O Ibovespa enfim cumpriu a profecia desenhada aos poucos a partir de 1º de agosto e colheu, nesta quinta-feira, 17, a maior sequência de perdas de que se tem registro no índice, em série histórica que retrocede ao início de 1968. Nesta quinta-feira, sem ainda marcar ganho diário desde a abertura do mês, a referência da B3 chegou ao 13º revés seguido, uma sequência sem precedentes. Dessa forma, supera as 12 perdas entre maio e junho de 1970 conforme o AE Dados, série que havia sido igualada na quarta-feira, 16, pelo índice. Antes, o Ibovespa, em ritmo bem gradual de ajuste, vinha se equiparando a outras séries marcantes, de 1998, 1995 e 1984.

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Nesta quinta, fechou em baixa de 0,53%, aos 114.982,30 pontos, agora no menor nível de encerramento desde 6 de junho (114.610,10), entre mínima de 114.859,21 (-0,63%) e máxima de 116.610,49 pontos na sessão, saindo de abertura aos 115.592,14 pontos. Em agosto, o índice acumula perda de 5,71%, limitando o avanço do ano a 4,78% – no fim de julho, estava em 11,13% para 2023, então bem perto dos 122 mil pontos.

Na semana, recua 2,61%. O giro desta quinta-feira ficou em R$ 27,4 bilhões, ainda relativamente alto para o padrão recente, após ter sido muito reforçado na quarta pelo vencimento de opções sobre o Ibovespa.

Entre as ações de maior peso na B3, o setor financeiro foi o vilão – ou protagonista – para que o Ibovespa alcançasse a nova marca, com os grandes bancos mais uma vez em bloco no negativo, à exceção de BB (ON +0,93%).

Na sessão, a recuperação parcial em Vale (ON +1,41%), que ainda acumula perdas de 3,08% na semana e de 8,20% no mês, foi o único contraponto significativo, insuficiente para segurar o pequeno avanço que o índice sustentava no início da tarde. Petrobras, outro peso-pesado da carteira, não conseguiu preservar os ganhos vistos mais cedo e fechou em baixa de 0,75% (ON, na mínima do dia no encerramento) e de 0,32% (PN).

Na ponta do Ibovespa nesta quinta-feira, Cielo (+2,67%), Eletrobras (ON +2,15%), Minerva (+1,53%) e Fleury (+1,48%), com Via (-6,15%), São Martinho (-5,40%), Magazine Luiza (-5,05%) e Cyrela (-4,25%) no canto oposto.

Desde a quarta, a cautela externa foi reforçada pelos sinais que chegaram da ata da reunião de política monetária do Federal Reserve (Fed, o banco central norte-americano), divulgada à tarde.

“A ata deu pistas sobre a possibilidade de a taxa de juros dos Estados Unidos voltar a subir em setembro”, diz Felipe Leão, especialista da Valor Investimentos. “Certos trechos da ata foram considerados importantes, com alguns dirigentes considerando a inflação em nível um pouco alto, ainda inaceitável, e que é preciso mais evidências para acreditar que as pressões sobre os preços estão perdendo força. O que pode exigir novos aumentos de juros”, acrescenta.

Além dos temores relacionados à possibilidade de aumento adicional nos custos de crédito na maior economia do mundo, o mercado segue atento também à China, especialmente pela exposição que o Brasil e a B3 têm a commodities, o que já coloca a saída de investimento estrangeiro da Bolsa a quase R$ 8,5 bilhões no mês, considerando dados disponíveis até o dia 15.

Conforme nota outro observador do mercado local, os resultados no segundo trimestre foram “bons, mas não excelentes”, especialmente entre os bancos, setor que responde por cerca de 30% a 40% da Bolsa – o que pressiona o desempenho do Ibovespa e ajuda a entender o “banho de sangue” que tem sido visto desde o começo do mês, acrescenta a fonte.

No Estados Unidos, o destaque desta quinta ficou por conta dos rendimentos dos títulos de 10 anos do Tesouro norte-americano, que atingiram o maior nível em 15 anos, com reflexos na demanda por ativos de risco em todo o mundo, especialmente nas bolsas de Nova York, que fecharam o dia em baixa (Dow Jones -0,84%, S&P 500 -0,77%, Nasdaq -1,17%), aponta André Luiz Rocha, operador de renda variável da Manchester Investimentos.

“Os ‘yields’ chegam assim aos maiores níveis desde outubro passado, equivalentes aos de 2007, quando houve a grande crise do ‘subprime’, com reflexo direto sobre as Bolsas”, acrescenta Lucas Carvalho, analista da Toro Investimentos, referindo-se à crise global deflagrada então, há 16 anos, no segmento de hipotecas de alto risco nos Estados Unidos.

Com ainda menos catalisadores internos do que os disponíveis na quarta, os investidores continuam a monitorar sinais externos, que têm pautado mais os negócios do que, em geral, o noticiário doméstico nas últimas sessões.

“Os investidores seguem atentos ao noticiário corporativo chinês, que trouxe como destaque o plano de reestruturação da gestora Zonghzi, que deixou de remunerar diversos ativos nos últimos dias. Além disso, também se avalia a notícia de que Pequim deve intensificar a intervenção no câmbio nos próximos dias, buscando aliviar as perdas registradas pelo yuan recentemente”, observa a Guide Investimentos, em nota.

No mês, com a queda de 5,71% acumulada até aqui pelo Ibovespa, e avanço de 5,33% para o dólar frente ao real, o Ibovespa retrocede agora a 23.082,32 pontos, comparados ao final de julho quando, na moeda americana, o Ibovespa chegou ao patamar de 25.783,48 pontos. Em 2023, em dólar, após ter atingido, no final do primeiro trimestre, os 20.100.65 pontos, o Ibovespa foi a 21.355,22 pontos no fechamento de maio e, no fim de junho, chegou aos 24.654,87 pontos, refletindo então não apenas o avanço nominal do índice da B3 naquele mês, de 9%, mas também a apreciação do real frente ao dólar no período.

Um ano atrás, na moeda norte-americana, o Ibovespa havia fechado julho de 2022 a 19.937,90 pontos, e no mês seguinte, um agosto de recuperação (em que havia avançado 6,16% em termos nominais), o índice foi aos 21.056,01 pontos – pouco mais de 2 mil pontos abaixo do nível em que se encontra agora, em dólar.