09/02/2019 - 16:17
“Tenho certeza que o Luiz, a Camila, a Fernanda teriam orgulho do que teriam visto aqui se não tivessem sido assassinados. Teriam tido muito orgulho do Brasil por ter um parque como esse. Teriam sido muito felizes, porque o parque é muito bonito Mas, enfim…”
Quinze dias após a tragédia de Brumadinho, o Instituto Inhotim reabriu suas portas na manhã deste sábado, 9, com uma mensagem de recomeço, de reconstrução e de esperança, em meio aos esforços de funcionários de tentar superar as perdas de parentes e amigos. Mas ao menos um grupo entre os mais de mil visitantes que foram ao local também buscava homenagear seus mortos no desastre.
A frase que abre esse texto é de Vagner Diniz, padrasto de Luiz e Camila Taliberti Ribeiro da Silva, que estavam juntos na Pousada Nova Estância, soterrada pela lama de rejeitos de minério de ferro da Vale. Era um grupo de seis pessoas: a namorada de Luiz, Fernanda Damian de Almeida, grávida de cinco meses, o pai biológico dos dois irmãos e a madrasta deles. Estavam todos em Brumadinho para visitar o Inhotim, um plano antigo de Luiz.
Luiz e Fernanda moravam na Austrália e estavam de férias no Brasil. “Meu filho é arquiteto, estava indo super bem na Austrália, virou diretor de criação de uma empresa lá, mas não conhecia Inhotim. Ele queria ver aqui, depois iria para Tiradentes”, conta Vagner, que praticamente criou os dois irmãos e os tratava como filhos.
Ele, sua mulher (mãe dos dois) – Helena Taliberti – e os pais de Fernanda, estiveram neste sábado em Inhotim a convite da chef do principal restaurante do museu, Dailde Marinho, que conheceram enquanto ainda tentavam descobrir onde estavam os filhos, logo após o desastre. Eles estão na região já há 14 dias. Os corpos de Luiz e de Camila foram encontrados, mas o de Fernanda ainda não. “Viemos para agradecer todo o suporte que ela nos deu. E viemos ver o que eles queriam ver”, conta, emocionado.
“A gente só espera que essas coisas tenham algum sentido. Para nós, enquanto pais, a gente vai ter de ressignificar a nossa vida, para ter um novo sentido. Outra coisa é esse crime com assinatura, que tem testemunha, tem história, que não é a primeira vez, que tem repetição… isso tem de ter um significado tudo isso. Não pode ser só a morte de centenas de pessoas, não pode parar nisso.”
Homenagem. O museu a céu aberto, localizado a cerca de 18 km do ponto onde a barragem se desfez, não foi afetado pelo acidente, mas havia ficado fechado até este sábado em respeito às vítimas do desastre, muitas delas parentes de seus próprios funcionários. Assim que as atividades se iniciaram, o diretor-executivo do museu, Antonio Grassi, reuniu visitantes, funcionários, imprensa no icônico Tamboril, onde uma árvore centenária, à beira do lago, simboliza um pouco da vegetação que se perdeu com a tragédia. Ele pediu um minuto de silêncio em homenagem às vítimas e depois falou sobre a necessidade de esforços para retomar a vida.
“Reabrir o Inhotim é sinalizar que existe possibilidade de reconstruir as coisas. É uma afirmação nossa de que estamos vivos, de que a vida continua e pode ser melhor arquitetada daqui para frente. O Inhotim que surge também é um novo Inhotim, assim como Brumadinho será uma nova cidade”, disse Grassi.
“Também queremos sinalizar que Brumadinho não é só a imagem de lama que se vê na TV. Queremos ajudar na reconstrução da cidade”, disse. Ele estima que nas duas semanas em que o museu ficou fechado, cerca de 20 mil pessoas podem ter deixado de visitá-lo. Essa costuma ser a média para o período.
Quando a barragem rompeu, na hora do almoço do último dia 25, pelo menos 500 pessoas visitavam o parque e foram retiradas imediatamente por medidas de precaução. Guias e condutores trabalharam no atendimento das pessoas, mesmo sabendo que podiam ter parentes e amigos debaixo dos rejeitos. Cerca de 80% dos 600 funcionários do museu é da região de Brumadinho.
O condutor Halison de Paula Lopes, de 19 anos, calcula que conhecia mais de 80 pessoas que estão nas listas de mortos ou desaparecidos. “Meu padrinho de crisma, que era como se fosse do meu próprio sangue, trabalhava no setor de máquinas. Muitos amigos trabalhavam lá, um deles no restaurante. Na hora só pensei que seis pessoas da família trabalham na empresa, mas não sabia quem estava lá ou não. Depois soube que alguns estavam de férias, outros faziam o horário noturno. Só meu padrinho estava lá”, conta, emocionado.
“A gente foi descobrindo o tamanho da perda aos poucos. A cada dia um nome diferente aparecia, gente que conheço do convívio social, da igreja, de participar da banda São Sebastião”, afirma. “Mas é hora de recomeçar. Brumadinho não vai mais ser a mesma, mas creio que os que se foram querem que a gente lute.”