A juíza Giovana Pasqual de Melo, da 4ª Vara Cível de Sinop (MT), deu prazo de 15 dias para que o Grupo Safras, de Sorriso (MT), apresente pedido formal de recuperação judicial (rj), se considerar pertinente. A decisão foi publicada na noite da terça-feira, 25, no mesmo processo em que a companhia havia solicitado tutela cautelar para suspender reintegração de posse e evitar medidas de execução por parte de terceiros.

Na decisão, a juíza indeferiu o pedido feito pela empresa, que buscava evitar a reintegração de posse de uma planta industrial de processamento de soja em Cuiabá, operada pela companhia há mais de quatro anos. A estrutura pertence à massa falida da Olvepar, e está judicialmente vinculada à empresa Carbon Participações Ltda. “Não se encontram preenchidos os requisitos legais e objetivos indispensáveis à concessão da medida excepcional”, escreveu a magistrada na decisão.

Ela considerou “indevida a tentativa de utilização da lei que rege a recuperação judicial e as falências para paralisar os efeitos da reintegração de posse”. Na petição inicial, o Grupo Safras alegou risco de descontinuidade de suas atividades caso a reintegração fosse mantida.

Segundo a empresa, representada pelo advogado Elias Mubarak Junior, sem a planta industrial ela corre “severo risco de solução de continuidade”, conforme consta nos documentos apresentados à Justiça. A disputa envolve uma complexa cadeia de arrendamentos.

O imóvel industrial pertence à massa falida da Olvepar (antiga trading que pediu concordata em 2000) e foi arrendado para a Carbon Participações, que o arrendou para a Allos Participações. Esta, por sua vez, subarrendou a unidade para a Copagri (empresa paranaense adquirida pelo Grupo Safras em 2023 e posteriormente renomeada como Safras Agroindústria).

Na semana passada, o juiz Márcio Aparecido Guedes, da 1ª Vara Cível de Cuiabá, determinou a reintegração de posse após constatar irregularidades contratuais. Segundo a decisão, a Allos teria transferido indevidamente a posse do imóvel para a Copagri sem autorização do juízo falimentar ou dos credores, além de deixar de cumprir obrigações como manutenção do seguro patrimonial e pagamento de encargos.

Na petição inicial apresentada na segunda-feira (24), o Grupo Safras afirmou que a planta opera com capacidade de processamento de 1.700 toneladas diárias de soja, recebe 50 caminhões por dia e emprega diretamente mais de 180 trabalhadores. Segundo a empresa, a unidade seria vital para suas operações. “O Grupo Safras atua na unidade há mais de quatro anos, com base em contrato de subarrendamento celebrado com a empresa Allos Participações e Investimentos S/A”, afirmou a defesa do grupo.

Segundo a petição, há contrato vigente até 2031 e não há inadimplência nos pagamentos do subarrendamento. A juíza de Sinop, contudo, observou que as empresas chamadas pelo Grupo Safras para mediação – Carbon e Allos – “não se qualificam como credoras das requerentes”. “A medida pretendida não visa propiciar a mediação com credores, mas apenas pretende uma composição amigável quanto à disputa possessória que decorre da medida judicial proferida por outro juízo”, concluiu. “Todavia, o uso do art. 20-B da LREF não é compatível com a natureza da medida judicial combatida, tampouco se presta a sustar decisões legítimas de outro Juízo. Com efeito, o dispositivo legal em questão se refere às hipóteses em que a empresa em dificuldade busca, em fase preparatória, negociar com credores sujeitos à recuperação judicial”, escreveu a magistrada.

Um ponto favorável ao grupo é que a reintegração de posse já está temporariamente suspensa por liminar concedida pelo Tribunal de Justiça de Mato Grosso, em recurso apresentado pela própria Safras. A juíza destacou este fato na decisão. No pedido cautelar, o Grupo Safras expôs os fatores que levaram à sua crise financeira. Entre eles estão “a queda exponencial do preço no primeiro semestre/2023”, que “represou as ordens de venda do grão estocado nos armazéns”, a aquisição da Copagri em 2023, que trouxe “absorção de um passivo relevante”, e problemas na implementação do sistema SAP após a “falência decretada na fase final de implementação” da consultoria responsável.

O grupo também mencionou dificuldades para acessar linhas de crédito e “altos investimentos em capex da usina de etanol de milho e na esmagadora de soja sem a utilização de Project Finance”, comprometendo seu fluxo de caixa. A petição admitiu que as dificuldades levaram o grupo “ao limite da viabilidade econômica”.

A situação afeta diretamente a região de Sorriso, maior produtora de soja do País. Fontes do mercado estimam que as dívidas do grupo possam chegar a cerca de R$ 2 bilhões. A petição apresentada à Justiça, no entanto, avaliou a causa em cerca de R$ 144,5 milhões.

O Grupo Safras já iniciou procedimento de mediação com a Carbon Participações e a Allos Participações, com primeira reunião marcada para 9 de abril, conforme documentos anexados ao processo. Contudo, a tentativa de mediação pode ser superada pela necessidade de um pedido formal de recuperação judicial dentro dos próximos 15 dias.

Ao final da decisão, a juíza determinou: “Ante o exposto, considerando a ausência dos pressupostos legais e fáticos indispensáveis à concessão da medida excepcional pleiteada, indefiro o pedido de tutela cautelar antecedente. Por economia processual, faculto às requerentes que emendem a petição inicial, no prazo de 15 (quinze) dias, formulando pedido adequado de recuperação judicial, se assim entenderem pertinente, com a devida instrução documental exigida pela Lei 11.101/05, especialmente quanto aos arts. 48 e 51, sob pena de extinção”.

Fundado em 2010 pelos empresários Dilceu Rossato (ex-prefeito de Sorriso) e Pedro de Moraes Filho, o Grupo Safras é composto pelas empresas Safras Agroindústria, Safras Bioenergia e Safras Armazéns Gerais, com forte atuação no agronegócio mato-grossense.

O que diz o Grupo Safras

O Grupo Safras esclarece que obteve decisão favorável em recurso interposto (Agravo de Instrumento) contra a ordem de reintegração de posse proferida pelo Juízo da Primeira Vara Cível de Cuiabá. A decisão liminar do Relator suspendeu a ordem de reintegração, permitindo que o Grupo Safras mantenha normalmente suas operações na planta industrial.

As questões relacionadas ao contrato de arrendamento serão analisadas pelo Tribunal de Justiça do Mato Grosso. O Tribunal também decidirá se o juízo da Primeira Vara Cível de Cuiabá era, de fato, competente para julgar o pedido de reintegração de posse apresentado pelas empresas Carbon e Allos.

Além disso, o contrato vem sendo integralmente cumprido, com mais de R$ 100 milhões já investidos pelas arrendatárias.

As alegações da Carbon distorcem os fatos e colocam em risco uma atividade industrial essencial para o estado, além da manutenção de mais de 300 empregos diretos.