09/05/2022 - 8:01
A alta de juros e o menor crescimento global se transformaram em uma combinação fulminante para o valor das fintechs em todo o mundo. Isso inclui o brasileiro Nubank, que acaba de chegar ao seu valor mínimo de mercado, poucos meses depois de protagonizar uma das mais badaladas aberturas de capital do planeta. Com essa mudança de cenário, somada à inflação e ao contexto ainda mais desafiador da guerra entre Rússia e Ucrânia, o risco para o desembolso de crédito aumentou, o que coloca em xeque o ritmo do crescimento futuro de startups do setor financeiro.
Na média, as grandes fintechs listadas já perderam cerca de metade do valor no acumulado deste ano. O Nubank roda perto de seu preço mínimo, com um recuo de cerca de 40% em relação ao preço de largada de sua oferta inicial de ações (IPO, na sigla em inglês), em dezembro de 2021 – no ano, a desvalorização é de 42%. Entre outras brasileiras também listadas nos Estados Unidos, PagSeguro registrou um tombo de cerca de 45% e Stone, de mais de 50%. Fintechs estrangeiras também registram quedas expressivas.
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Com esse cenário, nas últimas semanas, analistas do setor financeiro passaram a escrever relatórios mais reticentes. O principal ponto de cautela tem sido a qualidade do crédito concedido pelas fintechs. A pergunta mais frequente é se o cliente que fez o empréstimo terá fôlego para pagá-lo. “Isso aumenta o risco de o Nubank eventualmente ter de frear a originação (concessão de crédito), diminuindo o ritmo de monetização e diminuindo as esperanças para 2023”, segundo relatório do Itaú BBA, assinado pelos analistas Pedro Leduc, Mateus Raffaelli e William Barranjard.
A ação do Nubank também sofre por conta do sinal verde para a venda de papéis da companhia, que estavam bloqueados desde o IPO. Procurado, o Nubank disse que seu “foco é impulsionar o crescimento de longo prazo e gerar valor para nossos acionistas e clientes” e que busca investidores “alinhados à nossa visão estratégica para o negócio”.
ORIGEM
O primeiro sinal de alerta sobre o setor foi o resultado da empresa de adquirência e de tecnologia de pagamentos Stone – também listada em Nova York -, que jogou os olhares para os problemas que as fintechs poderiam ter sob o contexto de juros altos e economia patinando. A fintech teve um ano de 2021 complicado, provocado, essencialmente, pela má qualidade de crédito. Com isso, em 2021, a empresa viu seu lucro cair 79%, somando R$ 203 milhões. Suas despesas financeiras também deram um salto.
A Stone aponta que o aumento de juro já é um processo identificado pela companhia “há bastante de tempo” e que, por isso, tem feito uma reprecificação gradual que garantiu aumento do número de clientes. “Não há dúvidas de que desenham um cenário mais desafiador, mas não tem afetado o contínuo estabelecimento de bases mais sólidas para alicerçar o crescimento da companhia no futuro.”
PRIMEIRA CRISE
Outro ponto de preocupação é o fato de essa ser a primeira grande crise vivida por muitas fintechs, lembra Bruno Diniz, sócio da consultoria Spiralem. “Os players listados estão em situação bem ruim, como reflexo de uma expectativa negativa de como elas irão se segurar nessa grande crise”, diz Diniz.
Neste ambiente, o crédito será outro importante desafio, aponta Carlos Macedo, analista do setor financeiro da Ohmresearch. “O crédito anda de braço dado com o crescimento”, diz o especialista.
Macedo ainda lembra que o contexto macroeconômico no Brasil não está bom, com um ciclo econômico negativo e inadimplência do crédito ao consumo em trajetória de alta. Isso significa que, para manter o crescimento, as fintechs terão de conceder crédito a um perfil de clientes de maior risco.
O especialista frisa, contudo, que as fintechs seguem com boa situação financeira – o Nubank, por exemplo, está muito capitalizado para enfrentar o novo panorama.
Sócio da gestora KPTL, especializada em investimentos em empresas de tecnologia, Renato Ramalho lembra que a queda dos valores das fintechs também é observada no mundo das empresas de tecnologia. Nos últimos dois anos, essas companhias cresceram beneficiadas por uma grande liquidez em todo o mundo, o que direcionou bilhões de dólares às empresas do setor. A fonte agora, porém, secou.
“O mundo estava eufórico”, define Ramalho. Agora, segundo ele, essas empresas deverão passar por um processo de acomodação, mas em “um nível saudável”, prevê.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.