Ilhas Chuuk, no Oceano Pacífico, têm forte vínculo com os Estados Unidos. Ativistas alertam que governo trumpista e sua política de cortes de gastos podem ameaçar essa dinâmica.As ilhas Chuuk – um local aparentemente idílico no Oceano Pacífico, a nordeste da Indonésia e ao norte da Austrália e Papua Nova Guiné – são uma das quatro unidades que compõem os Estados Federados da Micronésia (EFM), uma nação insular estrategicamente alinhada com os Estados Unidos.

Apesar da pequena população da Micronésia (cerca de 113 mil em 2024), a localização da cadeia de ilhas permite o controle de vastas áreas do Pacífico. E sua aliança com os EUA é profunda: todos os anos Washington fornece milhões de dólares em assistência para ajudar na administração, educação e assistência médica, além de atender a outras necessidades básicas do país.

A dinâmica dessa relação tem despertado preocupação. Sabino Asor, ex-procurador-geral do estado de Chuuk, teme que a Micronésia seja dependente demais de Washington: “Acredito que nossos líderes atuais desenvolveram uma cultura de dependência, mas isso dá aos EUA o poder de nos dizer o que fazer.”

Quem poderia substituir os EUA?

O jurista de 66 anos passou décadas fazendo campanha para que as ilhas Chuuk se separassem da Micronésia e se tornassem um estado independente. Isso, apesar de admitir que a população ainda está muito dividida sobre a questão.

Nas últimas semanas, no entanto, o debate parece ter ficado mais sério. Com o empenho do governo de Donald Trump em cortar gastos, Washington parece não se preocupar mais com suas alianças globais.

Asor acredita que é apenas uma questão de tempo até os EUA voltarem a atenção para as ilhas da Micronésia. Então, o “relacionamento especial” de décadas, baseado no Tratado de Livre Associação, poderá ser descartado sem cerimônia.

“Idealmente, se fôssemos independentes do resto [da Micronésia], poderíamos negociar nosso próprio pacto com os EUA, mas não podemos ter certeza de que os EUA concordariam com isso.” Mesmo assim, a situação de Chuuk não pode continuar como está no momento, insiste.

“Também nos atrairia uma associação com a comunidade global mais ampla, talvez com algumas das nações que foram potências coloniais aqui – Espanha, Alemanha ou Japão –, mas teria que ser um acordo concreto que beneficiaria nosso povo.”

A única alternativa, de acordo com Asor, seria uma relação econômica com a China, que tem ampliado sua influência em outros Estados do Pacífico, como as Ilhas Salomão, Vanuatu, Kiribati e Nauru.

Espanha e Alemanha, antigas potências coloniais

As ilhas Chuuk foram inicialmente colonizadas por melanésios, depois reivindicadas pelos espanhóis. e vendidas ao Império Alemão em 1899. Após a derrota da Alemanha na Primeira Guerra Mundial, elas passaram para o controle do Japão, que as transformou em sua base naval mais importante no Pacífico central.

As ilhas foram o alvo da Operação Hailstorm dos EUA em fevereiro de 1944, na qual foram afundados pelo menos 50 navios de guerra e de carga japoneses. Hoje, esses navios fazem de Chuuk o local de mergulho em naufrágios mais famoso do mundo, gerando uma grande porcentagem da renda de turismo estadual.

Após a guerra, Chuuk se tornou um território fiduciário (área administrada temporariamente por um país ou organização internacional em nome da comunidade internacional) administrado pelos EUA, de acordo com as regras das Nações Unidas, até que os Estados Federados da Micronésia se tornassem independentes, em 1979. O Tratado de Livre Associação original com os EUA entrou em vigor em novembro de 1986 e foi renovado periodicamente desde então, sendo o mais recente de 2023.

Chuuk precisa estar “preparada” para mudanças

O advogado e político Johnny Meippen afirma que há “benefícios claros em permanecer com os EFM, enquanto o acordo estiver em vigor, mas temos que estar preparados. Quando alguém tão errático como Trump está no comando, o pacto pode ser cancelado unilateralmente com pouco ou nenhum aviso.”

Porém se Chuuk se tornasse uma nação soberana, isso permitiria que seu povo recuperasse “a jurisdição territorial sobre nossas águas circundantes e todos os recursos que elas contêm.”

Para Asor, a questão da independência vai além dos interesses estratégicos: “A história das ilhas é de colonização por outras potências por muitos anos, portanto estamos obviamente perdendo nossa própria identidade cultural”, observou. “E, de certa forma, é bom estarmos agrupados com os outros estados insulares dos EFM, é bom ter amigos, mas nem sempre compartilhamos das mesmas prioridades.”

“Temos uma ênfase diferente no que diz respeito ao desenvolvimento econômico e, quando recebemos dinheiro dos EUA no âmbito do pacto, ele sempre vem acompanhado de condições. Grande parte da nossa agricultura já desapareceu, e dependemos da importação de alimentos para nossa população”, acrescenta o ex-procurador-geral. “A independência seria um desafio, mas nos daria liberdade em muitas questões.”

Há muitos anos correm rumores sobre a independência de Chuuk, sobretudo após a criação da Comissão de Status Político de Chuuk, em 2012, para examinar a questão. Tanto Asor quanto Meippen a integraram.

Um referendo sobre a independência foi marcado para março de 2015, mas a votação foi adiada várias vezes, com os defensores da independência dizendo que o governo temia que a votação lhes fosse favorável.

Questionadas sobre o assunto, até a publicação desta reportagem as autoridades do estado de Chuuk não se manifestaram.