18/10/2021 - 16:45
Segundo um relatório da Divisão de População do Departamento de Assuntos Econômicos e Sociais das Nações Unidas (DESA), a população mundial terá atingido 9,7 bilhões de pessoas em 2050 – 2 bilhões a mais do que o número atual. Já no final do século, a previsão é que chegue a 11 bilhões de habitantes. Um crescimento que dificilmente poderá ser atendido com a produção atual de alimentos.
De fato, estima-se que a produção de alimentos deva crescer 70% nos próximos 30 anos diante dessa expectativa de consumo. Mas, além disso, as políticas voltadas para a transição verde implementadas a nível mundial também levam a uma busca por processos sustentáveis e de baixo impacto ao meio ambiente.
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Embora, anos atrás, comer certos tipos de alimentos fosse impensável na cultura ocidental, no momento o consumo alternativo está se tornado realidade, mesmo que ainda exista muito campo a ser explorado. A superpopulação humana obriga o setor de alimentos a se voltar para a pesquisa de novos produtos que possam suprir esse aumento demográfico que se espera para os próximos trinta anos.
Inovações alimentares com baixo impacto ambiental
Algas, insetos ou mesmo ‘carne in vitro’ são algumas das alternativas que estão sendo desenvolvidas para dar uma resposta a dois dos grandes desafios que a humanidade enfrenta: a saúde e a sustentabilidade.
Nesse contexto, ganham força alimentos à base de insetos como fonte alternativa de proteína, principalmente em países em desenvolvimento; o cultivo de microalgas como a chlorella, por exemplo, rica em nutrientes e de alta concentração proteica; e a criação de carnes artificiais produzidas em laboratório. As inovações focam também no cultivo de produtos em áreas improdutivas, bem como no preparo de alimentos personalizados para indivíduos com necessidades específicas.
Farinha de insetos
A pesquisa sobre a ingestão de insetos assume especial relevância devido aos seus benefícios ambientais e à saúde. De acordo com a FAO – Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação – o consumo de insetos é praticado em diversos países do mundo, principalmente em regiões da Ásia, África e América Latina, complementando a dieta de aproximadamente 2 bilhões de pessoas.
Em termos de benefícios para a saúde, os insetos fornecem proteínas e nutrientes de alta qualidade, se comparados com carnes e peixes. São especialmente importantes como suplemento dietético para crianças desnutridas, pois a maioria das espécies contém altos níveis de ácidos graxos. Eles também são ricos em fibras e micronutrientes como cobre, ferro, magnésio, fósforo, manganês, selênio e zinco.
Além disso, os insetos apresentam um risco reduzido de transmissão de doenças zoológicas (aquelas transmitidas de animais para humanos), como a gripe aviária ou a doença da vaca louca. Do ponto de vista da sustentabilidade, é um tipo de criação que gera baixos níveis de gases de efeito estufa, requer pouca terra e pouca água.
Embora para um inseto inteiro chegar ao prato e ser degustado com naturalidade, a farinha feita a partir deles pode ser incorporada mais facilmente à dieta. Mas este alimento ainda precisa seguir um longo caminho para se adequar ao consumo humano, inclusive cada espécie necessita de legislação específica e de aprovação dos órgãos reguladores para a sua comercialização.
Um grande passo nesse sentido foi dado no início de maio deste ano, quando a Autoridade Europeia para a Segurança dos Alimentos (ESFA) aprovou a comercialização para consumo humano de alimentos à base de insetos, especialmente larvas do besouro Tenebrio molitor, conhecidas como ‘larvas de farinha’. Segundo a UE, este inseto poderá ser comercializado desidratado inteiro, como ingrediente em diversos produtos alimentícios e como pó em produtos proteicos, biscoitos ou massas.
Escalada das microalgas
A superexploração dos recursos terrestres está levando a indústria de alimentos a se concentrar no mar. Assim, as microalgas estão se posicionando como fonte de nutrientes de alto valor e grande disponibilidade. Algas e microalgas contêm lipídios, proteínas e carboidratos em grandes quantidades.
Atualmente, o valor nutricional das microalgas é explorado basicamente como suplemento alimentar. No entanto, elas estão se tornando uma tendência como alternativa alimentar, à medida que os consumidores começaram a apreciar o potencial e a versatilidade deste superalimento.
Da mesma forma, a indústria alimentícia está usando a biotecnologia para atender o interesse do consumidor em encontrar alternativas de proteínas vegetarianas que sejam livres de alérgenos. Isso está permitindo que as microalgas surjam como uma fonte de proteína, com diversos usos culinários.
No ano passado, a multinacional anglo-holandesa de alimentos, Unilever, uniu forças com a startup britânica Algenuity, especializada no desenvolvimento de algas marinhas para consumo humano, em um claro compromisso com a alimentação de produtos à base de proteína vegetal. Segundo a Unilever, “o desenvolvimento de fontes alternativas à proteína animal, como as microalgas, representa um importante passo na direção de um sistema alimentar equilibrado e ecologicamente correto”.
Um estudo de mercado de microalgas feito pela Future Market Insights (FMI) oferece percepções convincentes sobre os principais impulsionadores e as estrições que afetam o crescimento até 2031. A pesquisa mostra também as oportunidades existentes em segmentos-chave – a aplicação de microalgas no setor de alimentos e bebidas deve impulsionar a demanda, com vendas atingindo o patamar de US $ 99,6 bilhões até 2021 e além.
A crescente conscientização do consumidor em relação aos benefícios para a saúde das proteínas derivadas de plantas impulsionará ainda mais as vendas de microalgas até 2031.
Carne “in vitro”
Diante de um consumidor preocupado em ingerir cada vez menos carne, alegando motivos como sustentabilidade, bem-estar animal ou saúde – parece que a nutrição futura passará também por um aumento no consumo de proteínas vegetais.
Neste cenário, surgem hambúrgueres e salsichas de carne vegetal derivada de glúten ou à base de proteína de ervilha, ou ainda o consumo de carne artificial cultivada ‘in vitro’. Este último processo envolve a extração de células de um animal vivo que são cultivadas em laboratório e, finalmente, resultam em uma massa de células musculares que pode ser usada inteira ou moída – assim como qualquer carne bovina. O resultado inclui desde hambúrgueres e salsichas, até um suculento bife de um animal que nunca saiu do campo.
Alimentação personalizada
Um pouco além das inovações alimentares que deixam claro que o “futuro no prato” terá que se adaptar a novos hábitos, o consumidor vem demonstrando uma preocupação nítida com o que consome.
Grupos de adeptos às correntes que rejeitam ou minimizam o consumo de produtos de origem animal, como vegetarianos e veganos, só crescem. A pandemia da Covid-19 também evidenciou essas mudanças. Uma tendência clara na alimentação do futuro é que ela seja personalizável, principalmente voltada à prevenção de certos tipos de doenças e comorbidades.
Assim, é possível que seja feito um mapeamento do indivíduo, analisando seu metabolismo e genoma, a fim de projetar alimentos destinados a prevenir ou minimizar algumas patologias. Essa área já está bastante desenvolvida, inclusive pesquisadores estão trabalhando em kits para fazer essas análises.
Nesse sentido e apenas para citar um exemplo, a divisão de alimentos da espanhola Indukern – uma das gigantes mundiais de distribuição de especialidades químicas – vem colaborando com centros de tecnologia e hospitais no desenvolvimento de alimentos para pacientes com disfagia (dificuldade de engolir), câncer colorretal, ou para aqueles que têm envolvimento neural devido a acidente vascular cerebral.
Todas essas alternativas alimentares se devem às inovações tecnológicas, como a Inteligência Artificial (AI), e aos esforços da biotecnologia, que pesquisa e trabalha no design destes novos alimentos. Assim, a comida do futuro irá mais longe: os sabores serão aprimorados, as texturas serão modificadas e haverá produtos impressionantes no mercado – tudo isso com um só objetivo: conseguir desenvolver uma alimentação saudável e sustentável.