Depois de mais de 200 anos, nesta quinta-feira, 16, o Parque Nacional da Tijuca voltou a ser habitado por jabutis-tinga. Vinte e oito animais dessa espécie foram reintroduzidos no setor Floresta do Parque, por iniciativa do Refauna, projeto de pesquisadores da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e de outras instituições de ensino. É a primeira experiência de reintrodução dessa espécie em parque brasileiro.

Os animais foram divididos em dois grupos. Catorze deles passaram por um processo de aclimatação em um cercado dentro do parque, durante os últimos seis meses. Nesse período os pesquisadores acompanharam dados como padrões e hábitos de alimentação, comportamento e deslocamento. Outros 14 animais da mesma espécie foram soltos sem passar pelo período de aclimatação. Eles foram direto do Centro de Triagem de Animais Silvestres do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) no Rio de Janeiro para a floresta.

Segundo Marcelo Rheingantz, biólogo da UFRJ e pesquisador do Refauna, os dois grupos foram soltos ao mesmo tempo para que os animais sejam comparados e os pesquisadores concluam qual é a melhor forma de reintrodução. “É a primeira vez que estamos reintroduzindo o jabuti-tinga no Parque Nacional da Tijuca, e não há registros de reintrodução dessa espécie no Brasil em locais onde deixaram de existir, como o parque. Por isso, estamos avaliando se a aclimatação influencia a sobrevivência, para subsidiar futuras reintroduções de populações desses animais, já que, no total, pretendemos devolver para a natureza cerca de 60 jabutis. Vamos liberar mais um grupo no período seco e comparar com a sobrevivência deste (liberado em período chuvoso). Nosso objetivo é avaliar se a estação do ano também influencia na sobrevivência. Isso vai subsidiar a construção de um guia para translocações de jabutis em ambientes florestais”, disse o biólogo.

A presença de jabutis-tinga no Parque Nacional da Tijuca é importante porque eles são bons dispersores de sementes, em especial sementes grandes, segundo os biólogos. O trabalho de jardinagem e de distribuir sementes é importante na persistência de espécies de plantas nativas que compõem a flora do parque. Além de dispersarem sementes, os jabutis também comem e pisoteiam plantas que poderiam se tornar pragas, auxiliando no controle de suas populações e no favorecimento da diversidade vegetal.

Os jabutis já foram abundantes na mata atlântica, e acabaram dizimados por fatores como a caça e o desmatamento. Por isso, as equipes do Parque Nacional da Tijuca e do Refauna pedem que os visitantes do parque não mexam com esses animais, não levem outros jabutis da mesma espécie ou de espécies diferentes para interagir com eles e trafeguem dentro da velocidade permitida nas vias internas ou que circundam o parque, permitindo que esses bichos atravessem tranquilamente as vias. Os visitantes também são orientados a nunca alimentar animais silvestres.

Além dos jabutis-tinga, já foram reintroduzidos no Parque Nacional da Tijuca, por meio do Refauna, cutias (a partir de 2010) e bugios (a partir de 2015). As cutias são excelentes dispersoras de sementes e os únicos animais capazes de enterrar sementes da espécie de árvore conhecida como cutieira, exatamente pela associação com esses animais. Em áreas sem cutias, as sementes permanecem intocadas no chão até apodrecerem.

Já os bugios, que também são herbívoros e dispersam sementes, são capazes de levá-las a longas distâncias, além de manter uma relação bastante curiosa com besouros rola-bosta. Esses besouros fazem pequenas bolas com as fezes dos bugios e, enquanto fazem isso, levam e enterram as sementes, favorecendo sua germinação.

Refauna

O Parque Nacional da Tijuca, além de ser a casa para onde os animais são reintegrados, é também onde o Refauna foi idealizado. Em 2008, uma servidora aposentada do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), Ivandy Castro, notou a ausência de cutias no parque e sugeriu a Alexandra dos Santos Pires e Fernando Fernandez a sua reintrodução. Assim começou o projeto, uma iniciativa de pesquisadores do Laboratório de Ecologia e Conservação de Populações da Universidade Federal do Rio de Janeiro (LECP-UFRJ), do Laboratório de Ecologia e Conservação de Florestas da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (LECF-UFRRJ) e do Laboratório de Ecologia e Manejo de Animais Silvestres do Instituto Federal do Rio de Janeiro (Lemas-IFRJ), com parcerias e convênios com várias entidades.