26/06/2025 - 8:24
Enquanto delegações internacionais são esperadas em Belém, jovens das periferias brasileiras participam de “pré-COP” na Alemanha e cobram apoio a periferias urbanas afetadas pelas mudanças climáticas.Enquanto o Brasil se prepara para receber delegações internacionais para a COP30, em Belém, um grupo de jovens brasileiros tomou parte na Alemanha nesta semana num dos pré-eventos que precedem a conferência para tentar chamar a atenção para a importância das periferias urbanas nas discussões climáticas.
Participando na cidade alemã de Bonn de eventos paralelos da 62ª sessão dos Órgãos Subsidiários da Convenção das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (SB62), evento que é considerado uma “pré-COP”, os jovens argumentaram que é urgente considerar as comunidades periféricas e suas soluções no centro das decisões globais sobre o clima, assim como a importância da juventude estar incluída nas discussões oficiais.
As periferias estão entre as áreas mais afetadas pelos danos ambientais e por eventos climáticos extremos, como enchentes, ondas de calor e deslizamentos de terra. Segundo a última atualização do relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC, na sigla em inglês), de 2022, populações urbanas vulneráveis têm 15 vezes mais chances de morrer em decorrência de eventos climáticos extremos causados pelas mudanças climáticas.
“Quando a gente olha para as crises climáticas, a gente tem um entendimento que quem mais sofre na pele somos nós”, afirma Mateus Fernandes, comunicador e ativista de Guarulhos (SP) que integra a delegação da Presidência Jovem da COP30. “Estarmos aqui é justamente reivindicar, é cobrar que tenham políticas efetivas para solucionar os problemas desse território.”
“As periferias são ancestralidade, são o chão, são o coração e são quem historicamente está enfrentando as consequências das mudanças climáticas sem ter contribuído para as decisões sobre o clima”, afirmou, por sua vez, Marcele Oliveira, produtora cultural originária da Zona Oeste do Rio de Janeiro.
Do ativismo em Realengo para a Alemanha
Marcele Oliveira foi escolhida no início do ano entre 154 pessoas pelo governo brasileiro para função de Jovem Campeã do Clima da COP30, papel criado na COP28 para aumentar a representatividade dos jovens nas discussões climáticas.
Hoje com 26 anos, ela ingressou no ativismo ao se juntar aos esforços para criação de um parque verde no bairro de Realengo, na Zona Oeste do Rio de Janeiro, uma região carente de áreas públicas de lazer. A mobilização dos moradores para criação do parque acabou se tornando uma política pública para parques urbanos e ecológicos nas periferias da cidade.
“Essa luta transformou a minha trajetória como produtora cultural, que era minha carreira, minha faculdade, meu trabalho, para também ser ativista climática entendendo como a cultura era uma importante ferramenta para a educação climática, conscientização e mobilização da sociedade civil, mas também dos governantes, dos tomadores de decisão”, diz Marcele.
Neste ano, a ativista atua como liderança da juventude no Mutirão Global pelo Clima, iniciativa da Presidência da COP30 para transformar compromissos climáticos em ações e que enfatiza o papel das comunidades locais na implementação de soluções.
“As periferias no Brasil tem desenvolvido experiências extraordinárias”, afirma o embaixador André Correa do Lago, presidente da COP30. “A ideia que a gente desenvolveu do Mutirão veio muito do que vimos acontecendo nas periferias no Brasil, que é o quanto você pode fazer com poucos recursos, mas quando você se dá conta que aquele pouco parece pouco vai ter um impacto enorme na comunidade.”
“Falar de mutirão aqui em Bonn é falar também sobre como nós temos juventudes engajadas fazendo relatórios, indicadores e incidindo nas negociações”, conta Marcele.
“Temos soluções, mas não temos recurso”
Para Mateus Fernandes, comunicador e ativista que integra a equipe da Juventude na Cúpula em Bonn, a presença de jovens da periferia no evento não se limita a um acompanhamento dos debates e negociações, mas envolve apresentar soluções climáticas criadas pelas populações em favelas.
“O lugar de favelado é numa conferência da ONU, o lugar de favelado é também trazendo as soluções. É desse território que apesar de sofrer os impactos, nascem muitas soluções também”, afirma Mateus.
“Falar de meio-ambiente sem falar das periferias é calar metade das soluções. A gente tem tecnologias sociais, a gente tem articulação territorial, a gente tem também ferramentas, de fato, para solucionar os problemas ambientais, o que a gente não tem é recurso”, completa.
Nascido no bairro de Santos Dumont, na cidade de Guarulhos, na grande São Paulo, o ativista também argumenta que muitos acordos de financiamento climáticos negociados em conferências internacionais como esta em Bonn não chegam nas regiões periféricas.
“Através do território da onde eu vim, eu entendi a necessidade das urgências climáticas, da importância da gente se mobilizar, da importância da gente se articular enquanto jovens periféricos para trazer um retorno para o nosso território”, afirma Mateus.
Jovens na COP30
Para os jovens ativistas, a COP30, que será realizada em Belém em novembro, representa uma oportunidade para aproximar as discussões climáticas da população. Segundo Mateus, sua missão é traduzir de forma acessível temas que, muitas vezes, são excessivamente técnicos e distantes da realidade de grande parte das pessoas — sejam jovens, crianças, adultos ou idosos.
“Eu tô bem empolgado de voltar para casa, de voltar para o meu território e poder compartilhar o que é tudo isso, né?”, conta o ativista. “Eu brinco que esse momento aqui da conferência de clima de Bonn é como se fosse um treino para uma Copa do Mundo, uma disputa que a gente só vai ver no final do ano.”
O embaixador Corrêa do Lago reforça que a juventude terá um papel central na COP em Belém, que deve acontecer no final deste ano. “O mundo que a gente está preparando é o mundo que eles vão viver e, portanto, eles têm realmente um direito à voz que não tem sido dado na proporção que deveria”, afirma. “Nós vamos, sim, procurar fazer dessa COP uma edição mais voltada para a educação e para os jovens do que as anteriores.”
Para Marcele, mesmo que os avanços formais nas negociações fiquem aquém do necessário, a força das mobilizações populares será decisiva.
“Se a portas fechadas, as considerações das populações não estão sendo colocadas, no Brasil pode esperar que do lado de fora serão”, afirma a ativista.