Parece uma aula normal. Em uma sala fechada, jovens que aparentam ter de 18 a 22 anos, sentados em volta da mesa de reuniões, escutam com atenção o professor. Em vez de lousa, um monitor com indicadores em tempo real, gráficos e projeções do mercado financeiro. Eles anotam tudo. Fazem perguntas. Gravam as respostas com o celular. No final, revisam as anotações e verificam o desempenho de algumas ações na B3 e no exterior, além de taxas de juros mundo afora, ratings das agências de classificação de risco e análises dos maiores bancos globais.

Este cenário descreve uma aula que se tornou normal para o Insper, em São Paulo, uma das mais renomadas instituições de ensino de economia, negócios e finanças do País. Mas a disciplina não é matemática financeira ou teoria econômica. Trata-se do Insper Asset, o primeiro clube de investimento universitário do Brasil gerido por jovens. É aula prática na veia. Na sala estão 22 cotistas de um fundo real, com capital de cerca de R$ 300 mil. São alunos e, ao mesmo tempo, investidores. Tudo autorizado e regulamentado pela B3 e pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM).

André Franch (à esq.), presidente do Insper Asset, e Raphael Cortez (à dir), gestor do fundo da entidade. “Como iremos trabalhar com dinheiro real, não há mais espaço para erro”, diz Caio Alzugaray (no centro) (Crédito:Rogerio Cassimiro)

A corretora Nova Futura Investimentos, parceira do projeto responsável pela execução dos investimentos, abraçou a ideia. João Ferreira, co-CEO da Nova Futura, avalia que essa geração vai contribuir para uma nova configuração do mercado financeiro no futuro. “Esses jovens talentos irão oxigenar o mercado como um todo. Como a Nova Futura atua em todas as áreas do mercado, ao apoiar projetos como esse nos aproximamos de talentos que poderão trabalhar conosco”, afirmou.

Sob a coordenação do economista André Franch, presidente do Insper Asset e um dos idealizadores do projeto, os estudantes-cotistas aprendem a operar o fundo no mundo real.

A estrutura inclui:
núcleos especializados em ações,
Equity Research,
Private Equity,
e Renda Fixa, cujas teses são integralmente aplicadas no manejo do próprio fundo de investimento.

A proposta do Insper Asset é capacitar seus membros para excelentes carreiras no mercado financeiro.

Tudo feito por meio do desenvolvimento de projetos supervisionados por renomadas instituições do setor, organização de eventos com figuras de destaque e uma gama de treinamentos estruturados. “Se o mercado busca jovens talentos, com experiência, é o que vamos formar”, afirmou Franch à DINHEIRO. “O objetivo é capacitar os estudantes a ingressarem nas melhores instituições do Brasil ou dos Estados Unidos, com foco na excelência e no desenvolvimento do senso crítico e proatividade”, disse.

Alunos do Insper têm sido preparados como a nova geração de investidores no País (Crédito:Divulgação )

A preparação dos estudantes cumpre uma cartilha rígida.

• Segundo Franch, as análises seguem a filosofia do “Value Investing”, com objetivo de identificar empresas de qualidade, que possuam vantagens competitivas robustas, demonstrando potencial para sustentá-las no longo prazo e que estejam sendo negociadas abaixo de seu valor intrínseco.

• Hoje a carteira tem sete posições. As mais representativas são SLC Agrícola e Prio, antiga PetroRio. As demais posições são Kepler Weber, Jalles Machado, Taurus, Grupo Mateus e Catalyst Pharmaceutics, uma farmacêutica americana.

• Algumas das gestoras que inspiram o clube são Opportunity, Verde, Alaska e Guepardo. Essas quatro gestoras, junto com alguns analistas de sellside, também colaboram com os estudantes, ajudando nas análises das empresas e na construção das teses de investimento.

Os analistas são agrupados em cinco setores do mercado, cada um sob a supervisão de um head que, além de auxiliar nas análises, acompanha as empresas e realiza atualizações trimestrais das teses de investimento. As apresentações são feitas tanto para os membros da entidade quanto para a diretoria.

• A decisão final cabe ao gestor do fundo, que conta com o suporte da área de risco para alinhar a carteira ao regulamento do fundo e ao perfil de exposição.

• Todas as decisões referentes à alocação de recursos na carteira foram cuidadosamente fundamentadas nas análises conduzidas pelos membros do Insper Asset.

• Cada cotista pode aportar a partir de R$ 5 mil. Não há limite máximo. Somente são permitidas alocações em ativos que tenham sido previamente analisados pela entidade, empregando um modelo financeiro atualizável e um relatório detalhado da tese de investimento.

• Essas análises são posteriormente apresentadas e discutidas em uma reunião dedicada ao fundo, onde, após um debate aprofundado sobre os potenciais riscos e vantagens associadas a cada investimento sugerido, as alocações são submetidas a votação.

ALUNOS-INVESTIDORES

Dentro do time, os alunos-investidores são divididos em setores. O estudante e membro do Insper Asset Caio Alzugaray, por exemplo, é responsável pelo Equity Research da Oncoclínicas. “No caso da Oncoclínicas, que é a empresa na qual estou fazendo o Equity research, há um potencial enorme de crescimento devido à expectativa de aumento de demanda nos tratamentos de tumores, mas há uma limitação que é a compressão dessa empresa no sentido de aumentar sua carteira de clientes”, afirmou Alzugaray. “Os concorrentes da Oncoclínicas, como Dasa e Rede D’Or, por exemplo, oferecem outros serviços de saúde. Então, têm uma base maior para atrair pacientes.”

Sede da corretora Nova Futura Investimentos. “Esses jovens talentos irão oxigenar o mercado”, diz o co-CEO João Ferreira (Crédito:Divulgação )

Esta análise leva em conta, segundo Alzugaray, muitas variáveis antes de aprovar a tese de investimento. Descartar uma companhia, após todo esse estudo, torna o investimento muito mais assertivo. “E pode ser que a volte a ser considerada no futuro. Como iremos trabalhar com dinheiro real, não há mais espaço para erro”, afirmou.

“Mais do que mirar lucro, o meu papel do Insper Asset é formar os trainees e capacitar os melhores de cada semestre para que se tornem membros e ajudá-los a fazer as melhores entregas”, segundo Pedro Benneck, diretor de capacitações da entidade e head do setor de saúde. “As capacitações vão ocorrendo conforme as entregas, sendo que a última é a de valuation. Neste ano, elas ainda estão em fase de finalização”, disse Benneck.

O fato de trabalhar com dinheiro de verdade, na avaliação de Benneck, muda completamente o jogo. “Não se trata mais de uma carteira fictícia. É um incentivo para que todos façam análises melhores. Isso capacita muito mais nossos membros. Se não houvesse o clube, com dinheiro real, a questão do risco seria minimizada.”

Essa visão está em linha com a forma como o gestor do fundo do Insper Asset, Raphael Cortez, enxerga a iniciativa. “A gente criou um grupo específico, focado para tirar esse projeto que já era antigo da entidade e torná-lo realidade. Nossa entidade sempre esteve voltada para fazer análises robustas, encontrando vantagens competitivas dentro das empresas e a partir daí fazer um valuation para entender se ela está abaixo do seu valor intrínseco”, afirmou Cortez.

Assim como aprendem a lucrar, os alunos aprendem a repartir. Todo lucro gerado pelo fundo é convertido para o programa de bolsas de estudo do Insper. Atualmente, 13% das vagas da instituição são dedicadas a bolsistas.

No exterior, universidades como a de Harvard, Yale e Princeton desenvolvem iniciativas semelhantes, mas com recursos levantados principalmente por doações privadas ­— que são generosamente abatidas no imposto de renda.

Depois do Insper Asset, quando você vir uma sala de aula cheia de jovens estudantes, não se engane. Este pode ser um hábil grupo de investidores do mercado financeiro.