Os juros do crédito imobiliário, que estão em dois dígitos, não devem cair nos próximos meses, na avaliação da Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança (Abecip). Embora a redução da taxa Selic abra espaço, a cobrança de taxas mais baixas pelos bancos dependerá do comportamento da poupança, que teve saques de mais de R$ 150 bilhões nos últimos dois anos.

“Não identificamos uma redução de taxa do crédito imobiliário no curto prazo”, afirmou o presidente da Abecip, Sandro Gamba, em coletiva de imprensa realizada na quarta-feira, 24, para tratar dos resultados do setor no ano passado e as projeções para este ano.

A Abecip espera que o crédito para a habitação bata recorde em 2024, graças às linhas que utilizam recursos do FGTS e que têm taxas mais baixas.

Nas linhas que usam dinheiro da poupança, os bancos elevaram no ano passado os juros para a casa dos dois dígitos porcentuais.

Segundo o Banco Central, a taxa média praticada pelo mercado estava em 10,8% ao ano em novembro de 2023, 0,4 ponto porcentual superior ao de um ano antes. O pico de taxas foi em julho, quando o juro médio chegou a 11,9%.

Entre os cinco maiores agentes do financiamento imobiliário no País, a Caixa Econômica Federal, líder no setor, e o Banco do Brasil mantêm juros a um dígito anual nas linhas que usam recursos da poupança, mesmo tendo acompanhado a elevação de taxas. As taxas têm sido mantidas pelos bancos desde o primeiro semestre de 2023.

Além da Selic a dois dígitos, a redução da poupança pressionou os custos dos bancos. No fim do ano passado, o saldo das cadernetas direcionado ao crédito imobiliário era de R$ 747 bilhões, 2,2% menor que em 2022. Os saques líquidos somaram R$ 72 bilhões, o segundo pior resultado dos últimos dez anos. Ficaram atrás somente dos saques em 2022, de R$ 81 bilhões.

Em 2020, o auxílio emergencial deu um impulso de R$ 125 bilhões à poupança, mas o saldo tem caído desde então. A variação abriu uma avenida para que outras fontes de financiamento ganhassem espaço no cardápio do setor, como as letras imobiliárias garantidas (LIGs) e as letras de crédito imobiliário (LCIs). Essas e outras fontes alternativas foram de 34% a 40% do financiamento ao crédito imobiliário entre 2022 e 2023.

Diversificação

Dinheiro não é problema: as fontes de financiamento cresceram 13% no ano passado, para R$ 2,17 trilhões, graças ao aumento dos saldos das fontes alternativas e também ao maior orçamento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS). Em dois anos, a poupança perdeu 12 pontos porcentuais em participação, para 34%.

A diversificação é uma demanda do mercado imobiliário e uma agenda que o Banco Central vê com simpatia, mas as fontes alternativas são mais caras para os bancos. Quando a taxa está acima de 8,5% ao ano, a poupança tem o rendimento “travado” em 0,5% ao mês mais a taxa referencial, hoje próxima a zero. LCIs, LIGs e CRIs, por outro lado, têm o rendimento atrelado ao CDI.

“O ambiente com uma redução de taxa de juros contribui para a precificação do mercado imobiliário, mas temos que destacar que a relevância da poupança diminuiu, o que faz com que o custo do crédito imobiliário tenha uma correlação maior com a Selic”, afirmou Gamba durante a coletiva.

Como mostrou a Coluna do Broadcast no fim do ano passado, a Abecip, junto à Caixa, pleiteia junto ao BC a liberação de parte dos depósitos compulsórios relativos à poupança para destinar esses recursos ao crédito imobiliário. O regulador obriga os bancos a manterem nessas contas 21% dos depósitos à vista, categoria em que está a poupança, para assegurar a segurança do sistema financeiro.

Gamba disse que a redução do compulsório é discutida com frequência pelo setor. Entretanto, não está incluída nas previsões para este ano, que apontam para um crescimento de 3% na concessão de crédito imobiliário, o que levaria a um recorde de R$ 259 bilhões em liberações.