26/01/2001 - 8:00
Basta uma olhadela no espelho retrovisor e lá estão eles, ziguezagueando no caótico trânsito da metrópole, com o dedo grudado na buzina, cavando espaço onde não há. Donos de um estilo de pilotagem, no mínimo, audacioso ? o que rendeu a alguns a pejorativa denominação de ?cachorro-louco? ? os motoboys são considerados uma espécie de ?mal necessário? no segmento de transporte de carga rápida. Sem eles, seria inviável a proliferação dos serviços de entrega em domicílio, por exemplo. A Companhia de Engenharia de Tráfego calcula que existam 200 mil profissionais atuando nesse segmento, apenas em São Paulo. Trabalhando por conta própria ou ligados a uma das cerca de três mil empresas da área, eles são a parte mais visível de um negócio que movimenta R$ 100 milhões por ano. A febre dos motoboys também gera dividendos à indústria. A venda de motocicletas vem batendo recordes sucessivos a cada ano. Em 2000, foram comercializadas 574,1 mil unidades ? crescimento de 30% sobre o período anterior ?, garantindo R$ 2,2 bilhões ao caixa dos fabricantes. Desse total, mais da metade são veículos de pequeno porte ? até 125 cilindradas ?, as preferidas pelos entregadores.
Mas se até agora a grande virtude do setor era somente a rapidez de entrega nos centros urbanos, a crescente demanda pelo serviço fez surgir uma outra concepção para a atividade: os motoboys deixam de ser mero portadores de encomendas para se tornar cartão de visitas de várias empresas. Isso mesmo. Imagem, a partir de agora, passa a ser fundamental em determinados nichos de mercado. Tome como primeiro exemplo as empresas pontocom. Você faz uma compra on-line e recebe a mercadoria em casa. Qual o único contato físico em toda esta operação virtual? Ele, o motoboy. De olho nisso ? e também para se livrar da concorrência predatória decorrente da existência de centenas de companhias informais ? alguns empresários de transporte de carga estão investindo em serviços diferenciados. Vale tudo para atender a clientela mais exigente.
A RRJ Express ? que mantém uma frota de 200 motocicletas e tem em carteira clientes como o banco1.net e o IG Flores ? faz parte dessa nova safra de transportadoras onde ?cachorro-louco? e motoboy não têm vez. Ronaldo Dotta, diretor-presidente da companhia, é um dos que investiram pesado na formação de pessoal para se adequar às exigências dos clientes. Para início de conversa, ele diz que os funcionários da área são tratados de courier. Daí as exigências na hora da contratação: ?Para trabalhar aqui é necessário ter o segundo grau completo e gostar de usar gravata?, conta o executivo. No ano passado, a empresa faturou R$ 1,6 milhão e planeja dobrar essa cifra ao longo de 2001, por conta do vertiginoso crescimento do segmento que tem na agilidade seu principal trunfo: ?A moto é imbatível na relação custo-benefício quando se fala em encomendas de até cinco quilos?, explica. A contar pela longevidade do contrato com o banco1.net, assinado em 1995, Dotta está no caminho certo. ?O número de reclamações em relação ao serviço de courier é desprezível?, atesta Jackson Valle, diretor de Tecnologia e Operações da instituição financeira.
Novata no ramo, a Speed Delivery aposta suas fichas nas empresas pontocom. A companhia foi criada em novembro último para atender o site de leilões Arremate. O trabalho da frota de 30 motociclistas é fiscalizado de perto pela direção da contratante. Afinal, o courier é a única porção da companhia, digamos, de ?carne e osso? que o cliente vê. No contrato, está previsto o monitoramento constante da qualidade do serviço e também a realização de cursos de reciclagem. As motocicletas, por exemplo, têm que ter menos de dois anos de uso e passar por revisões a cada seis meses. ?Supervisionamos todas as etapas de treinamento dos couriers e checamos com nossos clientes itens como cortesia, aparência do funcionário e a qualidade do atendimento?, explica Dennis Herszkowicz, diretor de Marketing do Arremate. Marcio Marquini, diretor-comercial da Speed Delivery, não fala de cifras. Diz apenas que os ganhos estão dentro das expectativas: ?Esperamos chegar em 2003 faturando R$ 15 milhões por ano?, diz. Para atingir tal meta ele negocia contratos com outros sites de venda de produtos.
Herdeiros de famílias tradicionais, como Patrick Eberhardt e Daniela Klabin, também estão investindo na atividade. Só que com muita classe, diga-se de passagem. Eles são sócios da Chef Express, empresa criada em 1997 para fazer a entrega em domicílio de restaurantes sofisticados do eixo Rio?São Paulo. A extensa lista de clientes inclui: La Vecchia Cucina, Antiquarius entre outros. Os funcionários são escolhidos a dedo. A postura tem que ser semelhante à dos melhores garçons. Atenção, cortesia e um belo uniforme também são itens obrigatórios. Peripécias no trânsito, nem pensar. A comida tem que chegar rápido e, de preferência, inteira. Para montar o negócio eles investiram R$ 2,5 milhões, de acordo com Michel Eberhardt, diretor de marketing da empresa. O faturamento é mantido em sigilo. De certo, para não aguçar o apetite dos concorrentes.
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