23/03/2016 - 14:43
Mais de 20 anos depois do massacre de Srebrenica e do atroz cerco de Sarajevo, o ex-líder político sérvio-bósnio Radovan Karadzic ficará sabendo nesta quinta-feira, após um longo julgamento histórico, se o Tribunal Penal Internacional para a ex-Iugoslávia (TPII) o considera culpado de genocídio.
Karadzic, de 70 anos, recebeu 11 acusações por genocídio, crimes contra a humanidade e crimes de guerra durante o confronto bélico da Bósnia, que deixou mais de 100.000 mortos e 2,2 milhões de deslocados entre 1992 e 1995.
Ele será a principal autoridade julgada pelo tribunal pelos supostos crimes cometidos durante o conflito, após a morte em 2006, durante o processo, do ex-presidente sérvio Slobodan Milosevic.
Karadzic foi o presidente da república unilateralmente proclamada dos sérvios da Bósnia, a República Srpska.
De acordo com a acusação, ele pretendia dividir a Bósnia e “expulsar para sempre os muçulmanos e croatas dos territórios reivindicados pelos sérvios da Bósnia”.
Para o promotor Serge Brammertz, o julgamento contra Karadzic é “um dos mais importantes da história do TPII”, tanto pelo número de vítimas como pela “responsabilidade de políticos no sofrimento de seu povo”, afirmou à AFP.
Karadzic, psiquiatra de formação, foi acusado, entre outras coisas, pelo massacre de julho de 1995 de quase 8.000 homens e adolescentes muçulmanos pelas forças sérvias da Bósnia em Srebrenica, o mais grave cometido na Europa desde a Segunda Guerra Mundial.
De acordo com a acusação, o massacre foi uma “limpeza étnica” planejada por Karadzic e Slobodan Milosevic depois do desmembramento da Iugoslávia, em 1991.
A acusação também atribui ao réu a responsabilidade pelo cerco de Sarajevo, que durou 44 dias e matou 10.000 pessoas, assim como dos campos de detenção em “condições de vida desumanas”.
Karadzic, na época o fugitivo mais procurado da Europa, escapou da justiça internacional por quase 13 anos. Foi detido em julho de 2008 em um ônibus de Belgrado. Ele se fazia passar por um terapeuta de medicina alternativa.
Durante sua alegação final, Karadzic, responsável pela própria defesa, afirmou que era um “homem de paz”.
“Fiz tudo o que era humanamente possível para evitar a guerra e reduzir o sofrimento humano”, declarou.
Para seu conselheiro jurídico, o ex-chefe político sérvio-bósnio “não sabia o que acontecia em Srebrenica”.
“Ele que ser absolvido e voltar para sua casa”, disse Peter Robinson.
“Seria uma grande surpresa para todo o mundo”, opinou, no entanto, à AFP, antes de recordar que Karadzic apelará de qualquer decisão diferente.
A acusação solicitou a pena de prisão perpétua.
Quase 100 representantes das associações de vítimas da Bósnia, incluindo ex-detentos dos campos e mães das vítimas de Srebrenica, pretende viajar até Haia para ouvir a leitura do veredicto, que acontecerá na quinta-feira às 14H00 locais (10H00 de Brasília).
Para eles, o principal objetivo do julgamento é a acusação número 2, de genocídio nos outros municípios distintos de Srebrenica.
“Caso ele não seja punido por isto, a pena, independente do que for, será desvalorizada”, declarou Munira Subasic, presidente de uma das associações de mães de Srebrenica.
Ao contrário do massacre de Srebrenica, reconhecido como genocídio pela justiça internacional, os juízes ainda não reconheceram que o que ocorreu nos outros municípios foi um genocídio, o crime mais difícil de provar no direito internacional.
“Há uma percepção de uma certa hierarquia dos crimes e o genocídio é o mais grave”, afirmou à AFP Rachel Kerr, professora no King’s College de Londres. Seria “muito significativo, a nível legal e político”.
Karadzic, que nas palavras do negociador americano para a paz na Bósnia Richard Holbrooke, foi “um dos homens mais cruéis do mundo”, deve aguardar a sentença em sua cela de Haia.
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