Se depender da Levi Strauss & Co., aquela velha calça azul e desbotada nunca mais será lavada. Pelo menos da forma convencional. A empresa americana, criada em São Francisco, na Califórnia, pelo imigrante alemão Levi Strauss, está pedindo a seus clientes que não usem água para lavar o jeans, que ela mesmo inventou. Segundo ela, alguns minutos no freezer serão suficientes para matar os germes da peça. A Levi’s estima que uma calça jeans consuma 3,5 metros cúbicos de água em todo o seu ciclo de vida: do plantio do algodão à reciclagem. Esse volume seria suficiente para encher 15 banheiras. A iniciativa da Levi’s não é uma pegadinha e vai muito além do marketing com apelo sustentável. A companhia quer reduzir a quantidade de água utilizada em todo o processo – desde a plantação do algodão até as várias lavagens que fazemos em casa –, pois teme que a escassez do líquido, provocada pelas mudanças climáticas, possa pôr em risco o seu negócio. O algodão, que consome mais de 3% da água utilizada na agricultura em todo o mundo, poderá ficar caro ou escasso demais. 

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Para proteger a sua matéria-prima, a empresa aderiu à organização sem fins lucrativos Better Cotton Initiative (BCI), assim como fizeram também Adidas, Nike, Gap e H&M. A ONG coordena a Cotton Inc., associação americana que ajuda os agricultores a reduzir em até 32% o uso de água nas lavouras de algodão. O Brasil é um dos países que contam com o apoio da Cotton Inc. No ano passado, um funcionário da ONG esteve por aqui para repassar suas técnicas para a Associação Brasileira dos Produtores de Algodão (Abrapa). “Esta será a segunda safra em que fazemos isso e a primeira de forma aberta”, afirma Lucy Frota, coordenadora de projetos de sustentabilidade da Abrapa. Atualmente, 49 produtores de cinco Estados brasileiros (Bahia, Minas Gerais, Goiás, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul) plantam seguindo as normas da BCI, o que lhes garante um algodão certificado, chamado de Better Cotton. A Levi’s informou que no último trimestre cerca de 5% do algodão usado nos dois milhões de calças que comercializou era dessa categoria. 

 

Tanta preocupação com o mercado brasileiro é fácil de ser entendida. O País é o quarto maior produtor mundial de algodão e deve passar da quinta para a terceira posição entre os maiores exportadores este ano, atrás de Estados Unidos e Índia. Não é só na ponta do agricultor que a Levi’s resolveu agir. A companhia americana fez também a sua lição de casa. A coleção Water Less, lançada neste ano, chega a utilizar até 96% menos água na sua produção, quando comparada à de um jeans normal. Tradicionalmente, o processo de acabamento dessa categoria de calças exige 42 litros do líquido. Para obter essa redução, a empresa incorporou ozônio e diminuiu o número de ciclos da máquina na lavagem das roupas, entre outras mudanças no processo de produção. “Para a geração Y, que é altamente individualista e sem ideologia, a única causa que sobra hoje é a sustentabilidade”, afirma Amnom Armoni, coordenador dos cursos de pós-graduação em moda da Fundação Armando Alvares Penteado (Faap).

 

O projeto, no entanto, pode não ser suficiente para recuperar a imagem da Levi’s. “Apesar de ter uma marca fabulosa, a Levi’s não conseguiu acompanhar os novos tempos e se fortalecer no varejo”, diz Armoni, que trabalhou na subsidiária brasileira entre 1979 e 1984 – época em que a empresa detinha a segunda posição do mercado, atrás da paulista Alpargatas, dona da marca US Top. “Ela também muda demais o seu posicionamento de um país para o outro.” Nos Estados Unidos, por exemplo, os seus jeans são considerados de baixo custo. No Brasil, a empresa possui uma loja-conceito na Oscar Freire, rua que reúne uma das maiores concentrações de marcas de luxo de São Paulo por metro quadrado, frequentada por consumidores de alta renda. Questões como essas fizeram o faturamento da Levi’s estagnar na faixa dos US$ 4 bilhões nos últimos cinco anos.

 

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