14/01/2022 - 8:25
Pode até parecer mais um índice econômico como qualquer outro. Não é. Popularmente chamado de inflação oficial, o IPCA acima de dois dígitos no ano passado, em exatos 10,06%, representa muito mais do que isso. Significa que os brasileiros estão mais pobres, que o dinheiro vale menos, que as empresas precisam achatar suas margens de lucro, que a economia está fora de controle, que a miséria e a fome estão em alta, que o governo e o Banco Central perderam as rédeas dos preços. É o pior resultado desde 2015. Entre os países da América Latina, perdemos apenas para Venezuela (686,4%), Suriname (63,3%), Argentina (51,2%) e Haiti (24,6%).
O Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo é um termômetro da tragédia vivida pela macroeconomia. Ele desperta um antigo monstro brasileiro, aquele inimigo número um da economia nos anos 1980, quando o então presidente José Sarney se dedicava mais a cortar zeros da moeda nos reclames do SBT do que em criar mecanismos de controle de preço mais inteligentes do que o congelamento.
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Vários fatores compõem esse problema atual. Com a pandemia, houve choques de demanda e oferta. Cadeias de produção foram desestruturadas pela quebradeira de pequenos fornecedores. Algumas matérias-primas ficaram escassas, enquanto outras sobraram nos estoques. Ora faltou produto quando havia consumidor, ora faltou consumidor quando havia produto. A inflação se tornou um problema global, com raríssimas exceções.
A inflação globalizada, no entanto, não justifica por completo o que vem acontecendo no Brasil. Por aqui, a disparada dos preços tem sido alimentada principalmente pela desvalorização do real frente ao dólar, pelo custo elevado do frete, pelo encarecimento dos combustíveis e pela alta dos insumos e dos alimentos. Essa conjuntura nefasta tem pai e mãe, Paulo e Jair, a dupla que hoje insiste em fingir que esse problema todo não é dela.
O pior é que aqueles que deveriam alertar a turminha populista do Planalto Central dos danos permanentes da inflação sobre a economia parecem mais preocupados em bajular. Na terça-feira (11), para explicar o estouro da meta de inflação no Brasil, o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, colocou panos quentes sobre os tropeços do governo e atribuiu a inflação em 2021 a sucessivos choques de custos. Mais do que isso, o chefão do BC relativizou o estrago alegando que se trata de movimento observado também em outros países, e culpou até a crise de energia.
Campos Neto provavelmente esqueceu de dizer que a alta do dólar reflete o fracasso fiscal de Paulo Guedes na defesa do teto de gastos, no descrédito dos investidores internacionais em um país governado por um boçal negacionista, na perda de quase R$ 1 trilhão no valor de mercado das empresas listadas na B3 no ano passado e na corrosão dos fundamentos econômicos. O presidente do BC perdeu a chance de explicar que a inflação é, sim, um fenômeno global, mas que a incompetência fiscal é fenômeno nacional.