A declaração de Nabhan Garcia, cotado para o Ministério da Agricultura de um eventual governo Bolsonaro, sobre haver espaço para mais desmatamento na Amazônia está desconectada com o passado e pode trazer atrasos econômicos para o País, segundo o coordenador de Políticas Públicas do Greenpeace, Márcio Astrini.

“É uma declaração infeliz, ultrapassada e antiquada. O mundo que compra do Brasil não quer consumir produtos que destroem florestas. É uma declaração que está desconectada da cabeça do passado e que acha que desmatar é desenvolvimento. Desmatar é atraso de vida, inclusive econômico para o País”, afirma Astrini.

Ele critica também a proposta de Nabhan de unir os ministérios da Agricultura, Desenvolvimento Agrário e o Meio Ambiente: “Está claramente dando um recado: a proteção ao meio ambiente será combatida, e não o crime ambiental. (A junção das pastas) significa a extinção do Ministério do Meio Ambiente”.

Para ele, o que está no plano de governo do candidato do PSL, Jair Bolsonaro, não são propostas, mas ameaças. “Se (as propostas) virarem realidade, o Brasil vai passar de um ator importante (na conservação do meio ambiente) para um vilão”.

Em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, Nabhan justificou a possibilidade de mais desmatamento como algo previsto na própria Lei. “Absurdo falar em desmatamento zero”, afirmou. Para Rodrigo Moraes, advogado especializado em direito ambiental, a afirmação “é simplista e mais política do que técnica”.

O advogado explica que é preciso ver o que a lei diz, não apenas o Artigo 12º do Código Florestal. “Tem uma série de outras regras que, somadas, podem interferir na possibilidade de supressão”, disse.

Segundo o Artigo 12º do Código Florestal, ao qual Nabhan se referiu na entrevista, todo imóvel rural deve manter uma área com cobertura de vegetação nativa. Em áreas de floresta, é preciso manter 80%; Cerrado, 35%; e demais regiões, 20%.

Porém, além da reserva legal, podem haver as chamadas Áreas de Preservação Permanentes (APPs), que são espaços de proteção especial cuja função é preservar, por exemplo, a biodiversidade de determinada região.

“Tem de fazer uma conjugação de regras. Não é simplesmente ‘a lei fala que eu tenho que preservar 80%, então 20% eu posso arrancar fora’. O Brasil é muito grande e a legislação é muito complexa. Para você entender o quanto a lei de autoriza a desmatar não é só com base no Código Florestal”, explica Moraes.

Na entrevista, Nabhan Garcia defendeu também a saída do Brasil do Acordo de Paris, compromisso assinado em 2015 por 195 países e que tem com o objetivo lutar contra o aquecimento global.

Para o coordenador de Políticas Públicas do Greenpeace, a proposta é “irresponsável e burra, típica de quem não conhece o que está falando”. Para ele, o Acordo é uma das maiores conquistas diplomáticas do planeta. “São pouquíssimos os países que estão fora. Você querer sair é se igualar à exceção, não ao mundo.”

Adriana Ramos, coordenadora do Programa de Política e Direito Socioambiental do Instituto Socioambiental (ISA), afirma que a presença do Brasil no acordo é um requisito importante para as relações comerciais com outros países.

“Têm implicações para acordos comerciais do Brasil, principalmente com a União Europeia. A expectativa do mercado consumidor europeu é de ter a segurança de estar comprando mercadorias produzidos dentro de marcos de sustentabilidade e respeito ao meio ambiente, não associáveis ao desmatamento ou outras atividades promotoras das emissões ligadas ao efeito estufa”, explica.

Sobre a afirmação de Garcia de que o Acordo não pode passar por cima da legislação brasileira, Adriana explica que o documento foi constituído de compromissos autodefinidos por cada País. “A contribuição do Brasil para o Acordo de Paris e os seus compromissos dentro dele foram estabelecidos pelo próprio governo brasileiro nos marcos da nossa legislação. Portanto, o Acordo de Paris não se sobrepõe à legislação nacional”, disse, A coordenadora lembra que o Acordo foi ratificado pelo Congresso Nacional e, portanto, também é uma lei nacional.