23/12/2019 - 17:43
A ministra Laurita Vaz, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), deu prazo de 10 dias para que a Advocacia-Geral da União (AGU), o Ministério Público do Rio (MP-RJ) e parentes de Marielle Franco e Anderson Gomes se manifestem sobre eventual federalização das investigações do assassinato da vereadora e do seu motorista, em março de 2018.
A decisão da ministra foi assinada no último dia 19, mas segundo o Estadão/Broadcast apurou, ainda não foi feita a intimação. O prazo de 10 dias para manifestação só conta depois da notificação, mas os prazos processuais estão suspensos no período de recesso. Dessa forma, o prazo só terminará em fevereiro, após o STJ encerrar o recesso e retomar suas atividades regularmente.
No último sábado, 21, o presidente Jair Bolsonaro disse que “seria bom” federalizar as investigações sobre o caso, mas observou que a medida daria um “indicativo de que querem me blindar com a Polícia Federal”. “Acho que a PF tem de ir atrás de quem lá no Rio está buscando obstruir a Justiça”, afirmou Bolsonaro.
O presidente do STJ, João Otávio de Noronha, por sua vez, já questionou a necessidade de federalizar as investigações. “Vamos tirar da Justiça estadual por quê? O que não está funcionando bem? Quem disse que a Justiça Federal é melhor que a estadual? Então é preciso ter um pouco de paciência, aguardar o voto da ministra (Laurita), que deve estar analisando todas as razões”, afirmou Noronha na última sexta-feira, 20, em almoço com jornalistas.
“Só gostaria de lembrar: estão todos identificados os assassinos desse crime. E estão presos. Então parece que a apuração na Justiça estadual não foi ruim. Não pode ser ruim, se os criminosos estão presos”, acrescentou Noronha.
PGR falou em fracasso de apuração de autoridades do Rio
Ao pedir a federalização do caso em setembro, a então procuradora-geral da República, Raquel Dodge, afirmou que “eventual fracasso” das investigações “imporia a responsabilização internacional do Estado brasileiro”. “É imperiosa a federalização para unir, de vez, toda a atividade estatal de apuração do mandante dos assassinatos em tela, evitando que a manutenção de inquérito da Polícia Civil possa gerar o risco de novos desvios e simulações”, alertou Raquel, na época.
Em entrevista ao Estado em outubro, o atual procurador-geral da República, Augusto Aras, endossou o apoio à federalização, “em razão do decurso do tempo, da denúncia de Raquel, demonstrando que houve obstrução, incapacidade dos agentes públicos do Estado do Rio para conduzir as investigações e apurar a autoria do fato”. “Tudo revela a necessidade da federalização”, afirmou Aras à época.
Ao longo deste ano, integrantes do STJ discutiram reservadamente a criação de uma solução intermediária, com uma força-tarefa mista, composta tanto pela Polícia Civil do Rio quanto pela Polícia Federal, mas a ideia não foi adiante. Falta construir consenso em torno da questão.
Para um ministro do STJ ouvido reservadamente pela reportagem, o importante é saber se as instituições estaduais estão empenhadas e avançando nas investigações. Um outro ministro espera que a conclusão não demore, já que o caso exige uma “solução rápida”.
O caso deve ser discutido em 2020 pela 3ª Seção do STJ, que reúne as duas Turmas do tribunal especializadas em matérias criminais. Para a PGR, a investigação da Polícia Civil do Rio não “apontou claramente a motivação do crime ou sobre os seus possíveis mandantes”, e a manutenção do inquérito com a polícia local pode gerar “o risco de novos desvios e simulações”.
Em sua decisão, a ministra Laurita destacou que há informações sensíveis à investigação sob os cuidados da Polícia Civil, “notadamente acerca de diligências em andamento, cujo resguardo do sigilo é, evidentemente, essencial para o resultado que se busca”. Ela recusou solicitação da viúva da vereadora, Mônica Benício, que pediu para participar do processo na condição de assistente da acusação.
“Nesta atual fase investigatória, em que ainda se examina neste incidente o pedido de deslocamento de competência para garantir a eficiente e isenta apuração dos fatos, a participação de terceiros interessados deve ser cercada de cautela, mormente em razão da inarredável necessidade de se preservar o sigilo das diligências em andamento, em prol, justamente, do sucesso das investigações”, escreveu a ministra.