Compra finalizada, o cliente está guardando os produtos nas sacolas, quando escuta do operador do caixa: “deseja contribuir com uma causa social?”. A pergunta pode parecer simples, mas está impulsionando a filantropia no Brasil e transformando consumidores em doadores. É isso que mostra a  2ª edição da pesquisa “Varejo com Causa: como redes varejistas impulsionam as doações”, lançada e divulgada nesta quarta-feira, 28, em evento na B3, a bolsa do Brasil. O evento reuniu lideranças e executivos de ESG e de outras áreas ligadas ao impacto social.

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Iniciativa da MOL Impacto, a pesquisa foi executada  pela MindMiners com  o patrocínio da B3 Social e da PwC Brasil e o apoio da Cause. Ao todo, foram 900 entrevistas com consumidores e profissionais que trabalham no varejo. O levantamento traz 12 descobertas sobre a atuação das marcas varejistas no incentivo à doação com mecanismos como arredondamento de troco, venda de produtos sociais e campanhas de marketing de causa. As descobertas também evidenciam o desejo dos consumidores em doar e sua percepção de valor em relação às marcas que oferecem essa possibilidade.

A CEO da MOL Impacto, Roberta Faria, acredita que o levantamento pode inspirar redes varejistas a adotarem mecanismos de doação e assumirem seu papel na transformação social.

“O varejo tem um poder de influência que é único, seja por sua capilaridade ou por sua proximidade e vínculo com os clientes. Essa pesquisa mostra isso com dados concretos, deixando claro que as pessoas que foram ensinadas a doar no varejo são mais generosas. Ao mesmo tempo, o estudo mostra o valor disso para os negócios, que ganham em reputação e enriquecem a experiência de compra dos seus consumidores”, relata.

A sócia da PwC Brasil e líder para o setor de Consumo e Varejo, Luciana Medeiros, lembra da importância no alinhamento de realidades e valores para o despertar do que chamamos de “ato de doar”.

“É crucial entendermos o novo momento do varejo e o comportamento dos seus mais variados públicos; em um país com dimensões continentais, regionalismos e particularidades, vemos o quanto consumidores se engajam e se comprometem com as marcas que, de alguma forma, refletem a sua realidade e acima de tudo, os seus valores. Podemos estender essa reflexão às causas. Existe uma demanda crescente por responsabilidade socioambiental e a cultura da doação pode ser um importante vetor na concretização dessas ações, tornando-as cada vez mais presente no nosso dia a dia”, afirma

Para a vice-presidente de Pessoas, Marketing, Comunicação, Sustentabilidade e Investimento Social da B3, Ana Buchaim, a pesquisa reforça a importância da atuação do setor privado na área social.

“Assim como temos visto que investidores buscam cada vez mais empresas com boas práticas e boa reputação, agora sabemos que esse comportamento também se reflete nos consumidores do varejo, que valorizam as empresas e estabelecimentos que se mostram socialmente comprometidos”, diz.

Consumidor quer contribuir

A preocupação com as causas sociais e ambientais é uma realidade para a maioria dos entrevistados. Segundo a pesquisa, 69% dos consumidores afirmam se sentir apreensivos com causas como violência, saúde, desigualdade social, manejo de resíduos, fome e educação. Entre os consumidores que estão habituados a doar no varejo – chamados na pesquisa de doadores do varejo –  a preocupação com essas causas é mais evidente: 86% têm esse sentimento.

Além de mais conscientes, os doadores do varejo também são mais generosos. O estudo mostrou que, nos últimos 12 meses, eles doaram em média R$ 197,90, o que representa 44% a mais que os entrevistados que fizeram suas contribuições fora do ponto de venda. Entre as causas que mais receberam doações dos consumidores entrevistados estão: acolhimento e proteção a animais abandonados (57%) e proteção aos direitos e cuidados da infância e adolescência (33%).

A 2º edição da pesquisa também mostrou um consumidor que diversifica mais as formas de contribuir no varejo. Entre os mecanismos de doação que mais cresceram em relação à 1ª edição em 2021 estão a aquisição de produto social no caixa (passou de 45% para 53%) e o arredondamento de troco (passou de 49% para 56%).

Outras formas de doação identificadas pela pesquisa são: doação de nota fiscal (44% dispensam a inclusão do CPF na nota fiscal para que uma organização utilize o retorno de créditos); doação direta (42% optam por doar moedas em cofrinhos colocados nas lojas das redes varejistas); participação em campanhas em que parte do valor ou do lucro das vendas foi destinada a uma causa (51%) e participação em pesquisas que geram doação (27%).

O estudo também mostrou que os consumidores praticam a solidariedade em diferentes setores do varejo. Embora a maioria faça doações, principalmente em supermercados e farmácias, um número maior de consumidores entrevistados na 2ª edição da pesquisa afirmou ter doado em outros segmentos. Alguns exemplos são: lojas de roupa, calçados e artigos esportivos (alta de 14 pontos percentuais); lojas de departamento e produtos para casa (alta de 13 pontos percentuais) e restaurantes (alta de 9 pontos percentuais).

Varejo tem espaço para explorar

A pesquisa também mostra um descompasso entre o desejo do consumidor e a oferta do varejo. Apesar do interesse dos clientes em se relacionar com marcas comprometidas com um propósito maior do que o lucro, menos da metade dos profissionais do varejo afirma que a empresa oferece mecanismos de doação para causas sociais e ambientais (48%).

Entre aqueles que afirmam oferecer, 66% são drogarias e perfumarias; 58% são eletromóveis; 54% são lojas de departamento e 46% são supermercados. Sobre os mecanismos de doação oferecidos, 29% afirmam trabalhar com marketing de causa (quando a marca faz campanhas para doar parte do lucro a uma causa); 27% com doação de bens materiais no ponto de coleta; 26% com produto social; 25% com pedido de doação sem valor específico e 24% com arredondamento de troco, entre outras formas.

A pesquisa também mostrou que oferecer mecanismos de doação no ponto de venda é uma oportunidade de valorização da imagem da empresa e ganho em fidelidade dos clientes. Segundo o estudo, sete em cada dez consumidores têm uma visão positiva da abordagem feita no caixa para a contribuição com uma causa.

Além disso, 80% dos doadores do varejo acreditam que promover a doação melhora a imagem da loja e 85% deles comprariam novamente no estabelecimento se soubessem que o local possibilita a realização de doações. Até entre os consumidores menos engajados (que declararam não realizar doações) o retorno é positivo: 50% dos não doadores afirmam que voltariam a comprar na loja se soubessem que o lugar oferece a possibilidade de doação.

Histórias e pessoas são chave

Um aprendizado de destaque do estudo é que as empresas precisam trazer o incentivo à generosidade para a estratégia corporativa, e comunicar, de forma clara e transparente, o propósito e o impacto de suas ações por meio de histórias reais.  O estudo mostrou que 57% dos doadores no varejo sabem como o dinheiro doado foi utilizado e, desses consumidores, 97% dizem que se sentem estimulados a doar novamente sabendo do impacto gerado pela contribuição.

A pesquisa também mostrou o papel fundamental do operador de caixa para incentivar as doações. De acordo com a pesquisa, 66% dos doadores do varejo ficaram sabendo sobre a possibilidade de compra de um produto social na abordagem do caixa e 15% dos não doadores disseram que o motivo de não terem feito contribuições nos últimos 12 meses foi a falta de abordagem no caixa.

“Diversos relatórios de tendências para o varejo em 2024 mostraram que as marcas terão que investir em estratégias de um ESG autêntico se quiserem se conectar com seus clientes. Isso quer dizer adotar ações de impacto social, como os mecanismos de doação no ponto de venda, mas ir além disso, prestando contas e incluindo consumidores, colaboradores e outros stakeholders ativamente no processo de transformação social”, complementa a CEO da MOL Impacto, Roberta Faria.