01/04/2020 - 7:03
Os investidores já contavam que o Ibovespa fecharia o trimestre em queda, mas não poderiam imaginar que esse período de 2020 entraria para a história como o pior do principal índice da B3, a Bolsa de Valores brasileira. O indicador encerrou os negócios ontem aos 73.019 pontos, um recuo trimestral de 36,86%, o maior desde o início da medição, em 1968 – somente em março a retração foi de 29,9%.
Parte da explicação para esse desempenho está na crise causada pelo novo coronavírus. Os efeitos na economia se tornaram mais sérios a partir de março, quando a doença começou a se propagar da China para a Europa e os Estados Unidos. “Com a imposição de quarentena e o fechamento do comércio, houve uma queda muito forte na demanda, o que gerou insegurança aos mercados”, diz Henrique Esteter, da Guide Investimentos. “Em um cenário adverso, o investidor tende a focar em ativos com menor volatilidade. Mercados emergentes, como o Brasil, sentem mais o baque pois são considerados mais inseguros.”
Antes mesmo do estouro da pandemia, porém, o cenário já acumulava outros fatores de incerteza que deixavam o investidor apreensivo e menos tolerante ao risco, como as tensões entre EUA e Irã. “Vale lembrar que este é um ano eleitoral nos EUA e não há clareza de quem vai vencer, o que também gera um fator de incerteza”, diz Esteter.
Essa trajetória de aversão ao risco é bem ilustrada pela evolução do preço do ouro no período. O metal, considerado um porto seguro dos investidores em momentos de estresse no mercado financeiro, acumulou valorização de 17,90% em março e de 33,23% no trimestre.
No ambiente doméstico, não bastassem os efeitos nocivos à economia por causa da quarentena, o coronavírus acabou aumentando o risco país. O ano começou no Brasil com a promessa de avanço na agenda das reformas macroeconômicas, mas a pandemia jogou um balde de água fria nessa expectativa. “O Congresso dificilmente vai tratar pautas de ajuste neste momento, que exige que se canalizem esforços no sentido de salvar vidas”, afirma Ricardo França, da Ágora Investimentos. “Isso acabou pesando mais sobre os ativos de risco, desencadeando um movimento de aversão a risco e saída da Bolsa.”
Outra questão que ajudou a piorar o desempenho da B3 no trimestre foi a redução do valor do petróleo, causada pela guerra de preços que Rússia e Arábia Saudita travaram em fevereiro. “O conflito fez o preço dcair 60% e afetou as ações da Petrobrás, que têm um peso substancial na composição do Ibovespa”, diz França.
Outro dado que chamou a atenção foi a expressiva fuga de capital estrangeiro da Bolsa. Enquanto um volume de US$ 20,2 bilhões deixou o País entre fevereiro de 2019 e fevereiro deste ano, apenas em março de 2020 a saída foi de US$ 6,109 bilhões. Esse contexto de aversão ao risco justifica parte desse movimento. Como os meses de novembro e dezembro de 2019 foram de alta nos resultados da Bolsa, muitos investidores estrangeiros aproveitaram para realizar lucros e enviar o dinheiro ao exterior. Isso foi facilitado pelo bom momento que a Bolsa estava vivendo no fim do ano.