DINHEIRO ? Quando o sr. começou a estudar, há nove anos, os setores com ambientes de negócios instáveis, isso era uma exceção na Europa e nos Estados Unidos. No Brasil, era a regra. O mundo ficou mais parecido com o Brasil de duas décadas atrás?

HANSEN ? Atualmente, quase todos os setores experimentam situações caóticas e de grandes mudanças. Os Estados Unidos de hoje se parecem muito mais com o Brasil, e precisam lidar com caos e turbulência. A diferença entre os dois países está se estreitando. O mundo de hoje é completamente diferente. 

 

DINHEIRO ? A era da estabilidade ficou para trás?

HANSEN ? Não posso dizer que nunca mais seremos estáveis. Mas o novo normal é o caos. Desse modo, os líderes precisam aprender como administrar bem. 

 

DINHEIRO ? Os executivos brasileiros estão bem preparados para esse novo mundo?

HANSEN ? Os brasileiros têm um excelente desempenho. Eles foram bastante bem em um estudo que publiquei em janeiro na Harvard Business Review, para identificar os melhores CEOs do mundo. Estudamos, durante mais de dois anos, os dados financeiros de três mil empresas dos EUA, da Europa, América Latina e Ásia, para identificar as que se deram melhor. Se olharmos para os dados dos CEOs brasileiros, percebe-se que eles aparecem entre os 100 melhores mais vezes do que era esperado, pelo número de empresas que foram avaliadas. Roger Agnelli, da Vale, e Maurício Botelho, da Embraer, são bons exemplos. O desempenho do Brasil nesse ranking é interessante porque isso não aconteceu com todos os emergentes. A China não foi tão bem. Ou seja, os CEOs brasileiros tiveram bom desempenho não só por causa do crescimento econômico local.

 

DINHEIRO ? Os CEOs brasileiros serão mais reconhecidos nesse cenário?

HANSEN ? Eles têm experiência em lidar com o caos, porque por muitos anos atuaram muito bem em mercados instáveis. Então, quando ascendem ao palco mundial, os CEOs brasileiros possuem uma vantagem competitiva. Conhecem melhor esse jogo que os gestores da Europa. 

 

DINHEIRO ? Mas, por outro lado, além da fama de flexíveis, criativos e bons durante períodos de crise, os brasileiros também são considerados mais fracos em planejamento. Isso pode prejudicar?

HANSEN ? Sim. Ao contrário do que as pessoas podem pensar, não significa que num ambiente caótico você não deva planejar, ou criar estratégias de defesa. Os bons executivos precisam construir um segundo plano. Pois, se algo der errado, ele pode mudar a estratégia, rapidamente.

 

DINHEIRO ? Para ter sucesso no mundo atual, a inovação é fundamental?

HANSEN ? Eu e Jim Collins esperávamos chegar a essa conclusão quando começamos a pesquisa. Inovação não é uma panaceia. Ser a primeira empresa a fazer algo não é garantia de sucesso. A Cisco não foi a primeira a vender equipamentos de telecomunicações. A Apple não criou o primeiro tablet. Não estou dizendo que não é importante inovar. Mas o mais relevante é como você inova, não quanto. O importante é ter a ideia das coisas que funcionam. 

 

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Maurício Botelho, ex-presidente da Embraer, um dos melhores CEOs do mundo,

em pesquisa da Harvard Business Review

 

DINHEIRO ? Quem tem sucesso é a empresa capaz de seguir rapidamente uma tendência?

HANSEN ? Não necessariamente o rápido. Mas sim o seguidor esperto, a empresa que usa bem a experimentação. O Google, por exemplo, fez nove mil experimentos no ano passado. É uma empresa que opera por meio de tentativas. Alguns experimentos são de gestão, outros de produtos. Eles testam até como deve ser a cafeteria para os empregados.

 

DINHEIRO ? Qual é o perfil dos líderes das empresas bem-sucedidas?

HANSEN ? As pessoas pensam que, antes de tudo, eles são os gestores mais carismáticos, e que podem prever o futuro. Mas não é isso. Eles não fazem muitos amigos, e mantêm sempre um caixa-forte no banco. Eles também não são bons em adivinhar o futuro. Bill Gates errou diversas previsões. A questão essencial é que eles têm uma paranoia produtiva. Preocupam-se sempre sobre o que podem estar fazendo de errado. Olham para o setor em que a sua empresa atua e procuram coisas que podem afetar os seus negócios. A paranoia, em si, não é muito produtiva. Mas eles canalizam essa obsessão em diversas ações para mitigar esses riscos. Eles fazem estratégias de proteção. Bill Gates é muito cauteloso quanto a coisas novas. Ele faz hedge, apostando em várias tecnologias ao mesmo tempo.

 

DINHEIRO ? Passar por grandes fusões e aquisições é essencial?

HANSEN ? As melhores empresas fizeram poucas compras, e as que fizeram foram mais calibradas. Dar um tiro de canhão é muito arriscado. As melhores empresas preferem aquisições menores ou de empresas que possuem tecnologias que as interessam. É preciso ser muito bom para acertar nas aquisições e fusões. As empresas medianas sofrem muito nesses períodos. Geralmente é uma estratégia muito arriscada. Muitas grandes aquisições destroem o valor de ambas as companhias. Mas muitas empresas precisaram passar por isso. Nesses casos, é preciso ter uma boa razão para fazer uma aquisição. No fim dos anos 1990, houve um período de rápida consolidação. Os clientes queriam negociar só com as três maiores companhias de cada setor. A escolha, então, para muitas era a venda ou a compra.

 

DINHEIRO ? Há um grande debate entre os resultados de curto e longo prazo. Como as empresas podem fazer uma gestão para durar?

HANSEN ? Imagine um caminhante. Ele decide percorrer 20 milhas no primeiro dia. No segundo dia, mais 20 milhas. No dia seguinte, está o maior sol e ele pode andar 50 milhas, mas prefere andar 20 milhas. Um exemplo é o da companhia aérea Southwest Airlines, que a cada ano abre voos em quatro novas cidades. Em alguns anos, 100 cidades americanas pediam para ter voos da empresa, mas, mesmo assim, ela abria apenas quatro. As boas empresas fazem gestão de longo prazo, não atrás de um número que precisa atingir no fim do mês. A Southwest poderia abrir voos para 100 cidades em um ano, mas não queria esticar demais o seu sistema e acabar quebrando. As boas empresas possuem uma gestão fanática. A resposta delas é que, se continuarem firmes em seus propósitos de longo prazo, certamente alcançarão as suas metas.

 

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Bill Gates, fundador da Microsoft

 

DINHEIRO ? Mas, dessa forma, elas não se tornam alvo de críticas do mercado de capitais, dos analistas e investidores, que pressionam as empresas a maximizar os ganhos quando têm boas oportunidades?

HANSEN ? Quando os competidores estão indo melhor, essas empresas recebem críticas do mercado de capitais. A Stryker, uma empresa de equipamentos médicos, é um exemplo. Nos anos 1990, os competidores estavam melhores. Mas ela decidiu que não iria crescer mais rapidamente. O presidente da Stryker, na época, decidiu que iria suportar as críticas e aconselhou quem quisesse investir numa empresa mais rápida a procurar em outro lugar.

 

DINHEIRO ? Qual é o seu próximo campo de interesse?

HANSEN ? Estou começando a estudar como avaliar os dados das empresas além das informações financeiras. Hoje, elas possuem metas ambientais e de sustentabilidade. A questão, agora, é saber como essas companhias podem se dar bem e fazer o bem, ao mesmo tempo. Não temos ainda muitas respostas, mas percebemos que os líderes podem gerenciar com foco no longo prazo para os dois objetivos.

 

DINHEIRO ? Existem duas visões diferentes, se é melhor uma empresa ser bastante focada no negócio principal ou se deve buscar atuações em diversas áreas para ganhar sinergia. Percebeu alguma tendência em seus estudos?

HANSEN ? Dentre as empresas que estudamos, percebemos que todas são bastante focadas em ser a melhor no que fazem. Um exemplo que costuma ser dado, de boa empresa sem foco fechado, é o da GE. Mas ela não vem se dando tão bem nos últimos dez anos. Não é realmente um bom exemplo positivo. Em certos países, como a Índia, em que o mercado de capital não é muito desenvolvido, pode ser melhor ser um conglomerado com diversos negócios. A Coreia do Sul é outro exemplo, com a Samsung formando um grupo que faz muitas coisas diferentes. Mas nos EUA se você é um investidor não quer que o CEO da sua empresa saia em busca de diversas atuações. O investidor pode compor, por conta própria, o seu portfólio diversificado. Se quiser investir em transporte de cargas, ele faz isso.