10/01/2020 - 10:11
Quando a voluntária Sarah Price encontrou um canguru bebê muito assustado, mas milagrosamente vivo na bolsa da mãe moribunda, em meio aos incêndios que devastam o sudeste da Austrália desde setembro, parecia apropriado chamá-lo de “Luck” (sorte em inglês).
Mãe e filho conseguiram fugir das chamas, mas horas depois, a mãe morreu de estresse agudo e se juntou aos bilhões de animais que pereceram nos incêndios desde setembro.
“Luck” foi instalado em uma bolsa artificial em um quarto escuro e está se recuperando lentamente.
Bebe água com frequência. Sua história é uma das poucas que tiveram um final feliz, em meio ao desastre que choca até os voluntários acostumados aos incêndios de verão na Austrália.
“O número de animais resgatados ou que precisam ser cuidados não é o que tínhamos previsto”, declarou Price, que trabalha para o grupo de resgate da vida selvagem WIRES.
Imagens devastadoras de coalas, gambás e cangurus com partes do corpo queimadas viajaram pelo mundo e se tornaram o símbolo de um país atingido pelos efeitos das mudanças climáticas. Acredita-se que animais menos visíveis, como sapos, insetos, invertebrados e répteis também foram severamente afetados.
Especialistas alertam que os animais que sobrevivem também devem lutar para permanecer vivos.
“Muitos dos animais morrem após o incêndio devido à falta de comida e abrigo ou são comidos por outros animais”, disse à AFP Mathew Crowther, professor da Universidade de Sydney.
No estado de Victoria, onde a temporada de incêndios apenas começou, os veterinários dizem ter visto coalas, pássaros, cangurus e gambás com queimaduras graves e problemas respiratórios.
“Muitos tiveram que ser sacrificados, outros foram salvos e poucos retornaram ao habitat natural remanescente”, informou uma porta-voz dos zoológicos de Victoria.
– Holocausto da vida selvagem –
A Austrália já teve a maior taxa de extinção de mamíferos do mundo e teme-se que os incêndios florestais também causem extinções localizadas.
“As populações de cangurus geralmente tentam se agrupar. Quando retornam, obviamente, a grama não é mais verde, a folhagem não está mais lá, os arbustos desapareceram, as árvores queimaram”, lamenta Price.
Um terço da Ilha Kangaroo, um paraíso para animais na costa do sul da Austrália, foi arrasado e algumas espécies únicas na área podem ter desaparecido.
“Ainda restam poucos habitats para muitas espécies. Isso pode causar extinções locais”, explicou à rede ABC australiana John Woinarski, do Centro de Recuperação de Espécies Ameaçadas, um programa público para proteger a vida selvagem.
Os incêndios estão sendo uma espécie de “holocausto” para animais, acrescentou.
Por exemplo, calcula-se que metade da única população de coalas da Austrália, que vivia na Ilha Kangaroo, esteja morta ou gravemente ferida.
Por outro lado, o rato marsupial da ilha já estava na lista das dez espécies mais ameaçadas e agora está em perigo de extinção.
O professor da Universidade de Sydney, Chris Dickman, acredita que seus cálculos, que afirjam que um bilhão de animais morreram, “são muito conservadores”.
Segundo o professor, o que acontece na Austrália é apenas o prelúdio dos impactos que as mudanças climáticas podem gerar em outras partes do mundo.
O professor Crowther considerou que após o incêndio várias espécies deverão ser protegidas para evitar sua extinção.
Além disso, as florestas queimadas levarão décadas para se recuperar e os especialistas estimam que serão necessários investimentos consideráveis para restaurar habitats e dar a animais como “Luck” uma chance de sobreviver.