20/04/2016 - 0:00
O Código de Defesa do Consumidor, instituído pela lei 8078, de 11 de setembro de 1990, é sem dúvida uma arma poderosa de proteção aos cidadãos, diante de fornecedores relapsos ou inescrupulosos, e de regulamentação das relações de consumo no País. Rapidamente, nestes 25 anos de vigência, tornou-se um dos instrumentos mais acionados na Justiça: segundo a advogada Vanessa Vilarino Louzada, head da área de relações de consumo e cobrança de créditos em atraso do escritório Neolaw, de São Paulo, ele responde pela metade dos 90 milhões de processos em tramitação no judiciário brasileiro.
No entanto, de acordo com Vanessa, esse mecanismo de defesa nem sempre tem sido utilizado adequadamente, dando origem ao que ela qualifica como uma verdadeira indústria do dano moral, entulhando as prateleiras do Juizado Especial Civil, denominação atual do juizado de pequenas causas. “Há sempre alguém procurando oportunidades para processar as empresas, mesmo sem ter uma razão plausível para tanto”, diz ela.
Vanessa lembra um caso recente envolvendo um dos principais clientes do Neolaw, o site de comparação de preços Buscapé, e o varejista paulista Lilla Imports, acionados por um consumidor de Florianópolis, que reclamava de defeitos num celular Samsung Galaxy. Detalhe: o aparelho fora adquirido em novembro 2012 e a ação ajuizada em agosto de 2015. No entanto, o reclamante, Bruno dos Santos Vieira, não contava, com a reação inusitada do juiz Valter Fontana, do 2ª Juizado Especial Cível da capital catarinense, ao se dar conta do prazo decorrido entre a aquisição do celular e a reclamação.
“Ao ler a peça, no item 15, o autor tentou dar o primeiro “migué” neste Juiz, ao alegar que inúmeras vezes tentou amigavelmente resolver o problema”, escreveu Fontana. “Mas, onde está a prova? Ou onde isso foi alegado na inicial?” O juiz ficou também injuriado com a tentativa do reclamante de desfazer-se do aparelho. “O autor simplesmente não tem mais interesse na manutenção do produto (isso dois anos e meio após o uso) e quer a recisão do contrato.”
O meritíssimo encerrou a sentença com chave de ouro, externando seu estado de espírito diante do “migué” do consumidor. “Confesso que fiquei triste com este processo, com o autor, com os advogados, com o Judiciário, com o sistema e comigo mesmo”, afirmou. “Numa sexta feira à tarde, 16 horas, janeiro, sol forte lá fora, pergunto se mereço, realmente, estar “julgando” este processo. Acho que não.”