de lançamentos, avalia Amstalden, decorre de uma melhoria nas condições do mercado, que permitiu a diversas empresas desengavetar projetos de captação que estavam adormecidos desde a crise. “As ofertas estavam represadas, com as empresas aguardando um momento propício”, diz ele. O analista Clodoir Vieira chama a atenção para o dado mais importante, o volume de negócios. “O total negociado na bolsa não subiu significativamente nas últimas semanas”, diz Vieira. “O pregão depende muito dos estrangeiros e, enquanto não houver um ingresso relevante de dólares no mercado, não será possível cravar que o desempenho de todos os IPOs será bom”, diz ele. Ou seja, apesar de toda a euforia do mercado, a recomendação para o investidor é cautela e uma abordagem de longo prazo.