23/06/2022 - 9:14
Quando a jornalista russa Marina Ovsiannikova invadiu um programa de televisão ao vivo em seu país para denunciar a guerra na Ucrânia, ela certamente esperava uma reação negativa da Rússia, mas não tanta hostilidade por parte do resto do mundo.
Três meses depois, Ovsiannikova, 43, vive no exílio, com medo de retornar à Rússia e ser presa.
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Mas, ao mesmo tempo, ela enfrenta crescente hostilidade na Ucrânia e no Ocidente, onde seus críticos a acusam de ser uma espiã da máquina de propaganda russa.
“Estou no meio dessa guerra de informação”, diz Ovsiannikova, de passagem por Berlim, onde foi convidada pelo Fórum das Mulheres, uma plataforma sobre o papel da mulher na economia e na sociedade.
“É uma situação realmente absurda, porque a Rússia quer me privar da cidadania e me prender, e as autoridades ucranianas querem me proibir de entrar no país porque sou uma ex-propagandista de Moscou”, afirma a jornalista, filha de mãe russa e pai ucraniano.
Em meados de março, poucos dias após o início da invasão russa da Ucrânia, ela interrompeu o noticiário mais assistido do país, na rede Pervy Kanal, com uma faixa que dizia: “Não à guerra”.
Ela foi detida e interrogada por 14 horas e depois condenada a pagar uma multa de 30.000 rublos (525 euros, 550 dólares), mas agora corre o risco de ser condenada a penas de prisão severas sob uma lei recente que reprime “informações falsas” sobre o exército russo.
– “Vácuo” de informação –
As imagens de sua intervenção correram o mundo e sua coragem foi elogiada em todos os lugares.
Depois de deixar a rede Channel One, onde trabalhava, Ovsiannikova conseguiu uma vaga como correspondente do jornal alemão Die Welt.
Mas não durou muito: “Não era conveniente em termos de colaboração concreta e trabalho diário”, disse uma fonte editorial à AFP.
Ela também não teve sucesso quando viajou para a Ucrânia em junho para trabalhar como jornalista freelance.
“Eu queria mostrar aos russos o que realmente está acontecendo em Bucha… o que realmente está acontecendo na Ucrânia, talvez entrevistar (o presidente ucraniano Volodimir) Zelensky”, explica.
“Os russos vivem atualmente em um vácuo absoluto. Eles não têm informações porque todos os meios de comunicação independentes na Rússia estão bloqueados, há apenas informações que vêm do Kremlin”, acrescenta.
– Ironia como salvação –
Mas ela foi recebida na Ucrânia com desconfiança, até hostilidade.
“Os ucranianos não acreditam em sua mudança repentina”, escreveu no Twitter a jornalista ucraniana Olga Tokariuk, conselheira do Centro de Análise de Políticas Europeias.
Segundo ela, os relatos feitos na linha de frente por Ovsiannikova e depois publicados nas redes sociais são “manipuladores, incorretos e condescendentes”.
Mas a jornalista diz que sua própria história lhe permite “entender o que as mulheres e crianças ucranianas sentem agora”.
Ela passou parte de sua infância em Grozny, capital da província separatista da Chechênia, onde sua casa foi destruída durante o bombardeio do exército russo na primeira guerra da Chechênia (1994-1996).
Levará tempo “para que os ucranianos comecem a entender (que também há) bons russos que estão protestando contra a guerra”, alega a jornalista.
Agora seu futuro é incerto, mas Ovsiannikova diz que quer destruir “a máquina de propaganda do Kremlin”, mas também ver seus dois filhos, de 11 e 17 anos, que ainda estão na Rússia com o ex-marido.
“Meus amigos me perguntam: ‘você prefere veneno ou acidente de carro?'” ironicamente, e depois acrescenta: “Sem humor na minha situação, acho impossível viver”.