06/01/2016 - 14:55
Nas células jihadistas que partem para lutar na Síria ou que buscam cometer atentados em nome do Islã, há muitos irmãos, um fenômeno que especialistas atribuem a motivos psicológicos e táticos.
Os irmãos Merah em 2012 em Toulouse (sul da França), os Kouachi no atentado contra a Charlie Hebdo em Paris há um ano, os Abdeslam e os Abaaoud em novembro, também em Paris, os Tsarnaev que cometeram o atentado contra a maratona de Boston em 2013: nos últimos anos, muitos irmãos de sangue se tornaram irmãos de armas contra os que consideram “inimigos do Islã”.
E nas listas de procedimentos judiciais abertos na França e na Bélgica por viagens a zonas controladas pelo grupo Estado Islâmico na Síria e no Iraque, os sobrenomes iguais são numerosos, frequentemente em grupos de três ou quatro.
“É um fenômeno natural”, explica à AFP o psiquiatra e ex-agente da CIA Marc Sageman, que foi um dos primeiros a apontar, em um livro divulgado em 2003, este fenômeno. “A identidade social é desenvolvida falando primeiramente aos familiares. E, é claro, os familiares são, principalmente, os irmãos e os amigos de infância”, afirma.
“É o que eu chamo de ativação da identidade social. Trata-se de uma questão de proximidade. Por isso nos grupos jihadistas há tantos irmãos, às vezes irmãs, e amigos de bairro. Cresceram juntos, inventam para si mesmos uma identidade de um Islã agredido, de mulheres e crianças mortas em bombardeios. Radicalizam-se, reconfortam uns aos outros”, explica Sageman.
Diante desta rigorosa vigilância organizada depois dos atentados de 11 de setembro de 2001 nas mesquitas e locais de culto, estes pequenos grupos familiares, impossíveis de serem infiltrados a partir do exterior, se fecham em si mesmos e aprendem na rede as técnicas de simulação.
“É uma questão de confiança”, acrescenta Marc Sageman. “Naturalmente confia em um parente. E quando se trata de arrastar alguém com você, o alvo mais lógico é seu irmão mais novo ou seu irmão mais velho. É o mesmo fenômeno nas gangues de rua. Não são necessários doutrinamento ou lavagem cerebral”.
Patrick Amoyel, psicanalista e professor de psicopatia em Nice (sudeste da França), trabalha, no âmbito de uma associação denominada Entr’Autres, na desradicalização de jovens seduzidos pelas teses jihadistas. Em contato com as famílias, notou a presença de muitos irmãos.
“Dentro delas, a influência funciona nas duas direções”, declara Amoyel à AFP. “Fecham-se rapidamente em uma espécie de confusão psíquica. Há algo de um pouco louco, um pouco irracional neste processo. Um (ato de) assumir riscos um tanto adolescente, embora nem sempre sejam adolescentes”, sustenta.
Psicóloga da associação Entr’Autres, Amélie Boukhobza afirma que “frequentemente é o mais jovem que tem mais coisas a demonstrar, um lugar a achar, e que influencia o mais velho. O irmão mais velho não tem necessariamente a ascendência”.
Uma vez que esta bolha de radicalização tenha se instalado, frequentemente sem que os outros parentes percebam, adquire uma coerência e uma resistência a qualquer custo.
“Pode se ampliar aos círculos de amigos próximos, com, por exemplo, o melhor amigo que se casa religiosamente com a irmã, e isso cria células muito homogêneas e fundidas do ponto de vista psicológico e afetivo”, acrescenta Amoyel. “A este nível ocorre uma consolidação afetiva mútua que é muito sólida, difícil de romper. Vemos isso com frequência. E isso não remete de forma alguma a uma doença mental, não é do campo do psicótico nem do psicopatológico”, explica.
“É um círculo permanente de influência de uma pessoa à outra e vice-versa, e pode desembocar em qualquer coisa”, afirma, citando a “vontade de ultrapassar o limite, de ir à rebelião absoluta. E isso pode terminar em ação terrorista”, conclui.
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