A Justiça de São Paulo suspendeu nesta segunda-feira, 5, o aumento do limite de barulho para até 75 decibéis no entorno de shows e grandes eventos na capital paulista, promulgado pelo prefeito Ricardo Nunes (MDB) na terça-feira, 29. A decisão foi liminar e atendeu a uma ação direta de inconstitucionalidade (ADI) movida pelo Diretório Estadual do PSOL.

A mudança está no artigo 13 da Lei 17.853/22, que regula o funcionamento das “dark kitchens”. O aumento dos decibéis foi inserido em um texto substitutivo ao projeto da lei das cozinhas industriais, que não é diretamente ligado ao tema, o que popularmente é chamado de “jabuti”.

A ação é movida contra a Prefeitura e a Câmara Municipal de São Paulo. Na decisão, o relator, desembargador Fernando Antonio Ferreira Rodrigues, avalia que o fundamento apontado pelo PSOL de que o artigo “não guarda pertinência temática com o objeto da proposta original” é “relevante”, “ao menos nesta fase de cognição liminar”. A decisão não abrange o restante da lei das dark kitchens.

+ SP libera barulho de até 75 decibéis e ‘dark kitchens’ em áreas residenciais

+ PSOL entra com ação contra lei sobre ‘dark kitchens’ e barulho de shows em SP

+ Após pressão, Prefeitura de SP quer mudar projeto que eleva ruído em shows

“O dispositivo impugnado, em princípio, não guarda pertinência temática com o objeto da proposta principal, e ainda foi aprovado, ao que parece, sem estudos técnicos e participação popular (artigo 180, inciso II, e 191 da Constituição Estadual), daí a plausibilidade da existência do vício de inconstitucionalidade”, destaca o desembargador.

“Consta, ademais, que a lei impugnada já se encontra em vigor, por isso presente o ‘periculum in mora’, decorrente do risco de prejuízos imediatos ao meio ambiente”, ressalta. O artigo está suspenso até um pronunciamento do Órgão Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP).

A Prefeitura nega que seja um “jabuti”. Em nota na última semana destacou: “Tendo em vista que o projeto de lei das dark kitchens trata do regramento para uma atividade nova na cidade e de seus parâmetros de incomodidade, entendeu-se possível a inclusão no texto de definição de parâmetros de incomodidade de ruído nas situações não previstas anteriormente na legislação.”

O presidente da Câmara, Milton Leite (União Brasil), durante a segunda e definitiva votação do projeto, na terça-feira, 29, também negou que o artigo sobre barulho seja um jabuti. Em nota nesta segunda, a Câmara afirmou que ainda “não foi notificada da decisão”.

A mudança foi promulgada por Nunes na mesma data da aprovação pelos vereadores. A nova lei entrou em vigor na quarta-feira, 30, após ser publicada no Diário Oficial. De autoria do Executivo , o texto passou por modificações por vereadores ligados à Prefeitura. A mais criticada foi a inclusão do artigo 13, relativo ao novo limite de decibéis para o entorno de shows e eventos de grande porte.

A mudança tem motivado críticas de associações de bairro e moradores por possibilitar o aumento do ruído em áreas hoje com emissão limitada a níveis inferiores, como 55 decibéis, a depender do zoneamento da vizinhança. A lei deve atingir especialmente as vizinhanças de arenas. Abaixo-assinados apresentados na Câmara reuniram mais de 20,8 mil assinaturas contrárias ao novo limite de decibéis.

O limite se refere a eventos e shows de grande porte previamente autorizados pelo poder público, “assim definidos em decreto regulamentar, que por sua natureza não ocorrem de forma continuada”. Outra mudança na versão aprovada é a inclusão de um parágrafo que destaca que as disposições constantes no artigo “não eximem os responsáveis do cumprimento de medidas mitigadoras relacionadas com o ruído a serem implementadas no estabelecimento ou entorno, conforme o caso”.

Para especialistas, a exposição prolongada a barulho alto pode causar danos ao corpo, como distúrbios de sono, doenças cardiovasculares e problemas à saúde mental. Parte dos vereadores de oposição, tem associado a proposta às três notificações que o Allianz Parque recebeu por violações ao Programa Silêncio Urbano (Psiu) no primeiro semestre, o que poderia implicar no fechamento administrativo. Em abril, por exemplo, um show no local chegou à medição de 74 decibéis.

Em reportagem do Estadão, Abraham Gurvitch, diretor de relacionamento com o mercado da Associação Brasileira das Empresas de Eventos em São Paulo (Abeoc), disse considerar os níveis de ruído previstos na nova lei razoáveis. “No dia do jogo do Brasil, eu estava sozinho na minha sala, com a TV ligada, os picos do decibelímetro foram de 80 decibéis. Está havendo um exagero. Os níveis da nova legislação são razoáveis. A sociedade evolui mais rápido que a regulamentação das atividades.”