09/04/2021 - 10:30
Os Institutos de Confúcio são cavalos de Troia do governo chinês? Quando lançados em 2004, esses centros de promoção da língua e da cultura chinesas foram apresentados como equivalentes do Goethe alemão, ou da Aliança Francesa, mas agora despertam suspeitas no Ocidente.
Esta arma do “soft power” (ou “poder brando”) chinês se espalhou à velocidade da luz: atualmente existem mais de 500 centros.
“A bandeira vermelha se espalhou pelo mundo”, gabou-se em 2016 Ma Jianfei, então gerente desta rede.
Como seus equivalentes francês, alemão ou espanhol, os Institutos Confúcio têm como objetivo promover a cultura chinesa por meio do ensino da língua e da organização de exposições e de exibições. Alguns são autônomos, outros têm parceria com universidades.
Mas, à medida que Pequim se expande estrategicamente pelo mundo, seus opositores acusam-nos de serem um instrumento de propaganda, de ameaçarem a liberdade acadêmica de seus parceiros e até mesmo de abrigarem espiões.
Seus responsáveis não responderam aos pedidos de entrevista da AFP.
– Espiões? –
Em 2019, a Bélgica privou um acadêmico chinês que dirigia o Instituto Confúcio de Bruxelas de um visto, e a União Europeia baniu-o do espaço Schengen por oito anos.
De acordo com o jornal De Morgen, Song Xinning foi alvo das autoridades belgas por “ameaçar a segurança nacional”.
Embora a Justiça tenha anulado a decisão europeia, para François-Yves Damon, sinologista e diretor do Centro Francês de Pesquisa de Inteligência (CF2R), essas suspeitas são “lógicas”.
“De acordo com o artigo 7º da Lei da Espionagem de junho de 2017, qualquer cidadão ou empresa chinesa é obrigado a prestar apoio às agências de Inteligência”, lembra.
Nem todos os chineses são, porém, espiões “em potencial”, acrescenta. Os Institutos Confúcio existem “para garantir que o que é divulgado sobre a China corresponde à vontade do Partido Comunista”, assinala.
Um membro de um serviço de Inteligência europeu confirma: os Institutos Confúcio (IC) são “ferramentas de influência, mas não são o cerne do ‘modelo de negócio’ da espionagem chinesa, que é econômico”.
– Disparidade entre institutos –
Para o sinologista italiano Mauricio Scarpari, “nenhum outro instituto cultural do mundo está tão entrelaçado com universidades estrangeiras, uma surpreendente anomalia, considerando que estão sob o controle de um órgão estatal totalmente controlado pelo Partido Comunista Chinês”.
Isso não significa, contudo, que haja, sistematicamente, controle por parte de Pequim nas universidades, com as quais trabalha.
Em um estudo sobre os institutos de seu país, o pesquisador alemão Falk Hartig, destaca que tudo “depende da equipe local”. Na Alemanha, por exemplo, os diretores dos IC rejeitam as acusações de propaganda, alegando que usam livros alemães, e não chineses.
Na França, várias fontes apontam disparidades entre os institutos. Alguns se limitam a organizar atividades folclóricas, e não culturais, e outros organizam conferências de qualidade, cujos convidados às vezes até criticam o regime chinês.
Uma ex-funcionária, que falou sob condição de anonimato, disse que “havia muita liberdade para propor temas” na esfera cultural. “Nunca tive a impressão de fazer parte de uma vasta empresa pró-partido”, completou.
Luisa Prudentino, especialista em cinema chinês, afirma que “nunca teve problemas” na organização da Semana do Cinema Chinês em La Rochelle, que coorganiza o Instituto Confúcio nesta cidade do oeste da França.
“Claro, não há provocação, principalmente com o filme de abertura, mas pude ver nos outros dias filmes que não são necessariamente consensuais, que falam de temas delicados, como Hong Kong, ou Tibete. Mas eu sei que não acontece necessariamente da mesma forma em todos os lugares”.
– “Esquizofrenia” –
Para François-Yves Damon, assim como para um ex-funcionário da Inteligência francesa que pediu anonimato, existe “uma espécie de esquizofrenia” e de “ingenuidade” em relação à China.
Os países mais críticos dos ICs são os membros do grupo dos 5 anglo-saxões que compartilham informações de Inteligência: Estados Unidos, Canadá, Austrália, Nova Zelândia, Reino Unido.
Em um contexto de guerra comercial com a China, “os Estados Unidos estão pressionando seus parceiros a se alinharem com suas posições antichinesas. Isso se reflete nessa forma de discurso que estigmatiza os ICs”, segundo o ex-funcionário da Inteligência.
“Mas também, Canadá e Austrália receberam muitos estudantes chineses, investimentos chineses (…) e perceberam no início da década de 2010 que isso acabou criando um problema, inclusive de soberania, com interferências significativas, em áreas tecnológicas por exemplo”, acrescenta.
Globalmente, muitos Institutos Confúcio em todo mundo estão fechando, a pedido de autoridades temerosas.
Dez anos depois de ser a primeira universidade da Europa a sediar um desses centros, Estocolmo interrompeu qualquer cooperação em 2015. Sete municípios suecos fizeram o mesmo, de acordo com uma contagem realizada em junho por rádios públicas daquele país.
Nos Estados Unidos, a Associação Nacional de acadêmicos contabilizou 55 Institutos Confúcio em fevereiro (três dos quais estão programados para fechar em 2021) em comparação com 103 em 2017.