Um indicador surpreendeu os agentes financeiros e econômicos em 2025, a inflação. Foco da política monetária do Banco Central (BC), os índices de inflação estão chegando ao final de 2025 em melhor retrato do que era esperado (ou previsto) em janeiro.

Mesmo que o brasileiro ainda tenha a sensação de que a melhoria ainda não bateu no bolso – muitos serviços, como Uber e 99, e preços de alimentos, como o café, avançaram e lá ficaram –, a inflação arrefeceu e chega ao final do ano em um patamar mais baixo do que o esperado em janeiro.

A tendência para o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) era superior ao teto da meta, de 4,5%. Esperava-se 5%, mas chegou a 4,46% em novembro (acumulada de 12 meses). Deve aí manter-se por ora, avaliam economistas. O centro da meta é 3%.

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Resultado do mais alto patamar de juros em duas décadas, 15%, a inflação deveria chegar a números abaixo do teto da meta só no primeiro trimestre do ano que vem. Ao menos o próprio BC e o mercado assim esperavam. Após o descumprimento do limite superior de tolerância em junho, a autoridade monetária havia projetado que só conseguiria entregar a inflação abaixo do limite do teto máximo ao fim do primeiro trimestre de 2026.

Mas houve uma antecipação significativa do retorno da inflação para dentro do limite, comentam economistas consultados pela IstoÉ Dinheiro.

“A política monetária está gerando os efeitos pretendidos. Os juros estão bastante elevados, há muito tempo, de modo que a atividade econômica e a inflação sentem esses efeitos”, disse Felipe Salto, economista-chefe da Warren Investimentos.

Não foi só isso. Houve uma parcela importante de colaboração da taxa de câmbio para a queda da inflação, fator considerado central. “A perda de valor do dólar, derivada da nova política econômica dos Estados Unidos, nos ajudou”, acredita Salto.

O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, que assumiu o cargo em 20 de janeiro deste ano, tem trabalhado numa direção de enfraquecer o dólar. Já disse em viagens ao exterior que “um dólar forte é bom”, mas enfraquece as vendas do país, já que os produtos americanos ficam mais caros mundo afora. Por fim, em meio a isso, com um real mais forte, os produtos que o Brasil importa acabaram ficando um pouco menos onerosos.

A estratégia do americano vem funcionando. No que diz respeito ao real, até a quarta-feira, 24, quando fechado este texto, o dólar encerra 2025 com queda aproximada de 14% no ano. Já o índice DXY, que mede o valor da moeda americana em comparação a uma cesta de seis moedas (euro, iene, libra, dólar canadense, coroa sueca e franco suíço) recuava até a mesma data pouco mais de 8% em doze meses, indica a Investing.

“O governo Trump tem utilizado a estratégia para tentar melhorar a questão industrial americana, buscando trazer empregos industriais de volta, o que exige um dólar mais enfraquecido”, explicou o economista-chefe do banco Inter, André Valério.

Salto e André seguem uma linha similar à da maior parte dos agentes do mercado financeiro que não enxergam a inflação como um problema para o Brasil em 2026 – mesmo com a queda de juros esperada para o começo do ano. Quanto ao Produto Interno Bruto (PIB), apesar da política contracionista do BC para segurar a economia, por fim também surpreendeu, e deverá atingir 2,25% no ano. Esperava-se alta de 2,02% em janeiro.

O crescimento é considerado “robusto”, e ocorre porque houve uma certa perda de força do reflexo dos efeitos da política monetária no terceiro trimestre, disse Valério. Um dos fatores para isso, já bastante comentado por economistas, pode ser o impulso gerado pelo governo federal à obtenção de crédito ou redução de burocracia, seja para micro e pequenas empresas ou pessoas físicas, com o fim de estimular setores da economia como o agro, construção civil, comércio e exportações.

Ademais, o mercado de trabalho tampouco “esfriou” rapidamente. Ao não seguir a toada da política monetária do BC, as pessoas têm renda para o consumo, o que torna a economia mais resiliente. O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgou que a taxa de desemprego entre agosto e outubro, a mais recente, ficou em 5,4%, o menor valor da história para o período.

São dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD). O destaque ficou com o setor de serviços, que criou pouco mais de 960 mil vagas. Em indústria, chegou a 304 mil postos de trabalho, indica o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged).

O mercado de trabalho brasileiro apresenta uma dinâmica positiva por conta de um ganho de produtividade econômica e por questões demográficas, avalia Salto, da Warren. A perspectiva do mercado para 2026 é uma leve piora no quadro, que deve chegar a 6% no final do ano.

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Mercado de trabalho aquecido

Muito se debateu ao longo deste ano se o Brasil teria chegado à situação de pleno emprego, ou até se estaria abaixo desse marco. O pleno emprego é um conceito econômico que quer dizer, de forma simplificada, que todas pessoas aptas a trabalhar e que desejam fazê-lo se empregam.

Cada país tem seu cálculo e patamar teórico para chegar a essa conclusão, ou seja, não há um número médio global para essa conclusão. É que o cálculo envolve questões estruturais de cada país, já que sempre vai existir algum nível de desemprego (nunca é zero) gerado por inadequações de habilidades e transição entre empregos.

Além disso, quando o mercado de trabalho está aquecido há o desafio de atingir esse ponto sem gerar inflação excessiva – isso pode acontecer por falta de mão de obra, ou seja, as empresas precisam pagar salários bem mais altos para “roubar” pessoas dos concorrentes, por exemplo.

Bruno Imaizumi, economista da 4intelligence, comenta que mudanças realizadas em anos recentes no mercado de trabalho – digitalização da economia (o trabalho em aplicativos) e a reforma trabalhista, para citar algumas sugerem que o Brasil opera em taxa próxima ao pleno emprego e não abaixo dele como se imaginava.

O nó das contas públicas

Apesar de um retrato econômico de indicadores não tão pavoroso, como muitas vezes se pinta, os desafios para 2026 não são poucos. Um deles está na adequação das contas públicas federais – o governo federal é um forte comprador e, quando age, afeta a inflação. Além disso, se não acerta suas dívidas (e só as eleva), o país, e consequentemente sua economia, perde a credibilidade diante de outros governos, empresas e investidores.

Um relatório divulgado na quinta-feira, 18 de dezembro, pela Instituição Fiscal Independente (IFI), um órgão técnico ligado ao Senado que funciona como um vigia das contas públicas, trouxe o alerta. Nos três primeiros anos de vigência do arcabouço fiscal, o governo gastou R$ 170 bilhões por fora das regras fiscais vigentes, dentro das exceções que a própria lei já pressupunha.

“Estamos vivenciando uma fragilização do arcabouço por conta das excepcionalizações. Gasto é gasto, despesa é despesa. Do ponto de vista macroeconômico, o que importa é se está gerando déficit e dívida ou não. É aí que você tem um esvaziamento da credibilidade do arcabouço”, disse em entrevista à IstoÉ Dinheiro o diretor-executivo do IFI, Marcus Pestana.

O cenário de déficit não é visto apenas da atual gestão. Ao longo da última década o Brasil vem registrando consecutivos déficits primários, ora maiores, ora menores. Quando o governo gasta mal ou gasta mais do que arrecada, ele precisa pegar mais dinheiro emprestado no mercado.

Desse modo, o atual governo de Luiz Inácio Lula da Silva desenhou o arcabouço fiscal para tentar conter a sangria, uma estratégia que ajudaria o Executivo a se comprometer junto ao mercado financeiro. A atual gestão propôs e o Congresso Nacional aprovou a Lei Complementar 200, que ficou conhecida como “arcabouço fiscal”.

De forma resumida, a regra determina que o governo só pode gastar 70% daquilo que é arrecadado. Caso não seja cumprida, o percentual de gastos no ano seguinte cai para 50% da receita. Só que nem todo gasto do governo entra nessa contabilidade. Existem exceções como gastos com desastres, despesas das universidades públicas, execução direta de obras e serviços de engenharia, entre outras. O grande problema é que a lista de exceções tem crescido.

Com as manobras para tirar certas despesas do arcabouço, o governo deve fechar 2025 dentro da meta fiscal. Na avaliação de Salto, da Warren (ele já ocupou o posto de ex-Secretário da Fazenda de São Paulo), o governo vai entregar a meta deste ano, mas raspando no piso mínimo de gastar 0,6% acima da inflação.

Essa cláusula foi incluída às despesas primárias como uma salvaguarda, para que o país garantisse aumento real mínimo nos gastos governamentais em caso de baixo crescimento econômico ou até recessão para manter serviços e políticas públicas (a lógica: o governo pode gastar um pouco acima da inflação para que os hospitais e outros serviços essenciais sigam funcionando).

“Projetamos déficit primário de 0,6% do PIB. Isso vai permitir que a meta seja cumprida usando a banda inferior dela, descontando os precatórios que podem ser descontados. No ano que vem a situação é diferente”, disse.

Nos cálculos da Warren, a projeção é de um déficit de 0,7% do PIB em 2026, o que equivale a R$ 92,4 bilhões, quando a meta é de um superávit de R$ 34,3 bilhões, com a banda inferior em zero. Na avaliação da maior parte dos economistas que comentam o tema, a meta fiscal de 2026 precisará ser alterada. Independentemente de quem ganhe a eleição presidencial de outubro do próximo ano, é uma agenda que vai se impor.

De olho nos aplicativos de transporte

Com metade de dezembro transcorrido, as redes sociais mostram uma inundação de reclamações sobre praticamente o mesmo tema: a alta de preços considerada ‘astronômica’ pelos usuários das corridas de aplicativo, como Uber e 99. O contexto mostra uma intensificação de um cenário que, em meses, mostra uma escalada de preços na casa dos dois dígitos percentuais.

A inflação do Uber e do 99 é ampla, afetou diversos estados e chegou a superar o preço do café – um dos vilões recentes da inflação. Em doze meses até novembro, o preço de uma corrida por aplicativo saltou 65% no Brasil, superando os 42% de alta do café, segundo dados do IPCA.

O panorama se agravou tanto após o volume de reclamações, que motivou uma notificação formal do Procon Paulistano, órgão vinculado à Secretaria de Justiça da prefeitura de São Paulo, às empresas de transporte por aplicativo. O órgão pede esclarecimentos sobre a alta repentina dos preços praticados e mais detalhes sobre as tarifas dinâmicas.

As empresas devem prestar esclarecimentos ao órgão em dezembro. Caso constatado abuso nas práticas ou problemas relativos à falta de transparência, sanções administrativas devem ser tomadas – podendo chegar à multas e cassação de licença de funcionamento no cenário mais drástico.

Procuradas pela IstoÉ Dinheiro, as companhias informaram que a alta decorre de maior demanda por parte de passageiros.