O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) decidiu que a Urbia, concessionária do Parque do Ibirapuera, tem autorização para cobrar taxa de uma empresa de assessoria esportiva que utiliza o espaço para treinamento dos seus clientes. A liminar diz respeito a The Run, que foi processada pela Urbia pelo não pagamento da taxa, e cabe recurso.

O valor, entorno de R$ 10 por aluno, tem sido amplamente discutida pela categoria de assessorias esportivas desde o começo de 2025. O Ministério Público apura a se há uso indevido do espaço. Segundo Silvio Marques, promotor responsável, as investigações caminham para provar ilegalidade por parte da conduta geral da concessionária (leia mais abaixo). A Urbia nega cometer ilegalidades.

A Associação dos Treinadores de Corrida de São Paulo (ATC-SP), que representa as assessorias esportivas, alega que a taxa configuraria cobrança de entrada em parque público para a prática de lazer esportivo, o que seria ilegal. Além disso, reclama que as regras impostas pela concessionária seriam uma tentativa de monopólio.

“A concessionária quer que as assessorias assinem um contrato feito unilateralmente por eles, com várias cláusulas que possivelmente as assessorias não conseguirão cumprir”, diz a ATC-SP.

Entre essas cláusulas, estão a responsabilidade da assessoria pelo atendimento médico dos alunos caso tenham intercorrência no espaço e a não citação do nome do parque nas redes sociais sem aprovação da Urbia.

Utilização econômica do espaço público

A decisão da Justiça, assinada pela juíza Lais Helena Bresser Lang, da 4ª Vara Cível da capital, diz que consta no contrato de concessão do parque “o direito da Concessionária de explorar o objeto, com ampla liberdade empresarial e de gestão de suas atividades, explorar fontes de receita, sub-contratar terceiros para o desenvolvimento de atividades relacionadas à execução do objeto”.

Ela destaca ainda que, conforme o contrato, “este direito também lhe impõe deveres, dentre eles cuidar para que terceiros contratados ou subcontratados sejam detentores de capacidade técnica compatível com as atividades objeto da concessão”. Ou seja, é obrigação da Urbia regulamentar e acompanhar, com possível taxação, empresas que promovem atividades dentro do parque.

De acordo com a juíza, a empresa de assessoria em questão, The Run, cobra pelo serviço prestado aos seus clientes entre R$ 300 e R$ 500 e, portanto, o pagamento de uma taxa de cerca de R$ 10 por aluno, como tem sido praticado pela Urbia, não representa “oneração indevida à empresa”.

“A ré (assessoria esportiva), no exercício de sua atividade comercial, utiliza-se do espaço do parque, cujo custo de manutenção, fiscalização, limpeza, segurança, etc, é todo da autora (Urbia), não lhe repassando todavia valores para tal fruição, contrariamente ao que prevê o Contrato de Concessão onerosa do espaço público”, diz o texto.

A determinação da Justiça é, então, de que a assessoria assine o termo de adesão ao uso do parque e pague a taxa estipulada pela Urbia se quiser continuar utilizando o espaço. “Ainda que não houvesse a terceirização na gestão do parque, poderia a própria municipalidade cobrar das pessoas físicas e jurídicas que se utilizam economicamente do espaço público, um valor mensal.”

O Estadão tenta contato com a The Run. A liminar ainda cabe recurso.

Urbia lançou próprio serviço de assessoria esportiva

Como mostrou o Estadão, após taxar as assessorias esportivas pela utilização do espaço do Parque do Ibirapuera, a Urbia lançou seu próprio serviço de assistência para quem quer evoluir na corrida. Além do acompanhamento especializado, os benefícios incluem descontos no estacionamento e uso de vestiários com chuveiro.

Para a ATC-SP, isso demonstra que a tentativa da concessionária seria de “forçar a saída de todas as assessorias” – já que, segundo a associação, mesmo que assinem o termo, as assessorias não conseguirão cumprir e não terão contrato renovado em um ano – para então ter exclusividade sobre a prestação de serviço no parque.

“Lançam a assessoria deles com um valor menor de mercado e com benefícios que só eles podem oferecer por eles serem os donos do parque”, diz a associação. O “Corre no Ibira”, nome dado ao projeto, foi divulgado com mensalidades que vão de R$ 170,90 a R$ 279,90. Já o valor médio de outras assessorias seria de R$ 300.

Parque do Ibirapuera não é ‘shopping’, diz promotor

O promotor Silvio Marques tem o mesmo entendimento da ATC-SP, de que as atitudes da concessionária, em conjunto, revelam uma “tentativa de privatização” do espaço. De acordo com ele, o inquérito do MP-SP está em fase final de oitivas e o parecer deve ser emitido em breve, provando ilegalidade na conduta da concessionária em relação ao uso do espaço público.

Além do possível monopólio das atividades de assessoria esportiva, o promotor citou ao Estadão como prova disso a implementação de diversos restaurantes – muitos deles de alto padrão – e serviços de acesso restrito e pago dentro do parque, como a “Casa Nubank Ultravioleta”. “Isso diminui o acesso à população e o parque Ibirapuera é um espaço público, de uso comum”, diz.

“Não é um shopping center”, reforça ele, repetindo o termo já utilizado em um dos documentos do inquérito, que tem como alvo a concessionária Urbia e a Secretaria Municipal do Verde e Meio Ambiente da gestão do prefeito Ricardo Nunes (MDB).

A Urbia nega irregularidades na concessão e diz considerar a comparação com um shopping center “inverídica”, “uma vez que não há lojas, mas apenas pontos de alimentos, bebidas e souvenirs”. De acordo com a concessionária, os espaços comerciais presentes no parque hoje foram reduzidos em relação ao período pré-concessão.

“Os pontos atuais constituem obrigação contratual com a inclusão de 169 vendedores autônomos ao projeto, pessoas que trabalham no parque há décadas. Hoje, não superam 140 unidades”, afirmou a Urbia em maio, quando a afirmação foi feita pela primeira vez pelo promotor.

Em nota, a gestão municipal disse, também à época, que o modelo de concessão “tem contribuído para a melhoria de equipamentos públicos e serviços à população” e reforçou o “compromisso com a legalidade, proteção ambiental e fiscalização das ações da Urbia”.