11/08/2019 - 12:42
Thiago e Adriano fizeram questão de acompanhar cada consulta e exame de suas respectivas mulheres gestantes desde o dia em que descobriram que seriam pais. Intuitivamente, eles sabem a importância da paternidade ativa, que traz benefícios comprovados em estudos para eles, para a mãe e para o bebê. A relação familiar como um todo também se fortalece e o homem tende a se preocupar mais com a própria saúde.
“Eu acho que é fundamental, não só para eu criar um vínculo com a Giovana, mas eu faço questão de estar perto, de participar. Não quero ajudar minha mulher, quero ser pai. Nosso objetivo tem sido esse e vai ser saudável para os três”, diz Thiago Barbieri, de 38 anos. Ele é adestrador comportamentalista, autônomo e planeja ficar um mês em casa com a mulher após o nascimento da filha, previsto para o começo de setembro.
Estudos mostram que o homem que participa de pelo menos uma consulta de pré-natal, do parto ou de uma consulta de cuidados no pós-parto torna-se mais motivado e cooperativo. Com esse apoio, a mulher sente-se mais estimulada também a seguir as orientações médicas e o papel dele passa a ser o de pai, não só provedor da família. Para o recém-nascido, há benefícios no vínculo pai-bebê e no desenvolvimento cognitivo.
A jornalista Ana Carolina, de 34 anos, mulher de Barbieri, avalia positivamente a participação dele no pré-natal. “Isso faz muita diferença e dá mais confiança de que tudo vai dar certo”, diz. Ela conta que ambos trocam informações que pesquisam e todo esse processo melhorou o relacionamento do casal. “Traz muito mais cumplicidade, uma nova perspectiva para o nosso futuro. Tive momentos em que ficava ansiosa e é muito bom saber que você tem um parceiro ao seu lado.” Pensando no futuro, eles já escolheram a pediatra da Giovana e planejam a divisão de cuidados com a menina.
Apesar das evidências positivas, ainda há resistência dos serviços de saúde em aceitar e acolher devidamente o parceiro da mulher grávida. Existe uma premissa de que ele não quer participar do pré-natal, por exemplo, mas pesquisas mostram o contrário. Segundo dados obtidos junto aos parceiros de gestantes atendidas no Sistema Único de Saúde (SUS) em Ribeirão Preto, de 60% a 94% deles gostariam de participar do pré-natal. Os homens demonstraram intenso sentimento de frustração ao verem esse direito negado quando manifestaram desejo.
O desejo deles se estende ao pós-parto. Uma pesquisa realizada pela Philips Avent com 3,5 mil pais de diferentes países, incluindo o Brasil, mostrou que quase 78% deles gostariam de estar mais envolvidos no período da amamentação e 72% estão ativamente cuidando e confortando o bebê. No entanto, 88% das mães acreditam que são necessárias mais informações sobre como os parceiros podem apoiá-las durante esse período para torná-lo mais fácil e agradável.
Há casos em que eles realmente não participam dessa etapa, mas os motivos para o suposto desinteresse incluem receio de não ser bem acolhido pela equipe de saúde, de não entender o que será orientado, medo de participar no momento do parto e não ter abono no trabalho caso precise faltar para acompanhar a mulher.
Estratégias incentivam participação dos pais
Uma das iniciativas para integrar o pai da criança e deixá-lo à vontade nesse processo é o Parto Seguro à Mãe Paulistana, programa realizado por meio da parceria entre a Secretaria Municipal da Saúde de São Paulo e o Centro de Estudos e Pesquisas Dr. João Amorim (Cejam).
Embora o nome e a maioria das ações estejam centrados no atendimento e assistência humanizados à gestante, a supervisora do projeto, Michelle Carreira Marcelino, afirma que há estímulo constante à participação dos companheiros. “Nós estimulamos a presença do pai em todo o processo para fortalecer esse vínculo, mostrar a importância dele no acolhimento dessa criança, desde consultas, exames e no parto”, diz.
O pequeno Pedro, filho de Adriano do Nascimento Rocha, de 36 anos, veio ao mundo no último dia 4 em um dos nove hospitais públicos em que o Parto Seguro funciona. Ele se considera um pai muito presente desde o início da gestação, mas sendo a primeira vez, absorveu tudo o que lhe foi passado. “Todo conhecimento é importante: as informações do pré-natal no posto, nas consultas. Eu queria ter todo esse cuidado e ajudou para chegar na hora do parto e estar mais bem preparado”, afirma.
Rocha também foi um auxílio a mais para os médicos em relação à mulher, Rosiane. Ela teve convulsões no terceiro mês de gestação e tudo o que acontecia com ela, ele reportava aos profissionais. No dia do parto, a equipe médica ia descrevendo tudo o que acontecia para que ele, que é deficiente visual, não perdesse cada momento.
Outra iniciativa propõe estender o pré-natal ao parceiro com a justificativa de que isso aumenta a adesão da gestante e reduz a transmissão vertical (de mãe para o bebê durante o parto) de infecções. O idealizador é Geraldo Duarte, professor titular de ginecologia e obstetrícia da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo.
Há dez anos, ele luta para que a estratégia seja implementada de forma abrangente no Brasil, mas só tem conseguido em alguns locais. “Em Ribeirão Preto está no SUS e na Faculdade de Medicina também. Na cidade de São Paulo, está presente em grande parte das Unidades Básicas de Saúde. Depende da equipe oferecer, explicar o que é”, afirma Duarte.
Além munir o homem com informações sobre a gestação, o pré-natal estendido a ele possibilita o diagnóstico precoce de HIV, hepatites B e C e sífilis, infecções que podem ser transmitidas para a mulher e dela para o bebê. Outros exames incluem aferição da pressão arterial, glicemia para diabete e lipidograma para identificar colesterol elevado.
Nesse ponto, também há benefícios comprovados para o homem. A pesquisa Saúde do Homem, Paternidade e Cuidado, realizada pelo Ministério da Saúde, indicou que 80,7% dos pais ou cuidadores que participaram das consultas de pré-natal com suas parceiras afirmaram que esse envolvimento os motivaram a cuidar melhor da própria saúde.
Duarte também aponta que o pré-natal do parceiro promove mudanças comportamentais que fazem parte de um contexto social maior. “[A participação ativa] reduz a violência doméstica. Também achávamos que o marido bebia mais no pré-natal, mas concluímos que é no puerpério. Se ele não sabe muito bem o processo, e agora tem uma pessoa nova disputando com ele a presença da parceira, ele sai para beber e volta violento”, explica. Assim, em algum ponto, um pai informado implica em melhor convívio familiar e menos casos de violência contra a mulher.
Caminhos para a paternidade ativa
Um dos motivos para os homens não participarem do pré-natal é ter de se ausentar no trabalho e não receber abono de falta. Duarte indica que é preciso mecanismos que revertam isso. “Em São José do Rio Preto e na cidade de São Paulo, há acordo com algumas indústrias que aceitam receber atestado do parceiro”, diz.
Outro ponto importante é disponibilizar horários flexíveis para as consultas das gestantes a fim de que o homem possa acompanhar. “Consultas não precisam ser sempre durante, pode ser no vespertino. Se ele não puder ir de jeito nenhum, que tenha reuniões com grávidas no fim de semana”, sugere o médico.
A base de tudo é informação e estratégias para chegar até o homem. Duarte exemplifica com uma ação que existe em Belém, no Pará, em que os agentes de saúde aproveitam a turma do futebol no sábado para levar informação em reuniões no local do jogo. “A filosofia do projeto é que o homem tenha as mesmas informações que a mulher. Quando ele chegar à sala de parto, vai saber por que o parto normal é a melhor indicação ou quando precisa de cesárea. Ele tem a chance de chegar pacífico e orientado, detendo conhecimento”, diz o médico.