28/05/2003 - 7:00
Uma mulher de 55 anos é consumidora fiel de uma pílula que ajuda a rejuvenescer; seu marido já não sofre mais de impotência sexual ? um comprimido deu fim ao problema de disfunção erétil. A filha, de 18 anos, usa um contraceptivo oral que, além de evitar a gravidez, trata da pele e evita o crescimento de pêlos. A família descrita acima é fictícia, mas simboliza muito bem a nova fase da indústria farmacêutica. Não basta criar a cura de doenças graves. A tendência agora é desenvolver produtos que melhorem a qualidade de vida do ser humano. Exemplos dessa nova postura não param de chegar às farmácias. Há um mês, o Yasmin, contraceptivo da Shering que traz uma série de vantagens para a mulher, foi lançado no Brasil. O Levitra, desenvolvido pela Bayer para concorrer com o Viagra, também acaba de chegar ao País. Na Europa, a sensação é o Inneov ? a pílula da beleza ? que promete o rejuvenescimento. Deve desembarcar aqui no ano que vem. Isso sem falar em medicamentos que combatem acne, calvície e obesidade. A corrida da indústria do bem-estar está tão acelerada que chega a movimentar US$ 30 bilhões no mundo. No Brasil, o novo segmento ainda se beneficia da venda indiscriminada de remédios. ?A população mundial está vivendo mais e quer também viver melhor?, diz Theo Van der Loo, presidente da Schering no Brasil.
A promessa de lucro é tão grande que até mesmo empresas sem tradição na área já mostraram suas armas. É o caso
de L?Oreal e Nestlé, que criaram a empresa Inneov, dona do medicamento de mesmo nome e que vem sendo chamada de pílula da beleza. A primeira da série, lançada na Europa, promete rejuvenescer a pele com um simples comprimido. Os valores para o desenvolvimento do produto não foram revelados. O que se sabe é que o Inneov está inserido na categoria de suplemento alimentar, que movimenta 400 milhões de euros na Europa (leia box). Por enquanto, a embalagem com 60 comprimidos está sendo vendida pelo preço equivalente a R$ 90.
?A população está mais preocupada com estética e qualidade de vida. A indústria só acompanha esse novo comportamento?, diz Cláudio Sturion, médico da Roche. A empresa, que fatura US$ 12 bilhões por ano, destina 12% dessa verba ao segmento ?Life Style? (Estilo de Vida), que inclui remédios como o Roacutan, para o tratamento da acne ? que incomoda 25 milhões de pessoas no Brasil. A empresa chegou a criar o site Cucas.com.br para reunir os pacientes. O mesmo foi feito pela Roche com os usuários do Xenical, remédio contra obesidade. ?Os pacientes não querem mais saber de dietas da lua. Querem resultados cientificamente testados?, garante o médico.
Yasmin. Os cientistas da Roche
não são os únicos a seguir o novo caminho. A Schering não tem feito outra coisa senão investir na criação do contraceptivo ideal para a mulher. Já lançou o Mesigyna, método injetável com validade de até três meses, e o Mirena, que é inserido no útero e libera diariamente doses de hormônio. A mais recente novidade atende pelo nome de Yasmin: evita a gravidez, reduz a oleosidade da pele, alivia a tensão pré-menstrual e ainda diminui a quantidade de pêlos no corpo. Exigiu US$ 500 milhões em 12 anos de pesquisas. O preço do conforto é alto: R$ 40, enquanto seus concorrentes convencionais custam, em média, R$ 18. ?É uma opção para as mulheres que querem viver melhor?, diz Van der Loo, o presidente da empresa.
Os homens também tiraram vantagem dessa indústria. No início
do mês, ganharam uma nova droga no combate à disfunção
erétil: o Levitra, da Bayer. Para bater o concorrente Viagra, da
Pfizer, o Levitra oferece, além da caixinha com quatro comprimidos (R$ 100), uma versão com uma pílula (R$ 30). ?Criamos uma versão que todos podem pagar?, diz Cláudio Péricles, médico da Bayer. Viagra e Levitra vão disputar um mercado de R$ 245 milhões no Brasil, com 12 milhões de homens que sofrem de impotência sexual. ?Esses remédios marcam a nova era da indústria: a união dos valores farmacológicos com a qualidade de vida?, diz Valdir Pinto, diretor médico da Pfizer no Brasil.
DOSE POLÊMICA |
A pílula da beleza é a grande sensação nas farmácias européias. Afinal, o comprimido promete fazer o trabalho de dezenas de cremes cosméticos disponíveis no mercado. Mas foi só o Inneov chegar às drogarias para levantar polêmicas entre o meio médico. A questão central é que, até hoje, não se comprovou a verdadeira eficácia das vitaminas sintetizadas em laboratório. ?Em outras palavras, pílulas como essa da beleza são propaganda enganosa?, garante Leopoldo Luiz dos Santos, professor adjunto de Clínica Médica da Universidade de Brasília. Ele inclui, na mesma lista, os complexos vitamínicos ? uma indústria que chega a movimentar US$ 10 bilhões somente nos Estados Unidos. ?Os compostos de vitaminas e minerais são vendidos sem a apresentação de receita médica, o que piora ainda mais o cenário?, afirma Santos. Alheia a críticas de alguns especialistas, a indústria do bem-estar avança, certa de que prevenir, investindo na qualidade de vida, é melhor do que remediar. ![]() |